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CRÍTICAS

Crítica – A Mulher no Jardim

Crítica – A Mulher no Jardim
  • Publishedmaio 9, 2025

Não dá para se negar que vivemos uma época em que sustos fáceis, muito sangue, jump scares em profusão e histórias redondinhas, que não dão muito trabalho para pensar, é que fazem a cabeça dos fãs do terror. Os menos exigentes, é claro, sem generalizar. Seguindo essa lógica, temos cada vez mais filmes muito  fracos, com histórias pavorosas (se fossem no sentido de dar pavor, mas é de ruindade mesmo) que invadem os cinemas semanalmente. A Blumhouse, especialista no gênero, às vezes acerta a mão, mas na maioria das vezes, erra feio com filmes esquecíveis. Se você é daqueles que segue a cartilha do terror fácil dessa leva, A Mulher do Jardim (The Woman in the Yard, 2025), nova aposta da produtora, com certeza, vai decepcionar. O filme do talentoso Jaume Collet-Serra aposta mais no terror psicológico e sugestivo, sem muitas respostas, que é a novidade nos cinemas desta semana.

A vida de Ramona simplesmente virou de cabeça para baixo recentemente. Ela perdeu o marido em um acidente em que estava junto, e além de sofrer com a falta do seu amor, convive com ferimentos na perna e é obrigada a morar num sítio, que era a paixão do falecido. Ela tem dois filhos, o adolescente Taylor e a pequena Annie. Desde o acidente, o relacionamento entre eles jamais foi o mesmo. Num dia ensolarado,  simplesmente surge do nada uma mulher coberta de preto até a cabeça, sentada no jardim da casa.  Os três se apavoram com a estranha presença, tentam enfrentar a aparição, cada vez mais ela parece chegar  perto da casa, fazendo que fantasmas antigos, traumas pessoais e memórias negativas abalem severamente a família.

Jaume Collet-Serra, diretor de bons filmes de terror como A Casa de Cera (2005) e A Orfã (2009), com roteiro de Sam Stefanak, ousa apostar num filme de terror fora do convencional que impera nos dias de hoje. A Mulher do Jardim aposta mais na atmosfera pesada de uma família enclausurada numa recente tragédia, que em mortes, sustos que não assustam e sanguinolência. Mostrando que às vezes a luz do dia também pode ser angustiante e um bucólico cenário campestre com flores vivas pode ser o cenário para um grande filme de terror. Com econômicos 85 minutos, o diretor consegue, ao menos na primeira e segunda parte do filme, criar todo um ambiente recheado de tensão, onde a aparição da tal mulher é apenas a cereja do bolo para balançar uma família rompida. 

Ramona jamais superou a morte estúpida do marido e pais dos filhos, que sofrem com os rompantes grosseiros dela, que insiste em fazer da inércia do eterno luto sua bengala (e simbolicamente no filme, muletas) para suas atitudes. Claro que os filhos sentem que a mãe já não é mais a mesma, vive por viver e que graças à presença da mulher de preto, ela precisa tomar uma atitude. Toda essa construção dos personagens  e sua incomunicabilidade, do ambiente muito bem explorado, com a fotografia do horizonte sem fim do campo, as câmaras fechadas em closes, mostrando o confinamento da família naquela casa e a bagunça que a chegada da mulher do jardim fez na família, é muito bem desenvolvido.

Mas infelizmente, na parte final, o filme desanda para uma viagem visual, de um onirismo confuso, que mais atrapalha que provoca uma reflexão. Claro que não precisamos de respostas numa obra, às vezes cada um interpreta de uma maneira as imagens apresentadas, mas o diretor realmente perde o prumo, num pretensioso desfecho que mostra muita coisa, mas não diz quase nada, desperdiçando um potencial enorme numa atípica e interessantíssima história. 

No campo das atuações, Danielle Deadwyler, como a perturbada Ramona, tem uma interpretação empolgante e sólida, comandando as ações do filme. Seus filhos mantém o nível de atuação e são interpretados por Peyton Jackson, sempre confrontado a mãe, sabendo que agora é o homem da casa e Estela Kariha, como a inocente Annie, a filha menor, querendo sempre o colo materno, mas cada vez mais desconfiada da condição da mãe. A mulher de preto do jardim é interpretada por Okwui Okpokwasili, que por vezes lembra a atriz Grace Jones e tem uma frase marcante no filme que é: “Hoje é o dia!”.

Mesmo com muito esmero de fazer um filme cult, com uma pegada psicológica, ele vai derrapando no cansaço, que talvez com um curta-metragem poderia ser resolvido. Por mais que a casa, a enigmática mulher sentada e a inusitada luz do dia possam instigar, a morna trama não tem estofo para quase uma hora e meia de filme. Temas como luto, sucídio, traumas, ruptura familiar e segredos pessoais são o mote deste filme, que abusa das alegorias e tenta nos levar para vários caminhos, mas acaba atolando em quase todos com um final decepcionante. Mas repito, A Mulher do Jardim tem uma bela construção, personagens bons, uma fotografia que norteia o cenário atmosférico e pesado do filme, que casam bem com a trilha sonora, que acentua sem exageros os momentos de tensão da película, mas o excesso de pretensão do roteiro e  insistência do trauma (coisa frequente nos filmes de hoje), acabam transformando uma curiosa e instigante ideia num cansativo, confuso e pálido filme. Mas vale conferir e tirar suas próprias conclusões. 

Written By
Lauro Roth