Crítica – Juntos
As duas primeiras semanas de agosto deste ano podem ser consideradas um verdadeiro deleite para os fãs de terror. Semana passada tivemos a estreia do surpreendente A Hora Mal, que como mesmo falei não é apenas um dos melhores filmes do gênero do ano, como um dos melhores filmes de 2025. Já nessa semana outra joia rara e aguardada estreia, aporta nos cinemas brasileiros o filme Juntos (Together, 2025), com direção de Michael Shanks.
O filme começa com uma despedida da cidade grande do casal Tim e Millie. Os dois reuniram os amigos para uma festa, já que ela conseguiu um emprego de professora numa escola de nível fundamental no interior, e Tim, um músico que ainda não emplacou na carreira, segue com ela na nova vida. O que poderia dar errado numa nova vida, numa bucólica cidade, a não ser o tédio? Em uma tarde, o casal, querendo conhecer a natureza local, faz uma trilha e acaba caindo num buraco. Como chovia muito, e a dificuldade de subir de volta para a superfície era grande, o casal acaba dormindo na estranha caverna, que no passado foi uma igreja com estranhas crenças. Quando acordam, suas pernas estão grudadas, como se fossem unidas por cola. Eles se soltam e seguem sua vida. Mas aos poucos, começam a ter uma estranha sensação de que precisam estar juntos, apesar da relação deles não ser nada boa. Mas aquela força estranha os faz ficar cada vez mais próximos, de uma maneira surreal, deformadora e de extrema codependência.

Juntos, de Michael Shanks, é uma gratíssima surpresa no ano. Longe de ser uma obra-prima do gênero como alguns apregoam, e sim, um bem realizado filme, que mexe com temas como relacionamentos em crise, inevitáveis recomeços, necessidade compulsiva de atração, alma gêmea ou metades da laranja, como diria Fábio Jr. Tudo isso regado a uma história que une sacrifício, uma substância estranha, citações a teorias de Aristófanes, muito humor, surrealismo, e é claro, um body horror de primeira. O filme não procura dar grandes explicações sobre a origem da estranha maldição que acomete o casal, apenas que a tal igreja tinha crença na união extrema e que a salvação estava em jamais abandonar a outra metade. Mas o que pega mesmo é a piração em cenas nonsense e divertidas, de como um casal, literalmente, pode se grudar um ao outro.

E a deliciosa química entre Dave Franco e Alison Brie, casal na vida real, dá mais verossimilhança às situações, pois só um casal de verdade pode ter essa leveza instintiva de personificar na telas essas imensas crises com muito bom humor. Ambos tem ótimas atuações, o inseguro e insatisfeito músico Tim, que sempre dá desculpas de sua pasmacenta vida, um adolescenete de 30 anos, o que acaba irritando a determinada Millie, que às vezes até serve como apoio materno ao imaturo Tim. Apenas seus olhares já nos passam a sensação de que a relação dos dois estaria por um fio se continuasse daquela maneira, pré-substância ou maldição, não teria futuro.

Juntos também um filme de terror corporal, que anda em voga nas produções recentes e mais quentes de Hollywood, vide A Substância. E todas essas ligações grudentas entre o casal são muito bem criadas, com efeitos realistas e muito bem utilizados. E a própria atmosfera da casa de interior, isolamento e ambiente inóspito tem um grande trabalho de fotografia de German McMicking, que sabe utilizar o novo habitat do casal como uma espécie de casulo seguro para a tal transformação.

Mais que apenas um filme de terror, Michael Shanks nos apresenta um filme sobre como relacionamentos se esgotam na mesmice, mas sempre existe tempo para um recomeço, ainda mais quando os membros do casal perdem a individualidade, já que eles estão tanto tempo juntos que quase são uma entidade, é nisso que o filme brinca. Acho que descamba muito para o bizarro e humor na parte final, mas nunca deixa de causar estranhamento, tanto pelos efeitos sonoros cortantes como pelas viscerais imagens. Uma romântica história de crises, amor, entrega e sacrifício para chegar ao grude eterno. Vale a pena conferir.
