Crítica: Chamas da Vingança

Nos anos 1980, eu na minha infância, já um verdadeiro rato de locadoras, sempre que me deparava com um certo cartaz de um filme de terror, confesso que me provocava grandes calafrios. O cartaz era de uma menina loirinha, com os cabelos esvoaçantes, com uma cara de poucos amigos e labaredas de fogo no fundo. O filme em questão era Chamas da Vingança, filme de 1984, dirigido por Mark L. Lester (que no ano seguinte nos premiaria com o clássico dos clássicos Comando para Matar) e a tal menina piromaníaca era uma criança com menos de 10 anos, que dois anos antes tinha ficado famosa por ser irmã de Elliot, o melhor amigo do E.T., a menina em questão era Drew Barrymore. O filme, fui assistir alguns anos depois, era uma boa adaptação oitentista de uma história de Stephen King, com uma Drew Barrymore realmente assustadora, com seus poderes incendiários. O filme gerou continuações, uma série e, agora em 2022, o diretor Keith Thomas nos apresenta seu remake, que estreia essa semana nos cinemas, com o mesmo título do original, Chamas da Vingança (Firestarter).

Andy e Victoria tem toda a pinta de ser um casal comum, com a exceção de que, na época em que eram estudantes universitários, fizeram parte de testes com drogas experimentais, além de ambos terem poderes telepáticos e de telecinese. O fruto das experiências é que sua filha Charlie, com 10 anos, tem um incrível e, até então, controlado poder piro cinético, ou seja, ela pode, com a mente, provocar fogo, queimar qualquer coisa, mas quando começa a ficar com raiva tem dificuldades de controlar esse poder. O governo e as agências que fizeram os experimentos neles estão há mais de 10 anos atrás do casal e da menina, pois sabem que ela pode ser útil, já que ela é praticamente uma bomba mental humana, e contratam um velho cobaia de experimentos e assassino profissional para caçar a família e buscar a menina em uma busca literalmente explosiva.

Já tinha falado na apresentação que o primeiro Chamas da Vingança, de 1984, tinha aquele charme oitentista, bons atores veteranos, uma Drew Barrymore mesclando pureza com malvadeza. Essa sua nova versão de 2022 é, com toda minha sinceridade, extremamente dispensável. Não sei se foi pela curta duração do filme, mas é muito mal-acabado, personagens muito mal construídos, tem soluções rápidas demais e um final extremamente apressado. Mas e o pior: mesmo com toda a tecnologia dos anos 2020, os efeitos pirotécnicos, que poderiam ser a cereja do bolo em comparação a 1984, onde tudo era mais difícil, deixam muito a desejar. O roteiro não tem muitas surpresas em comparação ao original, Scott Teems adapta a trama de King, corta algumas coisas, dá umas aliviadas em questões morais para 2022, mas o filme parece uma corrida maluca que não sai do lugar, e quando sai, simplesmente acaba, sem clímax, sem suspense e com uma vingança com bastante chamas, que comparada ao do primeiro filme, é bem mixuruca. Ou seja, se o original já era um filme mais escanteado, mas que ao menos para mim valia pelo pôster que chamava atenção, além de virar xodó em reprises de canal aberto, realmente não sei qual seria o sentido de um remake para essa trama de uma Carrie – a Estranha infantil, obra menor do trabalho de Stephen King. Mas para não dizer que o filme não tem algumas cenas “boas”, ao menos uma passagem dele vai ficar marcada como uma piada pronta, a do literal churrasquinho de gato, que Charlie provoca em um bichano bravo quando ainda não dominava seus perigosos poderes. Mas calma, antes de falarmos de crueldade animal, já adianto que até enterro e reza da menina o bichano torrado ganha. Não tem como levar a sério mesmo. E outro destaque é a trilha sonora composta pelo mestre John Carpenter, juntamente com seu filho Cody Carpenter e o fiel escudeiro de Carpenter pai, Daniel Daviesé, muito boa e cria alguns climas bons nas parcas cenas de suspense do filme, dando o tom anos 1980, com roupagem atual.

Zac Efron, como Andy, o pai da menina, tem uma atuação discreta e acaba sendo mais ele mesmo, leia-se, uma interpretação sem sal de um ator fraco. Michael Greyeyes, como o índio caçador da família Rainbird, que outrora também foi um rato de laboratório até tem boas cenas de ação, mas só para comparar: no original tivemos um George C. Scott nesse papel (vemos que na nova versão o cuidado no elenco passou longe). Ryan Kiera Armstrong, a menina que interpreta Charlie, dá pra se dizer que é a melhor do filme, pois ela cria uma personagem realmente poderosa e vingativa e o desfecho final do filme, em que ela enfrenta o aparato de segurança DSI, passa um sentimento de raiva poderoso e não poupa labaredas para fritar um a um quem tenta bloquear seu caminho.

Chamas da Vingança poderia muito bem ser aqueles filmes de catálogo de streaming, que às vezes, em uma tarde despretensiosa poderíamos ver para passar tempo, mas passar para uma tela grande é realmente desnecessário. Um remake de um filme que já não era uma maravilha, com uma direção preguiçosa, um roteiro afobado e efeitos especiais tinhosos para 2022, vale talvez pela atuação, em alguns momentos, da menina Ryan Kiera Armstrong, mas tem tudo para ser esquecido com o passar dos anos, e como não existe mais locadoras, nem o cartaz que é semelhante com o de 1984, diria até mais sinistro, irá impressionar a molecada de hoje em dia…

 

Mais do NoSet