Bruce Dickinson apresenta The Mandrake Project no Pepsi On Stage em Porto Alegre

Existem poucos artistas no meio da música que conseguem ter excelência tanto no meio artístico quanto no profissional. Gene Simmons, do Kiss, é um deles.  Extremamente profissional e com uma ilimitada carreira musical por mais de 50 anos. Outro cara que preenche o checklist completo, além de ser talvez o maior vocalista da história do heavy metal, é o Bruce Dickinson. A incansável voz do Iron Maiden está sempre em profusão e em eterna atividade criativa. Recentemente lançou seu sétimo disco de estúdio, com músicas em parceria do produtor Roy Z, o  The Mandrake Project. Com o disco como mote e um apanhado de canções de antigos álbuns, Bruce Dickinson apresentou o seu novo show em Porto Alegre, quinta-feira passada, no Pepsi on Stage.

Com um público bem aquém do tamanho do cantor (talvez por ser fim de mês, preços altos, local e, principalmente, que um integrante solo do Iron não tem tanto chamarisco quanto a marca Iron Maiden que é mais que música), no Pepsi on Stage, quase um hangar, que fica do lado do aeroporto de Salgado Filho, o que gerou piadas que Bruce estacionou seu avião ali do lado para cuidados dos flanelinhas, realmente estavam presentes os que curtem o trabalho do cantor. Para a abertura, a banda Clash Bulldog’s foi escalada. Infelizmente, o som mal equalizado,  músicas repetitivas e alguns covers foram um empecilho para a galera curtir o som da banda. Não posso negar a competência dos músicos e a enorme responsabilidade, mas também acho patético tocar covers num show de abertura na esperança de ganhar a plateia. Enfim, um show esquecível da banda de Nova Friburgo.

O povo queria mesmo ver era a sirene do heavy metal e por volta das 22h30min, sobre ao palco a banda, um telão com imagens alusivas a canções e filmes antigos, com Bruce todo de preto e uma toquinha na cabeça, quebrando tudo com o clássico Accident of Birth, para delírio da galera. Sem muita apresentação, emenda  Abduction do fraco disco Tyranny of Souls e segue com StarChildren do Accident of Birth. Um começo avassalador, onde ficamos impressionados com a voz de Bruce, no alto dos seus 66 anos ainda impecável, atingindo suas notas altas e sua técnica única. O cara não pára um instante. E é claro, o impecável trabalho de som da sua equipe. Nada sobra, com tudo soando perfeitinho, padrão classe A.

 

Apenas na quarta música que ele começa a apresentar faixas do último disco. Com a ótima Afterglow of Ragnarok. Mas é com Chemical Wedding que literalmente a casa veio abaixo. A canção, quase um hino, do álbum de 1998, cantado pela horda de fãs do cantor. Logo depois a galera começa a gritar “ole ole ole Bruce Bruce”, deixando o experiente vocalista visivelmente emocionado. E com muitos “scream for me Porto Alegre” entoados por ele, o set ia intercalando as antigas com as novas. Então, emenda Many Doors to Hell do novo álbum e logo depois comanda com palmas a galera com a folk metal Jerusalém do álbum de 1998, onde o inglês literalmente brinca com a sua voz.

Não posso passar de narrar um fato de estrelismo de Bruce. Em certo momento, mandou vários xingamentos sobre alguma porta aberta no Pepsi, gritando com alguém da equipe da produção. Com todo respeito, uma atitude patética de um cara que deve ter um rei na barriga. Por mais que sou fã do talento do cara, isso não se faz publicamente, uma prova que o showbizz cria malas arrogantes a todo tempo. Enfim, estou falando do show do Bruce, não do deselegante Bruce, que segue o baile com Resurrection Man do Mandrake. Nota-se que as suas canções todas são mais pop, com refrões pegajosos, muito diferente da última fase catastrófica que está o Iron Maiden e suas novas composições. Provando que Bruce anda compondo melhor que o Steve Harris.

Segue Rain of Graves do último disco e depois a banda faz, em tom de jam session, uma versão inspirada da música Frankenstein, de Edgar Winter. Começando com um solo de bateria, com Dickinson nos bongôs, a banda mostra toda sua competência nos instrumentos. Timaço montado pelo cantor, com Dave Moreno na bateria, Chris Declercq e Philip Naslund esmerilhando nas guitarras. Mistheria nos teclados e Tonya O’Callaghan no contrabaixo. Um renovado e brilhante time de músicos.

The Alchemist segue o set, mas é com Tears of Dragon que o Pepsi simplesmente pira. Essa é a típica canção que conseguiu sair da órbita do nicho metal e virou um sucesso popular (saudades da MTV) e que até quem nem sabe quem é o Bruce a cantou muito nos anos 1990. E mais uma vez um show vocal de Bruce Dickinson, que interpreta a música com um coração e voz insuperáveis. Depois dessa catarse, o show segue num excelente clima com Darkside of Aquarius do disco Accident of Birth. Navigate the Seas of Sun, quase uma canção acústica, do disco Tyranny of Souls, dá uma acalmada na galera, com seu clima mais light. Outro ponto positivo do show foi que Bruce não quis enfiar goela abaixo as músicas do seu novo disco, intercalou sucessos antigos, tocou músicas de quase todos os discos (infelizmente menos do ótimo Tattooed Millionaire, esquecido pelo artista). Com um show sem ares de superprodução como os do Iron, Bruce estava mais solto, quase num clima de boteco, aproveitando que ao invés de tocar pra 50 mil pessoas, estava ali tocando pra poucos mais de mil. Clima de barzinho e show pequeno.

Em Book of Thel do Chemical Weeding (como esse disco era bom), Bruce manda pra galera sua toquinha e apresenta suas melenas compridas e brancas, e no mesmo clima, encerra o show com a empolgante  The Tower, em que ele rodopia, corre de lado pra outro, tem seu momento Kiss, ficando próximo da banda (que além de ótima tem uma presença de palco excelente), fechando o espetáculo com um sorriso no rosto e com a galera extasiada.

O imparável Bruce Dickinson, que já deve ter uma casa alugada no Brasil com tantas visitas para cá, mostra que ainda está explodindo em frescor artístico. Com grandes e novas canções, um repertório de ótimos “velhos” sons e uma presença de palco única, a voz do metal continua firme e forte, mostrando seu trabalho, aliando talento, profissionalismo e competência, em um show que as pouco mais de mil e poucas pessoas irão guardar para sempre na memória. Poderiam ser um pouco mais se fosse mais barato… mas, enfim… isso é business e isso Bruce sabe muito bem fazer, além de cantar magistralmente.

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