Teatro à Distância – “Pós-F”

Uma das searas mais prejudicadas com a pandemia do Covid-19 foi a artísticas. Os cinemas, picadeiros e teatros não podem aglomerar o público, mas os artistas precisam trabalhar e as histórias precisam ser contadas, então a arte de adapta para o mundo virtual.

A maior prova disso é a possibilidade de conferir uma peça de teatro de longe. A peça em questão é o monólogo “Pós-F”, estrelado por Maria Ribeiro, direção de Mika Lins e produção de Dani Angelotti. O texto é assinado por Fernanda Young e recebeu adaptação Caetano Vilela.

A estreia aconteceu no dia 12 de setembro, às 20h, no Teatro Porto Seguro, em São Paulo capital. Eu, como representante do site, consegui assistir a quilômetros de distância, em Mossoró, Rio Grande do Norte. Uma das poucas vantagens do isolamento social!

Mas vamos falar da peça em si …

“Pós-F” foi a primeira obra de Fernanda Young de não ficção, ganhador do prêmio Jabuti de 2019. A própria autora começou a adaptar sua obra para o teatro, escolhendo a diretora e a atriz, mas, infelizmente, veio a falecer no dia 25 de agosto do ano passado. O trabalho continuou e se tornou uma homenagem a ela.

O texto questiona o feminino e o masculino, não os padrões em si, mas a forma como Fernanda Young os via, como ela encarava tudo o que a sociedade lidava com as atitudes femininas e masculinas. Isso é feito com uma espécie de retrospectiva de momentos de sua vida, lembranças analisadas pelo olhar de alguém que aprendeu e ensinou muito.

Duas sentenças são muito fortes e guiam a conversa, “Eu não admitia o feminino” e “oh, como sonhei com coisas impossíveis”. O primeiro faz alusão justamente a esses padrões de beleza, ficando claro quando ela admite que passou anos raspando o cabelo, que não queria parecer delicada para o mundo.

Esse é um dilema atual para todas as mulheres do mundo, ser mulher e feminina, mas ainda ser poderosa, forte e empoderada. De alguma forma ainda confundem delicadeza com fraqueza, força com agressividade. Não sei se essa era a intenção do texto, mas foi a primeira coisa que eu pensei ao ver a interpretação desse trecho.

A segunda sentença veio após ela comentar sobre a primeira vez que foi mãe, contando o quanto queria ser perfeita em tudo, planejando cada passo e tentando agir da forma como era esperada. Foi a única vez que tentou se encaixar em algum tipo de padrão, mas serviu para ter mais certeza de seus questionamentos, de seu comportamento e de seus próprios desejos.

O monólogo dura em trono de 40min e parece ser mesmo uma conversa particular. Maria Ribeiro, a atriz que deu vida ao texto, se encontra sozinha no palco, que parece um quarto, com folhas de papel desenhadas penduradas no teto, desenhos feitos pela própria Fernanda Young. Ela não falava como se estivesse em uma peça, mas como se estivesse conversando consigo mesma, extremamente natural.

Particularmente, não consigo ver outra atriz que pudesse expressar tão bem esse texto (palavras de leiga). E o fato de ela ter feito a peça sem público físico me faz admirar ainda mais, usar o palco para uma plateia vazia não é fácil (mesmo sabendo que a razão é nobre).

Vejo essa estreia como uma pontinha de esperança para o teatro e os atores que vivem disso, torço para que a arte sobreviva aos tempos sombrios da pandemia e continue nos encantando e nos fazendo questionar.

Até mais!

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