Crítica: O Chamado 4

Nos anos 1980 era comum uma prática de um filme usar alguma palavra ou citação a outro filme de sucesso para batizar uma nova produção em português. No caso do filme Teen Wolf, de Michael J. Fox, como esse estava estourado por causa do De Volta para o Futuro, no Brasil, a tradução ficou o infame O Garoto do Futuro. Um filme de 1982 chamado Losin It, que tinha um novato Tom Cruise, foi batizado no Brasil como Porky’s 3, para surfar na onda da franquia Porky’s, que fazia sucesso na época, mas que de continuação e ligação com ela, nada tinha. Era comum então usarem termos como hora, espanto, volta, zumbis e similares para enganar o povo em uma época sem internet e com dificuldade de aprofundamento de informação mais detalhada. Mas surpreende quem em 2023 ainda se use esse artifício engana bobo para promover filmes, ainda mais para uma franquia consagrada, falo de O Chamado 4 – Samara Ressurge (Sadako DX, 2022), de Hisashi Kimura, que da franquia estadunidense, que seria a suposta continuação, só tem o nome.

O filme é aquele lero-lero de sempre, anos depois da maldição da fita de VHS que matava em sete dias, uma série de mortes andam ocorrendo no Japão, em diversos locais diferentes, por pessoas que assistiram o teor da fita na internet. Ayaka é uma brilhante estudante, com QI elevado, que duvida dessa maldição, sempre usando a ciência pra explicar os fenômenos, chegando a ter um debate com um guru espiritual, Mestre Kenshin, que acredita no lado oculto desses fenômenos. Futaba, a irmã de Ayaka, acaba assistindo a fita, que diferentemente da maldição do passado, mata o espectador não em sete dias e sim em apenas 24 horas, causando pânico. Ayaka então decide ajudar a irmã e com a companhia do covarde Oji corre contra o tempo para tentar descobrir o porquê da suposta maldição e qual é o antidoto para enfrentar Sadako (ou Samara).

Possivelmente o nome em português dará uma confusão nos fãs do universo Ringu. O filme em questão, Sadako DX, se fosse uma continuação, seria do filme Sadako – Capitulo Final, de 2019, fazendo parte do universo, mas longe de ser uma continuação das refilmagens estadunidenses desse clássico do cinema de terror nipônico. Quem dera que fosse só malandragem pra atrair o povo para um grande filme, mas infelizmente O Chamado 4 beira o constrangedor de tão ruim. Ele até tenta reciclar as ideias dos outros filmes, muda o tempo da maldição, explora o poder de viralização da internet e o risco disso, compara as consequências da maldição a um vírus (meio traumático em tempos pandêmicos), a heroína mexe as orelhas para lembrar de coisas passadas, mas é tudo extremamente mal executado, com zero clima de terror, uma fotografia alegre, um roteiro raso e quase uma comédia adolescente sem graça. Em um momento parece que o filme é um quadro de pastelão fazendo uma sátira sem graça da série, enfim uma decepção total.

O elenco parece uma reunião de personagens do Scooby-Doo. Fuka Koshiba, como a inteligente e esperta Ayaka, uma espécie de detetive do ceticismo, uma Velma, talvez tenha um personagem mais redondo do filme. Kazuma Kawamura é o medroso Oji, lembra o Salsicha e Hiroyuki Ikeuchi, como o mestre Kenshin, lembra aqueles maléficos donos de parque do desenho do cachorro medroso.

Chamado 4 – Samara Ressurge tem tudo para decepcionar o público, inclusive Sadako (ou Samara) não provoca mais medo em ninguém, as suas aparições são previsíveis, sem clima, sem trucagens de câmera e música sem graça. Um filme que de terror passa longe e se pretendia fazer rir, causa sim um desagradável constrangimento, uma legitima perda de tempo em um filme que não funciona em nada. E ainda temos como cereja do bolo um dos finais mais constrangedores em muito tempo, que fariam até aqueles clássicos pavorosos do terror do citado anos 1980 e que ficavam nas prateleiras das locadoras, parecerem obras-primas do gênero. Infelizmente, a malandragem da tradução é o de menos, tamanha ruindade do recheio de O Chamado 4

 

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