Crítica – O Ritual
Desde que, em 1973, O Exorcista, de William Friedkin, baseado na obra de William Peter Blatty, trouxe pela primeira vez às telonas dos cinemas comerciais um exorcismo, muitos filmes vieram na sequência, aproveitando a onda da luta entre fé religiosa versus o mal na representação do demônio possuindo uma pessoa. É imensurável a importância de O Exorcista na mitologia do horror no cinema moderno, mas a profusão de filmes com a temática jamais causaram o impacto do original. Em pleno 2025, 52 anos depois do filme que virou a cabeça (sem trocadilhos infames) das pessoas, o diretor David Midell nos apresenta mais uma obra, dessa vez contando os fatos que inspiraram o filme dos anos 1970. Com o nome de O Ritual (The Ritual), o filme tem estreia para essa quinta-feira nos cinemas brasileiros.

Em 1928, em uma pequena cidade dos Estados Unidos, Ealing, Iowa, uma jovem, Emma Schmidt, que recentemente perdeu a mãe, tem impulsos violentos, muda a voz e tem asco a qualquer símbolo sacro. Inicialmente, é levada para ser consultada por psiquiatras e psicólogos, achando que pode ser algum problema mental. Mas os profissionais não conseguem decifrar a estranheza do comportamento dela. A família então decidiu contatar a igreja por que acham que a menina está com o capeta no corpo. Para realizar tal exorcismo são recrutados dois padres. Um deles, Theophillus Riesinger, experiente exorcista. Para acompanhá-lo, ele leva o padre Joseph Steiger, que recentemente perdeu o irmão e é por completo cético na crença de que Emma está possuída. A dupla, e mais algumas irmãs, começam os rituais para tirar o demônio da menina em um convento próximo à igreja. Começam então mais uma luta entre o bem e o mal, e mais do que nunca, uma batalha de crenças entre um padre determinado e crente nas forças do mal e outro atormentado pelo passado – e com um pé atrás do que na cabeça dele é apenas uma inútil encenação que a ciência poderia resolver.

David Midell simplesmente desperdiça uma premissa robusta, o caso que inspirou o livro de O Exorcista, em um filme genérico, sem sal e monótono. Com um roteiro dele e de Enrico Natale, baseado no caso de exorcismo mais documentado da história, tendo como base os diários do padre Steiger, o filme peca pela simplicidade de cenários. Para poupar externas e reconstituição do ano de 1928, o filme se passa praticamente no quarto do convento e algumas externas dos pátios da igreja, transformando a experiência do filme quase em um teatro filmado. E ao optar por explorar muito mais os conflitos interiores e fantasmas pessoais de dois tão diferentes padres, o filme tenta, mas de uma maneira monótona e superficial, criar um clima de terror psicológico. Mas mesmo o padre Theophillus, com sua fé quase cega e obsessão por não falhar na frente do capeta, apesar de cansado dessa eterna luta, quanto o cético e atormentado Steiger, jamais criam uma camada de profundidade para sustentar seus dramas existenciais. Fica claro que Theophillus inspirou-se no padre Merrin e Steiger no Karras do filme de 1973.

E mesmo com a insistência quase claustrofóbica de explorar o tal quarto do convento e os diversos rituais até chegar na expurgação do mal do corpo da menina, jamais somos contagiados pelo clima do filme, que é frio, opaco e monótono. E a persistência de dar um ar quase documental às sessões também não ajuda, com escolhas dos filtros da cenas, tornando os momentos mais distantes do terror. Uma falta de uma trilha sonora marcante e um ambiente mais arrepiante nas sessões de exorcismo fazem a luta dos dois padres e as freiras contra a menina do diabo, por muitas vezes, tediosas. Entendo que o diretor preferiu dar mais ênfase aos demônios pessoais dos padres que apelar para sustos fáceis e efeitos visuais assustadores, mas em um filme de terror com essa temática, me perdoem, o asco, os sustos e a atmosfera bem recriada é peça fundamental.
Nem Al Pacino salva essa bronca. O veterano ator tenta dar um ar de dignidade ao padre Theophillus, mas acaba se perdendo na verborragia e discursos mais esvaziados que jogo de futebol em dias chuvosos de inverno. Devia estar precisando tirar um pra pagar as contas… Dan Stevens, como o Padre Steiger, também tem uma atuação comedida e longe da naturalidade e realismos expostos dos dramas que o padre Karras no clássico dos anos 1970 nos apresentava. Uma atuação correta apenas. Abigail Cowen interpreta a menina que tem como encosto desde Judas Iscariotes, Belzebu e até seu pai, marcado por ter abusado da filha. Como todas as pessoas possuídas, ela apenas repete o que melhor a Linda Blair fez, não tendo brilho próprio na sempre difícil tarefa de interpretar uma pessoa possuída. Ashley Greene, como a Irmã Rose, é a que mais se destaca do time das freiras, ainda que não tenha uma atuação marcante.

O Ritual, mesmo com curta duração (pouco mais de 90 minutos) se torna uma experiência arrastada e aborrecedora. Mesmo com dias e dias de rituais de exorcismos, todos parecem iguais, quase um looping de cenas muito parecidas e que acaba não despertando o interesse no espectador. Um filme genérico, dispensável e sem graça, e como falei antes, jogou no ralo uma interessante história, um emaranhado de clichês que não surpreendem mais ninguém, e a opção por Midell explorar o psicológico dos personagens, optando para manifesto pró-fé do diretor, acabam fazendo o filme uma grande decepção do ano.
