Crítica – Superman
Costumo dizer que para muitos o cinema começou em 2008. O filme Homem de Ferro, de direção de Jon Favreau, abriu alas para um universo interminável de filmes de herois, tanto da Marvel (Disney) quanto da DC (Warner). Os filmes de personagens com superpoderes, capas e uniformes especiais, viraram uma febre e com a tal criação dos universos onde se uniam as histórias deles em distintos filmes, ela jamais baixou. O cinema virou filme de herois e continuações de velhos sucessos. A Warner, com os filmes da DC, também tinha um criado um universo de herois, mas nunca tinha chegado a altura do timing preciso entre ação, humor e entretenimento da Marvel, e resolveu trazer um cara que, com os seus filmes dirigidos pela Marvel, virou o queridinho dos fãs. Falo de James Gunn, que assumiu as produções da DC prometendo criar um novo universo para suprir os fracassos antigos das adaptações. E começou com o maior super heroi de todos os tempos, na difícil missão de nos criar um novo Super Homem. A espera acabou e nesta semana, com direção de Gunn, chega o filme mais aguardado do ano (para quem acha que cinema começou em 2008), Superman (idem, 2025), em mais uma tentativa da DC de emplacar um universo de sucesso no gênero.

Sem muitas delongas, logo no início somos apresentados ao Superman. Com apenas alguns letreiros sua origem é explicada e vemos que nosso heroi, pela primeira vez, perdeu uma batalha. Em Metropolis, tomou uma bela surra de um meta humano, o Martelo da Borávia, que era controlado através de comandos de voz e alta tecnologia pelo milionário e inimigo do Super Homem, Lex Luthor. Se a vida pessoal de Clark Kent vai indo bem, namorando a audaciosa jornalista Lois Lane, que respira jornalismo e suspira pelo heroi de capa, o Superman não anda nada bem. Depois de se meter num confronto internacional entre a imperialista Bolívia contra Jarhanpur e vazarem uma mensagem dos seus pais falecidos em Krypton, que sua missão na Terra era dominar os terráqueos, a opinião pública e as redes sociais acabam cancelando o outrora heroi mundial, que acaba sendo detido pelas autoridades, com a ajuda de Lex Luthor. Cabe então aos seus amigos na Terra, seus herois companheiros da “Gangue da Justiça”, Lanterna Verde, Mulher Gavião e Senhor Incrível e os colegas do Planeta Diário ajudar o Homem de Aço a salvar sua reputação, libertar Superman e evitar que Lex Luthor concretize seus planos de dominação territorial e de destruir Metrópolis.

James Gunn já conseguiu, em apenas um filme, apagar todo aquele clima pesado, existencialista e pseudo-filosófico de grande parte do antigo universo dos filmes da DC. Gunn fez um filme de super heroi. Colorido, divertido, repleto de ação e respeitando, dentro do possível, as eras clássicas e juvenis das histórias em quadrinhos. Em pouco mais de duas horas temos aquele entretenimento pipoca agradável de se assistir, com um roteiro em que todas as ações posteriores são explicadas pelos personagens em tom quase didático para não forçar muito o cérebro do espectador. E o diretor, que assina o roteiro também, aproveita e explora a era das redes sociais e como robôs podem estar por trás de cancelamentos de reputações com postagens fake. Tenta dar uma alfinetada em confrontos conhecidos do leste europeu com seus caricatos e estúpidos tiranos e acerta em explorar a humanidade do Superman. O personagem, mesmo sendo um alienígena ou um meta humano, conforme a definição, tem suas vulnerabilidades e se esforça em ser humano, provar que não é diferente dos terráqueos e clama por inclusão e respeito.

Fora isso, o filme tem aquele kit básico de filmes de herois. Muita destruição, efeitos especiais caprichados (o que pra um filme desse quilate é no mínimo óbvio), em batalhas épicas entre Superman e o tal Ultraman ou Martelo da Borávia, um monstrengo gigante desnecessário que só serve para tumultuar Metrópoles, além das clássicas cenas em que o heroi segura predios para não cair em inocentes populares, evita a morte de cachorros metidos segurando postes, numa homenagem ao que melhor nosso heroi da cueca vermelha sobre a calça fazia nos filmes do Christopher Reeve e nas fases menos sombrias dos quadrinhos.

David Corenswet veste bem o uniforme pesado do heroi, dando bastante humanidade ao personagem, que passa metade do filme sofrendo, apanhando e como um Rocky Balboa sempre se reergue para defender a Terra. Humor na medida, bom físico e simpatia fazem dele um belo Superman. Rachel Brosnahan está ótima como Lois Lane, lembrando muito Margot Kidder nas clássicas adaptações dos anos 70 e 80. Uma mulher forte, decidida a ir até o fim por uma matéria e completamente apaixonada pelo kryptoniano. Nicholas Hoult é o que mais decepciona como Lex Luthor. Ele até começa promissor, mas depois vira um Lex neurastênico, que perde o controle da situação, se desesperando e passando o filme todo perdido nas suas ações. Bem diferente do forte, genial e sempre sereno Lex Luthor das revistas e de outras adaptações. Nathan Fillion nos diverte como Lanterna Verde, com aquele cabelo de tigela e humor ácido. O restante dos atores são apenas coadjuvantes, a equipe do jornal é quase nula na trama e o relacionamento entre Jimmy Olsen (Skyler Gisondo) e Eve Teschmacher (Sara Sampaio), a namorada e assistente de Luthor, beira o caricato até para um filme que tem como intuito não se levar a sério.

O acréscimo de herois como Senhor Incrível, Metamorfo, Mulher Gavião, o próprio Lanterna Verde, funciona bem, como uma prévia de uma possível Liga da Justiça. Já o cachorro Krypto passa o filme todo com sua força descomunal derrubando o seu dono, atrapalhando mais que ajudando e o excesso de participações dele, forçando um escapismo de humor, acaba cansando em um ponto que ninguém mais aguenta o mala do cachorro de capa. Vilões como a Engenheira (María Gabriela de Faría), que usa a nanotecnologia como arma, funciona bem e o algoz do heroi, o Ultramen, foi feita para agradar os fãs de games, já que todos seus movimentos são controlados por comandos de voz de Lex Luthor, lembrando batalhas no mundo virtual dos jogos. Os robôs que auxiliam Superman na Fortaleza da Solidão, no gélido Ártico, são um positivo acréscimo na adaptação, dando um toque de humor e leveza nas suas aparições. Outro destaque é a trilha sonora empolgante de John Murphy e que emula muitas vezes os trechos compostos por John Williams para o clássico filme do heroi de 1978, e que ainda é a trilha definitiva do Superman.

Superman, de James Gunn, entregou o que prometeu. Os exageros de dizer que ele é um diretor genial, eu dispenso. É um cara que sabe lidar bem com entretenimento, com leve humor, com maestria e soube, aqui com o filme, dar uma cara colorida e quase ensolarada ao universo trevoso da DC. Um filme que prima por belas imagens, combates bem executados, aquele frenetismo de tontear o espectador desacostumado com o gênero, um roteiro simplista e didático, boa construção de personagens e tom de nostalgia e referência ao passado cinematográfico dos primórdios do Homem de Aço, que aqui é um heroi que inspira e exala humanismo. Não se pode esperar muito de um filme de super herois além dessas fórmulas simples. James Gunn conseguiu passar no teste de salvar os herois da DC, fazendo o básico que o tornou uma referência nesse universo e abrindo as portas para uma promissora, e principalmente rentável, nova era de filmes de super herois. Mas aos ardorosos do gênero, não se esqueçam, o cinema não surgiu em 2008 e existe muito mais que um universo expandido de seres com ou sem capas com poderes que pode ser explorado. Mas por enquanto, assistam sem medo, porque Superman é uma boa e despretensiosa pedida, que é exatamente o que o povo quer.
