Resenha: Amor de puta

Amor de puta é um livro que pode ser lido de diversas maneiras. É uma história ao mesmo tempo complexa e que levanta questões acerca do conceito de amor como conhecemos e extremamente simplista no que diz respeito aos dilemas vividos pelo protagonista. É um livro em que a escrita me surpreendeu de forma revigorante, mas perde pela personalidade do protagonista e seus dilemas pessoais.

“’Amor de Puta’ é uma história de amor. É uma metáfora de nossa vida, sempre motivada por interesses, em que estamos incessantemente procurando por amor, reconhecimento, razão de viver… é a história João, executivo carioca forçado, como muitos outros, a se mudar para São Paulo. Isso o faz perceber que jamais fora senhor de suas ações e, a partir daí, começa uma catarse pessoal tendo como elemento de provocação uma garota de programa, que põe seus valores de ponta cabeça. Apesar de toda a ousadia, é uma trama de questionamentos, com paixão e sensibilidade na busca de caminhos. João vive essa catarse, na tentativa de resgatar sua “criança interior”, há tanto oprimida pelos valores e dogmas da sociedade. Ele vive essa metáfora da maior relação de interesse da história da humanidade, onde se vende aquilo que se não deveria se entregar por negócio e que acaba se convertendo no amor mais puro, surpreendente e inesperado ao se deparar com a dedicação espontânea de alguém que lhe dá por carinho aquilo que aos outros vende… Viver essa história é um convite que exige coragem, todos os dias. Encontrar-se consigo, ou continuar jogando o jogo, os vários jogos da vida, no trabalho, na família, no relacionamento, onde quer que seja, até que a vida te ponha na frente de uma janela fria numa tarde de chuva em São Paulo, e não se tenha mais para onde voltar. João viveu isso. E você, vai tentar?”

 FICHA TÉCNICA

Título: Amor de puta

Autor: Ricardo Daumas

Ano: 2016

Páginas: 280

Idioma: Português

Editora: Sensus

Nota: 3/5

Amor de puta começa com a mudança de João para São Paulo. Carioca de raiz, ele se vê largado nesse novo e incessante planeta que é São Paulo. Não demora para que o ambiente de trabalho seja apresentado, alguns personagens que terão papéis significativos ao longo da narrativa aparecem logo de cara e claro, Celeste, a vizinha, logo chama a atenção de João. Apesar do que sugere o título, o amor de Celeste por João não é o enfoque. Ao contrário, fica a impressão de que Celeste não chega nem a ser uma coadjuvante nessa aventura de João por seu eu interior.

João me incomodou como há muito não me sentia incomodada por um personagem. Não percebi muito na sua personalidade além da sua posição social que justificasse o número de mulheres que se sentem atraídas por ele. Isso não fica claro nas suas ações e, às vezes, nem o próprio personagem consegue compreender.

A forma rasa com que ele se encanta por quase toda mulher que lhe cruza o caminho nadou contra a correnteza de uma história que eu acreditava ser sobre quebrar barreiras. Ele não demonstra um genuíno encantamento por suas personalidades ou até mesmo por sua beleza. De certa forma, todas elas estão ali para servirem como algo para ele, seja uma escapatória de pensamentos que ele quer evitar, seja para o envaidecer (como o próprio diz algumas vezes ao longo do livro) ou para participar de alguma fantasia interior que ele tem.

Com o passar do tempo, João vai se encontrando em São Paulo. É uma lição sobre seguir em frente apresar de todas as barreiras e obstáculos que a vida pode colocar em nosso caminho. João abraça a nova cidade da mesma forma como começa a abraçar sua nova vida.

O livro não é dividido em capítulos da forma como a maioria dos livros é escrita. Ele segue a narrativa quase que ininterruptamente. Apenas algumas pequenas imagens dividem parágrafos e só é possível saber que o capítulo mudou quando alguma frase ou expressão aparece grifada. Ao mesmo tempo em que essa escolha é algo diferente e inusitado, deixa a leitura mais cansativa. Já é mais difícil se envolver em uma narrativa em que são poucos os diálogos, quando o texto segue sem “quebras”, a impressão que fica é a de que se está lendo a mesma página por muito tempo.

“Eu sobrevivo por conta de gente que vive por amor à vida e me deixa em dívida, torcendo para que não me cobrem, nem desistam, pelo menos até eu me refazer, me reencontrar ou me encontrar, já não sei bem o que é o certo.”

O que sustenta bem a narrativa é a escrita de Ricardo Daumas. O autor tem uma forma leve de conduzir a história e escolhe muito bem as palavras. Sua habilidade de situar o leitor exatamente sobre o que se passa na cabeça de um homem adulto lidando com mudanças irrevogáveis é admirável. Quando me via ficando irritada com alguma ação de João, era o texto bem escrito e a forma de seguir com a narrativa que me prendia ao livro.

Toda vez que parece que João chega a uma revelação e encontra um rumo para sua vida, ele se perde de novo sem motivo aparente. É algo bem parecido com a vida, estamos sempre tendo altos e baixos e nunca vamos ter certeza de praticamente nada. Esse é outro ponto positivo da história, a verossimilhança.

Apesar de ter gostado bastante da escrita de Ricardo Daumas e da sua habilidade de criar personagens complexos e de personalidade bem estabelecida, me decepcionei com Amor de puta. Acreditava que o livro iria desconstruir paradigmas, derrubar tabus e representar a mente de um homem que se apaixona por uma garota de programa com enfoque nessa questão. Talvez não tenha sido bem essa a proposta do autor, mas penso que o terreno estava pronto para que nos fosse apresentada uma história de amor genuína, uma que se encaixa perfeitamente no século 21 e que conseguisse conquistar a mente de uma leitora ávida por narrativas envolventes e inovadoras.

 “- Acho que falta um pouquinho de sal…

Não faltava nada, nem sobrava. Celeste era um poema, um verso de bossa-nova, uma bicicleta embalada em papel de seda. Quanto mais falava mais eu me dava conta de que ela havia reiventado o mundo com sua simplicidade e leveza, aprendido a guardar as coisas boas e sublimar as ruins, e eu a invejava, como eu a invejava. A história de Celeste fazia a minha vida parecer um sonho, um sonho que eu mesmo transformei em pesadelo por absoluta falta de competência em viver comigo mesmo. Eu começava a sentir vergonha por minhas queixas patéticas, meu desconsolo de menino bem-nascido, minhas lembranças dramalhudas.”

Gostou da resenha? Já leu o livro ou ficou com vontade de ler? Então não esqueça de deixar uma curtida ou um comentário 😉

 

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