Olhe para Cima – “Lua de Jupiter”

E quando ninguém esperava, um jovem ganha o poder de voar ao ser baleado. Não estou falando de um filme de super herói, como poderia ser, mas do filme húngaro “Lua de Jupiter” (“Jupiter’s Moon” – 2018).

A trama tem como cenário de fundo a problemática dos refugiados sírios na Hungria, um dos países europeus de fronteira marítima e primeiro destino de quem foge do conflito que já dura quase uma década. Entre um dos barcos de travessia então Adryan e seu pai, com algum objetivo além da sobrevivência, algo que não fica claro, nem para o público nem para Adryan.

Eles se separam quando a polícia húngara intercepta o barco, já bem próximo à praia. Adryan consegue se salvar nadando e depois indo para a floresta, onde ele é atingido com vários projéteis. O policial atirou deliberadamente, Adryan não o ameaçou com nada (nem podia, estava desarmado e assustado), ele deixa o local jurando que havia matado o jovem sírio.

Do lado húngaro está a forma médica, com alguns ideias ideias de resistência e pouca fé em qualquer coisa de verdade. A frente da equipe está o Dr. Gabor Stern, que decidiu atender os refugiados porque não tinha outra opção, estava sendo processado porque uma paciente faleceu em suas mãos durante uma cirurgia e foi comprovada a sua negligência.

Stern recebe o prontuário de Adryan, descrito como um sírio quase morto, atingido em órgãos vitais. Sim, Adryan sobreviveu e conseguiu sair do local porque começou a flutuar pouco depois dos disparos. Logo Stern decide esconder a verdade do policial que o atingiu, que era diretor do campo de concentração em que atende, Laszio (desonesto e sabe do processo de Stern).

E não faz isso com boas intenções. Stern deseja expor o dom de Adryan como se fosse algo milagroso, apresenta-o como o anjo e consegue angariar dinheiro, muito dinheiro. Ele diz ao jovem que o dinheiro é para que ele possa refazer os documentos, perdidos na travessia, assim ele poderia reencontrar o pai.

Adryan é um pouco inocente e está perdido, não tinha outra opção senão confiar em Stern, mas logo desconfia de sua intenção quando nenhum destino levava a estação, onde o pai dissera que queria ir, tinha até um mapa que entregou a Adryan no barco.

Acontece que o pai de Adryan era terrorista e havia arrastado o filho para a missão, mesmo que ele não tivesse nada a ver com isso. Isso acaba dificultando a vida dele e de Stern, agora que estavam sendo procurados por Laszio e poderiam ter um destino bem pior. Ele ver que é verdade as suspeitas de terrorismo no pai quando se torna vítima de um ataque na estação em que o pai poderia estar.

Este é o momento que se separa de Stern, ele, por sua vez, busca maneiras de encontrar Adryan antes da polícia. Depois que consegue colocar o moço em um local seguro, contar que o pai dele havia morrido (um contato dele havia encontrado o corpo e o avisou), ele mesmo cai numa armadilha de Laszio.

A essa altura Stern já se arrependeu de usar o dom de Adryan para conseguir dinheiro para si. Primeiro porque o que havia planejado não deu certo, pagar a indenização para a família que o processou, depois porque sentiu-se responsável pelo moço. Ele começou a se colocar como o pai de Adryan, porque ambos só tinha um a outro agora, não tinha mais a quem recorrer.

O egoísta Stern morreu para salvar a vida de um refugiado, um moço que acabara de conhecer, mas que o ensinou a olhar para o céu novamente, para além de si mesmo.

No geral, esse filme é muito confuso! Há ação demais para explicações de menos, não dá para entender as ligações entre uma ação e outra. Até agora eu estou tentando entender como é que Stern cobrava pela exposição de Adryan, porque ele “vendia” como algo curativo, mas nada mudava.

Muito estranho.

Quando comecei a assisti eu pensava que iria gostar, porque seria algo para refletir as condições dos refugiados sírios na Europa, tema que me interessa (foi o tema do meu TCC da pós-graduação, à propósito). O fato de o pai de Adryan ser um terrorista, mas Adryan não seria algo bem interessante de se trabalhar, ver ambos os lados da história, ver que há pessoas boas e pessoas ruins de cada lado. Mas nada disso foi abordado de jeito esperado.

Adryan em si é difícil de entender, ele parecia um jovem de classe média na Síria, com acesso a tecnologia (tinha uma tatuagem de violino e falou que adorava seu video-game), mas tem a aparência de inocente demais. Achei a cena ele pedindo batata frita em um restaurante fino (cinco estrelas, gourmet) muito fofinha, parece alguém que deseja com toda a força a normalidade da vida que tinha antes.

A relação entre Stern e Adryan é uma das únicas coisas que passam a ter sentido, o médico precisava de algo que pudesse o fazer voltar a sentir alguma coisa de bom, e o moço sírio trouxe essa humanidade de volta a ele. A gratidão de Adryan por Stern, mesmo depois de muitos erros, também é genuína, ele de fato sente que confiou na pessoa certa.

Essa questão de “olhar para cima” é a outra coisa que faz sentido. Em todos os momentos que Adryan voa em público, sem ser exposição de Stern, poucos são aqueles que de fato olham para cima, todos estão muito ocupados com os próprios problemas, ocupados demais para levantar o olhar para o céu e ver um moço voando.

A única que ver ainda o chama de anjo, mas ela estava saindo do ataque na estação, a planejada pelo pai de Adryan. Foi até por causa disso que Stern consegue  o reencontrar.

Mas pensem bem: você costuma olhar para uma nuvem sem ser dia nublado? Lembra da última vez que parou para olhar a lua, sem ninguém pedir, só porque olhar mesmo?

Estamos ocupados demais olhando para os celulares, certo? Será que conseguiríamos ver um moço voando pelos céus se isso ocorresse por aqui?

O filme termina com Adryan voando sobre a cidade, dessa vez com vários olhares para ele, mas sem reações. Ele talvez tenha a liberdade dele restaurada com isso, a normalidade da vida de antes. Quem sabe até voltar para casa ele conseguiu, né?

Desejo que todos os refugiados, seja na Europa ou no Brasil, consigam sua liberdade, que consigam confiar em alguém novamente, que consigam ter esperanças de um futuro melhor. Desejo que nós deixemos de lado um pouquinho todos os problemas pessoais e possamos olhar para os lados e, quem sabe, para cima.

Ah, para quem está esperando alguma história sobe Jupiter ou uma de suas 22 luas, só se fala disso no comecinho, depois nem se cita o nome do planeta. Ainda estou tentando entender a relação entre o título e a trama, cheguei a duas teorias:

  • O fato de voar nos faz pensar na falta de gravidade no espaço, logo se pode relacionar o pode adquirido com algo alienígena (este termo é usado como sinônimo de “estrangeiro” em algumas obras de Direito Internacional);
  • A frase de Stern, voltar a olhar para cima, para o céu, pode remeter a algum astro celestial, como o planeta.

Nada de concreto, um pouco besta, confesso, mas foi o que consegui pensar!

Beijinhos e até mais.

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