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CRÍTICAS

Crítica – Downton Abbey – O Grande Final

Crítica – Downton Abbey – O Grande Final
  • Publishedsetembro 11, 2025

Como já tinha falado em minha crítica, no lançamento do segundo filme da série, não fica difícil entender o porquê de o seriado Downton Abbey fazer tanto sucesso mundo afora. Além do esplendor visual e grandes atores, fez da vida de uma outrora família aristocrata de grande poder na Inglaterra sofrer com o século 20 e suas mudanças, tudo isso permeado por intrigas familiares, romances, segredos, núcleos divididos entre a elite e os serviçais, enfim, aquele novelão que todo mundo gosta. Infelizmente não temos mais a Lady Maggie Smith para nos abrilhantar como Lady Violet, e como era previsto uma trilogia de filmes, ela é fechada com o Downton Abbey – O Grande Final (Downton Abbey – The Grand Finale, 2025), com Simon Curtis novamente na direção.

Ainda digerindo a morte de Lady Violet, os Crawley, adentrando aos anos 1930, têm certa dificuldade de enfrentar os novos tempos. Lady Mary causa um rebuliço na aristocracia ao anunciar seu divórcio depois de aguentar poucas e boas de Henry Talbot. Mas prontamente a família abraça com apoio a na época vergonhosa decisão. Para completar, Harold Levinson, irmão de Lady Grantham, volta da América com um amigo investidor, mas acaba dando a notícia que quase toda a herança deles foi perdida em investimentos furados ou golpes dados por Gus Sambrook, que ainda tem tempo para ter uma noite de amor com Lady Mary. Envolvidos em dívidas, e com dificuldade de saná-las, eles precisam vender propriedades, para desespero de Robert Crawley, que não entende a crise que a família passa, mas está cada vez mais decidido que as novas gerações devem assumir as rédeas da família. Enquanto isso, no núcleo da cozinha, ou dos serviçais, Charles Carson, mordomo decano da família, meio a contragosto, está prestes a se aposentar e passar a função para Andrew Parker. A visita de Thomas Barrow, ex-mordomo, agora ator e seu namorado (não assumido) Guy Dexter, que trazem o dramaturgo Noel Coward pra Downtown, também mexe com o pessoal, mais precisamente Joseph Mosesly, professor do local e roteirista que tem sonhos de seguir carreira.

Simon Curtis assume novamente a direção e conta com o roteiro do criador da série, Julian Fellowes, para nos apresentar o último capítulo da saga dos Crawley. O filme mantém o tradicional esmero técnico, com figurinos e cenografia deslumbrantes, em um retrato fiel da Inglaterra do início dos anos 1930, e ainda livre da Segunda Guerra, que só viria nove anos depois. Mais uma vez Julian dá um show de argumento, com diálogos precisos, aquele humor inglês refinado e atualiza a trama como assuntos como divórcio, liberdade feminina, crash da bolsa, ruína financeira, decadência elegante da elite, amores escondidos ou proibidos para a época e muita arte. O diferencial, tanto na época que era uma série de televisão até as adaptações cinematográficas, é que Dowtown Abbey sempre foi um bastião de grandes diálogos e embates de atuações de prender o espectador. E nisso, a terceira e última parte da saga mantém a excelência, em uma trama que jamais entra para a dificuldade de compreensão, é simples até, mas jamais perde o grau e teor da profundidade e bom humor dos cativantes colóquios.

E como praxe da série, Julian também nunca se aprofunda demais numa crítica mais extensa à realidade da época. Surpreende a submissão dos empregados de Downtown, sempre vivendo à mercê da elite fútil, calados na úmida cozinha. Uma escravidão velada, onde ao invés de Casa Grande e Senzala, seria algo como Downton Abbey e cozinha. Essa crítica social é quase nula no filme, mas agride aos olhos de quem assiste tanta submissão, até na figura do mordomo Charles Carson, que mesmo livre, quase como um alforriado, não consegue se despir do papel de serviçal, numa preocupação constante com o bem-estar da mansão e dos patrões.  Mas Julian e Curtis estão mais preocupados em mostrar a fábula da família aristocrata, até porque a Inglaterra dos anos 1930 não devia dar bola mesmo para essas castas sociais na aristocracia.

Quem assume cada vez mais protagonismo no filme é Lady Mary, numa atuação sempre precisa de Michelle Dockery. Com força e elegância enfrenta os tabus da sociedade como uma mulher divorciada e disposta, dentro do possível, a manter firme os Crawley, mesmo falidos. Paul Giamatti está de volta como o irmão de Cora e tio de Lady Mary, depois de uma experiência nos Estados Unidos não muito agradável, perdendo a grana da família, em mais uma atuação de destaque do ator. No mais, devido à pulverização de protagonismo, muito bem costurados e divididos pelo roteiro, todos os grandes atores brilham como sempre, em que cada história é muito bem trabalhada e dividida como uma deliciosa novela. Até Noel Coward, um dos mais completos artistas da história inglesa, tem uma ótima participação com a atuação divertida de Arty Froushand.

Downton Abbey – O Grande Final finda com estilo a cativante história dos Crawley e de maneira digna. Uma epopeia que começou em 1912, ainda na série de TV, foi vivenciando momentos cruciais do início do século 20, chegando até os anos 1930 com grandes histórias, habilmente costuradas, tornando-se uma das séries mais populares dos últimos anos. E a trilogia para o cinema não fez feio. Esse terceiro filme mantém a qualidade técnica de sempre, com uma reconstituição impecável, diálogos marcantes e bom humor na medida certa, que sempre usando a macro história como fundo, se preocupou mais com a micro história dos problemas mundanos dos Crawley e todos a sua volta (é interessante até rever os outros filmes para lembrar de tantos personagens). Logicamente que Lady Violet faz muita falta como a inesquecível Maggie Smith, mas ao menos o diretor teve uma sensibilidade ímpar em homenagear a atriz e sua personagem, em um momento de muita emoção do filme, fechando com requinte uma história inesquecível.

Written By
Lauro Roth