Crítica – Acompanhante Perfeita

Sabe quando um filme tem tantas boas ideias que mistura humor, ficção científica, crítica comportamental, terror, violência, em uma inventiva história, mas infelizmente se perde em tamanha pretensão? Aquele caso de que o realizador quer colocar tudo em pouco mais de uma hora e meia, mas acaba faltando mesmo assim certo recheio? Falo do filme de terror e suspense que estreia essa semana nos cinemas brasileiros, Acompanhante Perfeita (Companion, 2025), debut do diretor Drew Hancock.

Logo no início do filme conhecemos como foi o início da história de amor de Iris e Josh. Num mercado, o rapaz derrubou as laranjas de uma prateleira e os olhares de ambos bateram e nascia ali um romance. Só que na narração de Iris, nos conta que ela, no futuro, matou o namorado. Mistério no ar e passada a apresentação, o casal vai passar o fim de semana na casa de campo de um milionário russo junto com outros amigos. Numa manhã, Serguei, o dono da mansão, dá em cima de Iris violentamente e ela acaba matando o cara. Logo depois, descobrimos que Iris é um robô. Uma espécie de namorada perfeita, que faz todas as vontades do dono, que por um celular programa sua personalidade. Mas Iris acaba se rebelando contra o seu comandante e sente que serviu de isca para um golpe maior. E com isso, a robô precisa lutar por sua pele (melhor, sua carcaça metálica) enfrentando os ambiciosos humanos e seu amor, Josh.

Drew Hancock escreve e dirige essa interessante crítica a relacionamentos abusivos, busca pelo controle dos outros, “alexização” do mundo e inteligência artificial. Acerta em nos contar essa elaborada história de uma maneira menos convencional, pois já sabemos do fim do relacionamento antes do desenvolvimento da trama, e usa alguns flashbacks para contar detalhes cruciais para a película. Uma direção hábil mostrando que Drew tem talento. Mas o grande problema do filme, como falei na introdução, é querer misturar pautas demais, tornando insípida por vezes a proposta crítica, uma mistura de filmes como Vingança, 2001 – Uma Odisseia no Espaço (com a rebeldia do sistema em aceitar ordens), Westworld e até uma pitada do recente Megan. O filme acaba tendo pouca coisa a levar a sério, abusa de um humor sem graça, apesar de umas boas tiradas envolvendo relacionamentos, explora de maneira caricata e com muito gore a violência gratuita e como já somos informados quase de início do teor da trama, o suspense se deságua em menos de 20 minutos. Além de usar como cenário uma casa no campo isolada, artifício dos mais clichês de qualquer filme de terror e suspense, não traz nada de novidades para o gênero.

Da turma de atores, Jack Quaid mais uma vez mostra que não herdou muita coisa do pai Dennis Quaid e da mãe Meg Ryan. Josh pouco convence como um cara que queria dar tamanho golpe e na maioria dos momentos mais aborrece com suas piadas sem graça e seu estilo sonolento de atuação. Sophie Thatcher, sim, leva o filme nas costas. Vinda de um papel marcante no terror psicológico, Herege (2024), agora como a androide namorada submissa Iris, entusiasma com um papel difícil, se submetendo às vontades do namorado dono, sempre mesclando um lado gelado por ser uma robô, mas deixando as emoções quase humanas se desenvolverem através de uma forte expressão no olhar, apesar de abusar de caretas esquisitas. Uma criação de personagem em que tudo funciona e agrada demais o público. O restante do elenco é um misto de cinismo e que faz pouco caso com o ser humano, uma dicotomia interessante, pior que parece que os androides do filme (programados pelo próprio homem) tem mais coração e sensibilidade que os próprios humanos.

Mas num cômputo geral, Acompanhante Perfeita agrada. Um filme barato, feito com muita criatividade e talento, que mesmo abusando de mesmices clássicas de filmes de horror, consegue criar um clima único, em que acabamos torcendo contra a maldade humana. Um filme que toca em assuntos da hora, como relacionamentos tóxicos, persuasão unilateral em um casal, brinca com o conceito de comandados que não fazem questionamentos, no caso, robôs que lembram Alexas humanas controladas e comandadas. Só que tudo de maneira superficial, por vezes cômica e sem recheio, um filme de terror que tem tudo para agradar a grande massa, pois tem elementos como sangue, pitadas de humor, recursos triviais do gênero, mas com uma roupagem moderna e bem executada e uma atuação excelente da protagonista na pele, ou pedaço de metal, Iris. Assista sem medo, procure ler a crítica depois de assistir, porque senão, metade da surpresa e da graça do filme pode se esvair…
