Os Paralamas do Sucesso na capital dos gaúchos

E não é que o Brock hoje é quarentão? O rock feito no Brasil dos anos 1980, onde a música jovem oxigenou o cenário, tanto cultural, comportamental e social do Brasil, ano passado completou 40 anos. E esse ano várias bandas da geração também assopram as 40 velinhas. Os Titãs com sua incrível volta, Paula Toller que não tem mais Kid, mas continua na ativa tocando os clássicos de 1983, e é claro, os Paralamas do Sucesso. E sem muitas delongas, o grupo que mantém a intacta formação desde 1983, resolveu comemorar esse momento da carreira com um show de sucessos. Um apanhado geral da carreira, um show pra todo mundo se emocionar e cantar junto com a banda. E eles trouxeram esse show para Porto Alegre sábado passado. E já que os Paralamas do Sucesso foram tocar na capital (dos gaúchos), no Araújo Vianna, o NoSet logicamente cobriu e mostra tudo sobre essas quatro décadas consensadas em 29 sucessos.

Com um auditório abarrotado, certamente com mais de 4.000 pessoas, cadeiras tomadas e laterais com muita gente de pé, os Paralamas do Sucesso subiram ao palco por volta das 21h20min. E ao começar a introdução de Vital e Sua Moto, do primeiro disco de 1983, Cinema Mudo, ninguém mais sentou. Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone prometeram e apresentaram um revival do melhor da trajetória da banda. Ainda no clima de 1983, eles mandam de Cinema Mudo, canção que dava nome ao disco. Quase que sem deixar o povo respirar, a inebriante Ska, do clássico O Passo do Lui, mantém o clima festivo, uma cara do que eram os Paralamas do início, meio The Police, meio Rio de Janeiro.

Lourinha Bombril, versão de Herbert Vianna para a canção dos argentinos Los Pericos de 1996, começa a conexão hermana, mas com cara de Brasil. Segue a linha Rio de Janeiro – Buenos Aires com Trac Trac, sucesso de Fito Paez, que a banda gravou uma versão em 1991, e tem o mérito de apresentar o argentino para os brasileiros, um grande amigo da banda.

Com Calibre, a poderosa música de 2002, que marca  o renascimento da banda depois do acidente de Herbert, vemos o lado pesado e visceral do trio que é mantido com a sempre atualíssima Selvagem, do álbum homônimo de 1986, e divisor de águas da carreira da banda. Peso, pegada e atitude. Mas como de ternura e amor também vive a nossa luta, eles atacam com a belíssima Cuide Bem do Seu Amor, onde Herbert nos lembra que cada segundo é importante e que num piscar de olhos a vida pode mudar completamente. Plateia em êxtase aproveitando aquele momento único. Saber Amar, de 1995, mantém a pegada mais leve, que segue com a lindíssima Tendo a Lua, de 1991, e fecha o bloco com a bela e quase profética Aonde Quer Que Eu Vá. Momento de ternura e emoção do show que ainda segue com Lanterna dos Afogados, um dos maiores sucessos da banda, em arranjo primoroso e solo de guitarra marcante de Herbert.

Chega a arrepiar a presença de Herbert Vianna ali comandando aquela massa, mesmo com certas dificuldades vocais e alguns erros na execução de algumas músicas, o que é natural, por ter que se reinventar ao tocar guitarra, mantém o seu jeito peculiar de ser, curto e grosso e sempre passando aquela sensação de prazer às nossas almas através de sua poesia e som. Herbert motiva, inspira e emociona. O mesmo para Bi Ribeiro, sempre calado, mas com um dos baixos mais precisos da música brasileira e uma simpatia e simplicidade cativantes, e é claro, o monstro João Barone, um dos melhores bateristas do Brasil, com seu estilo sorridente e cara de eterno menino, fechando a trinca perfeita do maior power trio do Brasil. Claro que não podemos esquecer o João Fera, tecladista há quase 40 anos da banda, é praticamente o quarto Paralama (ou quinto, já que o amigo  e empresário José Fortes é o quarto…) e o naipe preciso de Bidu Cordeiro e Monteiro Jr. Como diria Faustão, uma super banda para acompanhar uma outra. Mas voltando à noite de sábado, O Amor Não Sabe Esperar segue o baile e em sequência vem La Bella Luna, mantendo o clima de romance no palco para a eufórica plateia. Será Que Vai Chover?, de 1987 é um achado, revisitada no show, canção do tempo do lendário show em Montreux. Assaltaram a Gramática, de Lulu Santos  e Wally Salomão, gravada por eles em 1984, dá o tom oitentista à casa, onde até Herbert e João não cansam de lembrar dos hiper lotados shows na década de 1980 no ginásio Gigantinho. A homenagem ao síndico Tim Maia vem com Gostava Tanto de Você e com Você, numa época que os Paralamas eram um dos únicos a dar bola a Tim, hoje quase uma unanimidade cult. O Beco é mais uma pancada sonora, com aquele naipe incrível e a letra que é um soco na cara.

Com A Novidade chegou a hora de homenagear Gilberto Gil, outra joia sonora do disco Selvagem, com uma das letras mais fortes e poéticas da MPB. Melô do Marinheiro, galhofeira canção do disco, segue com a plateia cantando junto e com Alagados, quase colocando a casa abaixo. Perfeita conexão entre plateia e banda, cumplicidade de gente que acompanha a banda desde o início e acrescida de gente que se criou e conheceu a banda nos gloriosos anos 1990 e que piraram com Uma Brasileira, seguinte música do set, fazendo o Araújo uma grande pista de dança. O show quase que direto, sem grandes delongas, termina com Óculos, a canção que colocou o Paralamas na primeira prateleira do pop nacional, premiada com o Rock in Rio de 1985. Mas claro que tinha bis e um generoso bis, como o Barone anunciou. Emendam Perplexo, tocam a esquecida e divertida Bora Bora, do disco homônimo, Romance Ideal, do longínquo 1984 e Ela Disse Adeus, mega sucesso de 1998. Apresentam o sucesso Caleidoscópio como uma homenagem deles ao blues e seus heróis, com aquele arranjo luxuoso e de alta classe e fecham com Meu Erro, aquela canção que com certeza hoje é uma das mais populares do Brasil, cantada por uma plateia emocionada. 29 canções do melhor que o pop rock brasileiro produziu na obra dos  Paralamas.

 Os Paralamas do Sucesso quarentaram. Maduros, sabem que o povo quer ouvir e cantar o que fez sucesso, e querem compartilhar esse momento de celebração presenteando o seu público com suas grandes canções. O Araújo presenciou um show histórico, com uma energia única do grupo e uma carga de vibração e emoção poucas vezes vista de uma plateia, uma comemoração mútua de umas das maiores bandas do Brasil e seu fiel público. E uma prova de que a geração dos anos 1980 ainda está viva, ativa e mostrando o seu melhor para quem realmente importa, a sua séquita legião de fãs, admiradores e amantes dos Paralamas.

 

Crédito das fotos: Vívian Carravetta

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