Crítica: O Pintassilgo
Carel Fabritius foi um pintor holandês que viveu no século XVII. Século XVII que é considerado o século de ouro nas artes nas terras Batavas. Século de Fabritius, Rembrandt (A Ronda Noturna) e Veermer (Moça com o Brinco de Pérola). Fabritius aos 20 anos se torna discípulo de Rembrandt ao estudar no seu atelier e é considerado por esse um de seus melhores alunos criando um estilo diferente de seu mestre. Por volta de 1650 se muda para Delft, cidade de Jan Veermer, que se torna seu aluno. Quem também foi aluno de Fabritius foi outro talento daquela era: Pieter de Hooch (A Manhã de um Jovem). Quando Fabritius estava no seu auge, com seu estilo carregado na luz e nas cores vivas, retratista renomado da época, uma explosão na fábrica de pólvoras de Deltt arrasa o bairro em que morava. O pintor não resiste aos ferimentos provocados pela tragédia e morre precocemente aos 32 anos. De seu atelier poucas obras ficaram intactas, nem uma dúzia talvez, mas entre elas sobra O Pintassilgo. E também é de uma explosão, só que dessa vez no século XXI e provocado por terroristas que o diretor John Crowley (Brooklyn) nos apresenta ao filme O Pintassilgo (The Goldfinch).
Um atentado a galeria de artes do Metropolitan Museum em Nova York provoca a trágica morte da mãe do menino Theo Decker que a acompanhava na exposição. Theo sobrevive ao atentado e acaba levando com ele o quadro O Pintassilgo. Praticamente órfão, já que seu pai o abandonou, com apenas 13 anos e sem ter para onde ir é adotado pela família de um dos seus melhores amigos, Andy. Lá tem como acolhida a Samantha Barbour que logo se encanta pela educação e doçura do menino e se sensibiliza pela trágica historia dele. Theo também conhece Hobbie, um antiquário que passa a ser um guru do rapaz, que adora arte e antiguidades além de ser tutor de Pippa, uma menina como ele, sobrevivente do atentado. Até que um dia seu pai, um alcoólatra, ator frustrado e trambiqueiro, junto com sua madrasta, resolve levar Theo para Las Vegas. Então Theo larga a imensidão de ferro de Nova York pelo ensolarado deserto de Las Vegas. Lá conhece Boris, garoto cosmopolita, também órfão de mãe, filho de um ucraniano e que se torna seu melhor amigo, além de apresentar um novo mundo de drogas e álcool, combustíveis para enfrentarem a solidão e seus dramas existenciais. O tempo passa e Theo agora está em Nova York novamente, trabalhando com arte e antiguidades com Hobbie, prestes a se casar com a filha de Samantha, Kitsey, mas o segredo que leva desde aquele trágico dia do atentado começa a abalar sua vida.
Produção da Amazon, O Pintassilgo tenta em duas horas e meia passar um pouco do que foi o grande livro de mesmo nome de Donna Tartt. Vencedora do Pullitzer de ficção de 2014 e com 700 páginas foi praticamente impossível sintetizar o turbilhão emocional da obra de Donna para a tela grande. O filme bem que tenta usando uma edição que conta a adolescência de Theo e pula para sua fase adulta em diversos momentos do filme, mas acaba mais prejudicando a compreensão do que ajudando a entrarmos na alma da trágica vida de Theodore Decke. Destaques positivos são alguns momentos do garoto na sua estada em Las Vegas e sua amizade com Boris. Os dois atores Oakes Fegley e Finn Wolfhard que fazem Theo e Boris na adolescência tem uma bela química, ajudados pela bela fotografia luminosa e clara dos desertos de Las Vegas lembrando um pouco as cores e a arte de Carel Fabritius. Nicole Kidman como Samantha Barbour também sempre elegante e autêntica ajuda contribuindo para o núcleo de Nova York.
Uma pena que um filme com um elenco tão qualificado como Ansel Egort, Nicole Kidman, Sarah Paulson e Luke Wilson, não consegue sensibilizar e cativar o público, aliás nem levar púbico já que é um fracasso de bilheteria desde sua estreia. Se no livro as emoções, o drama pessoal, o saber lidar com perdas, recomeços, o encantamento com o personagem de Theo que busca se encontrar com ele mesmo cativam, o filme deixa a desejar, às vezes confuso, com arestas mal fechadas, um perfeito gosto de quero mais que nunca acontece. Fazendo uma comparação com o próprio título do filme, sua história se parece com O Pintassilgo do quadro: preso ao poleiro e com poucas chances de alçar grandes vôos.