Baco Exu do Blues no Araújo Vianna

Um dos maiores nomes da nova cena do rap nacional, Diogo Álvaro Ferreira Moncorvo, mais conhecido como Baco Exu do Blues, aterrissou com seu mais novo show no Araújo Vianna, sábado passado. O soteropolitano, que conseguiu com seu talento, voz e persistência, mostrar pro Brasil inteiro que o rap não é privilégio apenas do sudeste. Show esse com ênfase no seu último e aclamado disco Quantas Vezes Você Já Foi Amado ou QVVJFA, de 2022. E o NoSet foi lá conferir.

Com casa cheia, mais de 4 mil vozes, na maioria entre 16 e 23 anos, esperava com ansiedade mais um show do Baco em Porto Alegre. Com um séquito de admiradores por aqui, Baco praticamente tocava em casa. Com pouco mais de meia hora de atraso, acompanhado por uma excelente banda com três percussionistas, DJs, três backing vocals, guitarra e teclados, Baco, tendo ao fundo um telão projetando imagens de depoimentos sobre a importância e a falta de amor na periferia, adentra ao palco entoando Sinto Tanta Raiva, música que abre seu último trabalho. Vestindo uma camisa preta com a estampa de Justin Bieber, o rapper, em tom de oração, se emociona e agradece a galera. Diga-se de passagem, uma ensandecida plateia, que cantava palavra por palavra a poesia que mistura lirismo e fúria do rapper. Com Dois Amores segue o show, mas é com Mulheres Grandes que ele chama as incríveis cantoras de sua banda, dando um show de voz e carisma. Que continua com uma delas cantando o clássico de Alcione, Você Me Vira a Cabeça, pra delírio do povo presente.

Baco desfila pelo palco, esbanja simpatia e anuncia que vai tocar o sucesso Me Desculpa Jay Z, do disco Bluesman de 2018.  Segue com Cigana, mas é com Hotel Caro que divide os vocais com uma de suas cantoras, a canção que gravou com Luiza Sonsa, que leva a galera mais uma vez ao delírio. Baco é um cara de papo reto, simples, com letras diretas e cotidianas, e no palco consegue passar todo o poder de suas letras, que emocionam essa nova geração, atrás de amor, diversão e fala. Lágrimas, que gravou com Gal Costa, segue o baile, em mais um show de uma de suas cantoras dividindo o microfone com o rapper.

Com Autoestima, Baco Exu do Blues motiva a galera a buscar amor próprio e prega respeito geral na sociedade. Mas é com a romântica Samba Em Paris que comanda a massa, que canta junto e alto som o refrão que dividiu com Gloria Groove, Ne Me Quitte Pas,.em um daqueles momentos de catarse no Araújo Vianna, quando o auditório vira um balé de braços sincronizados que dá gosto de ver e guardar pra sempre na memória.

Com Kanye West da Bahia, ele se junta a um rapper e divide o palco, tendo ao fundo imagens no telão de personalidades negras, em um momento de profunda emoção e beleza do show. Mantendo o tom mais de protesto, deixando o romantismo um pouco de lado, segue com Bluesman, onde presta sua devoção ao blues e ao ritmo que foi o primeiro a libertar os negros e fazer pretos ricos com sua arte, afinal, tudo vem do blues. Com Inimigos, levanta a voz e diz que com gente preconceituosa não se deve calar e sim agir e revidar, pra delírio da massa presente. Com 4 Da Manhã Em Salvador fecha o bloco mais furioso do espetáculo, quando narra o cotidiano periférico da capital dos baianos, mas que poderia ser em qualquer grande capital do Brasil.

Com Ela é Gostosa Pra Caralho, Baco retoma o romantismo a sua moda, que segue com a de nome pomposo Girassóis De Van Gogh, onde idealiza uma mulher que pode dar problema e finaliza o show com Flamingos, canção de muito sucesso do disco de 2017, em mais uma ode romântica a um relacionamento torto que tem tudo pra dar errado, mas pode se endireitar. Essa, junto com Samba em Paris, as mais cantadas pela galera. Para surpresa, ao menos minha, com menos de uma hora e meia, o show termina ali, com Baco se despedindo, um pouco mais de 15 músicas, um show de curtíssima duração, mas uma experiência gratificante demais.

Baco Exu do Blues, como falei antes, narra o dia a dia, os amores e desamores da vida, numa maneira direta, mas nunca perdendo a compostura. Se seu rap puxa para os amores possíveis e impossíveis, também fala, grita e denuncia esse cotidiano de opressão da sociedade brasileira e a dura realidade da maioria do povo. Unindo amor e cólera, encanta seus fãs com sua voz forte e simpatia contagiante. Poucas vezes, apenas em shows populares, ou em artistas veteranos de pop e rock, vi tanta gente cantar junto, se emocionar, se doar e entrar em frenesi num show. E Baco Exu do Blues conseguiu dominar um Araujo lotado de gente que ama sua voz, sua arte e seu jeito de narrar a vida, se identificando e principalmente dando frescor e novidade à música brasileira. Abrir a cabeça e ver que às vezes o passado é uma roupa que não serve mais e se entregar ao presente é fundamental. E esse presente pode nos provocar muita surpresa e Baco Exu do Blues foi uma delas.

Mais do NoSet