Crítica | Frankie
Há cerca de 35 km de Lisboa em Portugal, fica a vila de Sintra. Um pequeno paraíso próximo ao mar, com estuário ao Rio Tejo, repleto de belezas naturais e história que datam da era de bronze, romana e ocupação muçulmana. Terra que foi residência de reis como Manuel I (1495-1521). Tendo belezas como o Palácio Nacional de Sintra, a Quinta da Regaleira, Castelo dos Mouros, o íngreme Palácio da Pena, enfim marcos históricos. Em Sintra também são famosos os pasteis de Cruz Alta, a massa crocante com doce de amêndoas dos Travesseiros de Piriquita, além das deliciosas queijadinhas. O clima bucólico é marcado pelas ruas e ruelas de paralelepípedo, ondem turistas passeiam sem rumo. Um dos destinos dessas caminhadas é chegar ao parque da Liberdade construído numa encosta, repleto de bosques, alamedas e trilhas, cercadas por diversos tipos de árvores, onde a natureza se faz como remédio nas suas subidas e descidas pelos caminhos do local. Sintra também serve de cenário para o filme do norte-americano Ira Sachs com roteiro seu e do brasileiro Mauricio Zacharias que contam uma história de família embrenhada pelas belíssimas paisagens da vila portuguesa, falo de Frankie (idem, 2019).
O filme conta um dia de férias da família de Frankie, uma famosa atriz francesa que por anos luta contra um câncer, mas que começa a se dar conta que tem pouco tempo de vida. Resolve juntar sua família para uma viagem que mais parece uma espécie de despedida em vida pela bucólica e histórica Sintra em Portugal. Junta seu marido, o filho, a filha adotiva e o marido dela, sua neta, seu primeiro marido e convida também uma amiga e cabelereira de cinema que traz seu namorado. A trama gira em um dia de encontros e desencontros dos personagens que expõem seus problemas e dúvidas tendo reações opostas ao drama de Frankie.
Às vezes, em meio a tantos efeitos especiais, sons ensurdecedores, montagens frenéticas e explosões, assistir um filme minimalista e reflexivo como Frankie pode ser considerado um alívio para os olhos, ouvidos e mente. Apesar de o filme ser de um americano (o excelente Ira Sachs), que como quase todos tentam, mas quase nunca acertam em fazer o seu filme europeu, Frankie tem mais acertos que erros. Ao começar pela belíssima fotografia, aliás, fazer planos abertos, explorar as belezas de Sintra, suas cores e bucolismo, já é uma benção para um diretor de fotografia que no caso de Rui Poças soube usar o vilarejo quase que como um personagem a mais do filme, tamanha a inserção das suas paisagens na trama . Quanto ao roteiro, feito a quatro mãos, entre Ira e o brasileiro Zacharias, eles acertam em resumir, ou ao menos tentar, os dramas pessoais de uma família inteira, cada qual com suas dúvidas, traumas e medos em apenas um dia de turismo na cidade. Senti um pouco de dificuldade em juntar tantas pessoas sendo algumas cenas desnecessárias e um pouco rasas, lembrando um pouco alguns filmes do Woody Allen e do Robert Altman, mas longe da genialidade de costura de enredo que os dois sabem fazer muito bem, mas um mérito do roteiro é sempre fugir do sentimentalismo barato. Em nenhum momento o filme é dramático mesmo com a difícil assimilação da finitude da personagem principal, nunca cai para o sentimentalismo e sim para a reflexão e a melancolia.
O elenco está muito bem com Isabelle Huppert no papel da talentosa Frankie. Huppert não nos dá a melhor atuação da sua vida, mas cumpre bem o papel da artista que sempre quis ter tudo sob controle e mesmo em um momento que não tem controle sobre a vida tenta controlar o mundo a sua volta, dominando o filho, querendo arranjar casamento para ele, tentando controlar os sentimentos do marido que não aceita perder a mulher de sua vida. Brendon Gleeson e Jeremie Renier estão muito bem nos papeis de filho e segundo marido, o primeiro tentando superar os fantasmas do passado e o segundo no tom mais dramático do filme não suportando a dor do fim da existência de Frankie. Marisa Tomei e Vinette Robinson são pouco exploradas na trama, mas seguram bem os papeis mais secundários.
Frankie é um filme que abusa de longos planos, diálogos em diversas línguas, localidades que inserem belezas nas imagens, tenta falar sobre divórcios, medo da perda, solidão, futuro, mas que carece um pouco de profundidade em tratar todos esses temas. Se o filme acerta, em parte, dando outro prisma pra contar um drama que é a inevitável finitude do ser humano sem abusar de clichês dramalhões, ele erra em conduzir mal tantos personagens que, com raras exceções, não conseguem transmitir a sua essência nesse momento de reflexão e união familiar forçado.
Mas, como falei antes, em épocas de tantos excessos e frenetismo cinematográficos, assistir descompromissadamente, sem buscar reflexões e respostas existenciais, o filme é um calmante agradável, pois como é raro para nós contemplar o silêncio e a imagem, principalmente representada na cena final, onde todos os personagens chegam ao ponto de encontro marcados por Frankie e logo voltam, vemos que somos apenas espectadores de um eterno vaivém chamado vida.
Direção: Ira Sachs
Elenco: Isabelle Huppert, Brendan Gleeson, Marisa Tomei
Gêneros: Drama
Sinopse: Três gerações lutam com uma experiência de mudança de vida durante uma viagem de férias a Sintra, Portugal, uma cidade histórica conhecida por seus imponentes jardins, vilas e palácios de contos de fadas.