O Quarto ao Lado (2024)
O Mais Simples que Pedro Almodóvar pode Ser.
“O neoliberalismo está acabando com o mundo e a extrema-direita está acelerando o processo”
Em certo momento da obra, o personagem de John Turturro conversa com a protagonista Ingrid (Juliane Moore) sobre a finitude da vida, e extrapola seus pensamentos para a finitude da humanidade como um todo. Estamos num ponto sem volta para a sobrevivência da humanidade e não fazemos nada contra isso. Essa é a agonia de Almodóvar, e é o que ele grita da maneira mais simples que pode durante a projeção. E ainda vai ter gente sem entender.
Antes de entrar de vez nos méritos e deméritos da película, tenho que comentar a experiência pessoal que tive de estar na cabine de O Quarto Ao Lado, se isso não interessar, pode ir para depois da imagem a baixo que entro mais na discussão sobre o filme em si.
O público que vai à cabine, geralmente é formado de críticos e influenciadores da área, então são pessoas que se não tem um conhecimento especializado em cinema, ao menos, costuma assistir a bastante filmes para produzir seus conteúdos. E esse repertório de obras assistidas, faz com que consigamos comparar e analisar o que a gente assiste com certa particularidade. Dito isso, uma coisa que me incomodou bastante na minha ida ao cinema foi o fato das pessoas gargalharem sem parar durante a exibição de O Quarto Ao Lado. O filme trata de uma morte em particular para refletir sobre a morte do planeta da forma que vivemos. Eu entendo que em alguns momentos o Almodóvar realmente escreve de maneira irônica, o que faz algumas risadinhas saírem pelo nariz. E tem uma sequência em particular construída para a comédia no terço final do filme.
Mas, durante toda a exibição, o público gargalhava como se estivéssemos diante do melhor filme atuado pelo Adam Sandler. O riso pode vir do desconforto, a gente não sabe direito o que sentir e aí vai lá e dá uma risada para dar vazão ao sentimento desconhecido. Mas reforçando o começo da fala, realmente não consegui entender como um público formado, marjoritariamente, de pessoas acostumadas àquele ambiente e que estavam ali trabalhando, conseguiram ver esse viés hilário nesta obra em particular de Almodóvar. Várias vezes eu me peguei pensando: será que sou eu que não estou entendendo?
Enfim, depois desde breve desabafo, segue a crítica:
O Quarto ao Lado conta a história de Ingrid, uma escritora de sucesso que fica sabendo que uma amiga muito próxima de sua juventude Martha (Tilda Swinton), está com um câncer terminal. Ingrid decide visitá-la e a amizade das duas volta a se fortalecer nesse momento difícil. Enquanto Ingrid sempre temeu muito a morte, Martha se mostra uma mulher bastante resiliente com fim de sua vida.
Almodóvar é bastante direto em relação à seus pensamentos neste filme, e constrói uma história envolvente colocando seus pensamentos na boca de diferentes personagens para construir uma espécie de simples manifesto anti-capitalista.
O diretor ainda reflete de maneira genial, como lhe é de costume, a maternidade. E esbanja mais uma bela direção de arte tão icônica como em quase todos os seus filmes. Mas o discurso claro e cristalino sobre o fim da humanidade enquanto vivemos nossa vida, ou vivemos nossa morte, permeia toda a obra.
O personagem de John Turturro, citado no começo do texto, aparece pra deixar ainda mais evidente as opiniões do realizador em relação à sociedade, a vida durante e pós pandemia, tudo é exposto com uma simplicidade íntima sem muita brecha para discussões. Essas são as visões do Almodóvar sobre o que está acontecendo nos últimos anos e sobre o que está por vir. (ponto).
E o filmes ser “apenas” isso, é onde mora a genialidade dele. É um discurso direto e claro que vai fazer o espectador sair do cinema reflexivo sobre questões inerentes ao capitalismo tardio.
O único tropeção do filme é realmente ter que dar uma conclusão à história de maternidade por ele proposto, durante toda a narrativa isso está no plano de fundo e fiquei com um sentimento de que não era um tema que precisava ser resolvido na conclusão da história. Apontar os holofotes para os sentimentos da personagem de Juliane Moore seria uma escolha mais acertada.
Nota 9/10