Não Volte a Dormir – “Última Jornada”

O gênero de filmes apocalípticos geralmente envolve grandes guerras ou coisas extraordinárias, encobrindo uma história dramática. O longa inglês “Última Jornada” vem como exceção, com um tom mais dramático, destacando-se dos demais.

O filme foi oficialmente lançado em 2019, contudo, agora a A2 Filmes está o distribuindo nos catálogos nacionais das seguintes plataformas digitais: NOW, Loke, Vivo Play, Apple TV, Google Play, Microsoft e Sky Play.

Perry Bhandal assina a direção, a produção e o roteiro, que tem como base esse poema do poeta sufista Rumi:

“A brisa matinal tem segredos a lhe contar

Não volte a dormir

Você precisa perguntar por aquilo que realmente deseja

Não volte a dormir

As pessoas estão indo e vindo através da soleira onde os dois mundos se tocam

A porta é arredondada e está aberta

Não volte a dormir.”

A história se concentra em Sira, um garoto (aproximadamente com seus 14 anos, talvez menos) que cuida da mãe em seu leito de morte. Antes de morrer ela o preparou para uma missão muito importante, a jornada para o lugar onde os desejos se realizam, para isso ela o ensinou a usar um aparelho que ajuda a controlar o “vento”.

O “vento” é uma onda desconhecida que vem devastando o planeta, quando ele passa transforma quem quer que seja em pedra, depois se desintegra em pó. Pouco se sabe desse fenômeno, poucos sabem lidar com isso, entre eles, Sira e a mãe. Mas há três informações importantes sobre o “vento”: ele é atraído por sons não naturais (por isso as cidades foram as primeiras atacadas); ele evita a água e o aparelho só ajuda a o desviar, não o derrota de fato.

Quando ela falece, Sira pega o mapa que ela desenhou para ele e começa essa jornada, que seria bem solitárias, mas outras pessoas cruzam seu caminho. Primeiro foi Lily, depois Jay e Jesse.

Lily é uma menininha um pouco mais nova de Sira, ela se perdeu do pai e do pessoal com quem ela seguia para um lugar seguro. Quando o garoto fala para ela do lugar onde os desejos se realizam ela pede para ir junto … A verdade é que ambos precisavam de companhia.

Eles se deparam com uma espécie de convento, onde um lunático se coloca como o Padre e o salvador, valendo-se da inocência e do desejo de sobrevivência das mulheres que ali habitavam. Ele ameaça Sira a mostrar como o aparelho que controlaria o “vento” funciona, para continuar a passar a aparência de salvador.

Eles ajudam a derrubar o Padre e depois continuam sua jornada. Eles encontram Jesse porque Sira a ajuda a fugir do “vento”, na mesma ocasião eles três conhecem Jay, que se mostra confiável para seguir caminho com eles.

Jesse é especialista em fenômenos naturais relacionados a eletromagnetismo e afins, ela estava no laboratório quando o “vento” passou e transformou seus colegas em pedra. Ela deseja chegar a cidade vizinha, onde sabe que um amigo e colega de trabalho mora, eles poderiam desvendar o mistério e descobrir como sobreviver àquilo.

Jay é oficial do exército britânico, ele foi chamado para uma missão poucas semanas depois de ter se casado, voltando para casa quando o “vento” ataca o local da sua missão e com a notícia que também havia passado na região onde sua família está. Ele tenta encontrar a esposa, mas tem a forte impressão que chegou tarde demais.

Eles quatro passam a noite em uma casa cujo os donos foram vítimas do “vento”, Sira conta para onde ele e Lily estão indo, mas Jesse os convence de desviar para conseguir encontrar o amigo e um aparelho que aumentaria o alcance do de Sira. É nessa casa que Lily encontra o poema de Rumi escrito e, pela primeira vez, o poema é recitado no filme.

Eles passam por provações e chegam a um ponto onde o “vento” aparece, não atacando, mas sim se mostrando de verdade. Tanto a mãe de Sira quanto a esposa de Jay aparecem ali, dentro de uma espécie de bolha de ar, o que concretiza o que o poema diz no trecho “As pessoas estão indo e vindo através da soleira onde os dois mundos se tocam/ A porta é arredondada e está aberta”.

À propósito, enquanto Sira vai ao encontro da mãe, dentro do corredor que o aparelho forja dentro do “vento”, há a narração do poema inteiro, costurando a trama e dando sentido à história. É o momento mais emocionante.

A carga dramática desse filme é justamente a interpretação de um poema de origens teológicas, não ligada à uma religião em si, mas na fé em si. O próprio filme mostra sinais dessa relação com a fé, tanto com o pseudo Padre que se diz o salvador, quanto quando Jay se mostra católico e Jesse questiona sua religião ao fato de ele ser um soldado.

Há alguns temas que poderiam ser melhor explorados, especialmente a ligação entre a profissão da mãe de Sira (trabalhava para o governo britânico), o que a faz ter essas informações, e o exército, representado por Jay. Contudo, fica claro que esse não é o objetivo do filme, mas sim o cunho dramático e poético, por isso é bem sucedido.

É interessante ver a dinâmica entre quatro pessoas totalmente desconhecidas tendo que confiar e ainda lidar com o caos apocalíptico ao seu redor. Sira tinha tudo para abandonar os outros e seguir o caminho como a mãe o havia treinado, mas aos poucos ele vai se afeiçoando a essas pessoas, especialmente à Lily, que vira uma irmãzinha para ele, alguém que ele cuida e de quem recebe cuidados.

A fotografia lembra um pouco algumas imagens da série “Dark”. Embora eu nunca tenha assistido essa série (não tenho estrutura mental para ela), sei que existe algo relacionado ao fim do mundo e já vi alguns cartazes, foi justamente o que lembrei ao ver a cena em que Sira e Lily estão diante de um túnel.

O elenco é relativamente desconhecido, alguns membros são até novatos na indústria.

Sira é vivido por Flynn Allen, conhecido principalmente por trabalhos na TV, no teatro e em curtas, mas já esteve presente em alguns filmes de terror, como “Robert” e “House of Salem”. Ele trabalhou com o diretor brasileiro José Padilha em “7 Days in Entebbe”.

Lily é interpretada por Matilda Freeman, já veterana na série “Coronation Street”, mas fazendo sua estreia no cinema e muito bem. Quem também fez sua estreia com esse longa foi Jennifer Scott, intérprete de Jesse, ela tem uma longa carreira no teatro, mas não é conhecida nem na TV nem no cinema.

Jay é vivido por Luke Goss, conhecido por produções como “Conquista de Reis”, “O cara”, “Hellboy 2: O Exército Dourado”, “Entrevista com Hitman” e “Blade II”.

O Padre que se dizia salvador foi interpretado por Peter Guiness, que também passou por “Coronation Street”, mas é mais conhecido por filmes como “Rei Arthur: A Lenda da Espada” e “Segredos Oficiais”, além das participações em “Chernobyl” e “Cursed”. Ele já foi escalado para o próximo filme da “Liga da Justiça” de Zack Snyder.

Até mais!

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