Não Fale o Mal de 2024, dirigido por James Watkins é a versão “hollywoodiana” do filme homônimo lançado dois anos atrás, realizado pelo dinamarquês Christian Tafdrup.
As versões em inglês de filmes que conseguem um certo sucesso internacional não é novidade, e passa por sucessos como Millenium (2011) dirigido por David Fincher, remake da excelente obra sueca Os Homens que Não Amavam as Mulheres (2009), por fiascos como Oldboy (2013) dirigido por Spike Lee e, até mesmo, por filmes que são feitos pelo mesmo diretor que fez o original como Vanilla Sky (2001) e Funny Games (2007).
Aqui tem uma lista com algumas dessas versões em inglês de filmes feitos em outros lugares do mundo.
(essa crítica contém spoilers, que será sinalizado.)
Não Fale o Mal conta a história de uma família estadunidense que conhece outra do interior da Inglaterra em uma viagem à Itália, a primeira família é reclusa, polida, educada enquanto os adultos da outra são debochados e espontâneos. Eles acabam fazendo amizade e, um tempo depois, a família dos Estados Unidos decide visitar os ingleses em seu sítio. As diferenças de cultura das duas famílias vai se exacerbando, até chegar um nível que problemas começam a acontecer.
Os dois primeiros terços do filme se assemelha muito ao filme de 2022, e por ser um longa tão recente, era fácil de comparar todas as semelhanças de roteiro. Neste ponto o mais interessante era assistir a dinâmica de relação dos personagens já sabendo as consequências disso, e, neste sentido, apesar da falta de inventividade da direção, foi interessante acompanhar a história já sabendo onde iria desembocar.
As boas atuações de todo elenco nesse período, também entretem o espectador. Apesar de momentos impactantes serem mal conduzidos por Watkins aqui nesta releitura, a dramaticidade do elenco prende o espectador à telona e alcança uma certa curiosidade para aquele mundo de uma maneira ligeiramente diferente do original.
Para quem não assistiu a versão de 2022, acredito que o personagem de James McAvoy carregará o filme nas costas, com seu comportamento enigmático durante grande parte do longa, fazendo sentido o material publicitário (pôster e trailer) ser todo envolto à sua figura, mesmo que ele seja o coadjuvante da película.
No entanto, no ato final do longa, o roteiro decide ir por um caminho bastante diferente do original, fazendo até com que a escolha do filme a ser refilmado não faça sentido.
(E A PARTIR DAQUI, SERÁ NECESSÁRIO SPOILERS, TANTO DESTE FILME QUANTO O DE 2022, PORTANTO, SE NÃO ASSISTIU AOS FILMES AINDA, RECOMENDO QUE PARE A LEITURA POR AQUI)
A genialidade (e não tenho medo de usar essa palavra), do filme de 2022 está em subverter o gênero de filme de sobrevivência.
Geralmente, neste tipo de obra, os protagonistas que são fundamentalmente bons, precisam liberar uma certa selvageria através de seu instinto de sobrevivência para conseguir lidar com os indivíduos que querem o assassinar. Esse tipo de história é tão contada e recontada que se saturou, e a solução de Hollywood para isso são filmes como O Homem nas Trevas (2016) ou Casamento Sangrento (2019), onde a chacina é exacerbada e o protagonista se mostra apto a revidar a caçada.
Já em Não Fale o Mal original, a subversão vem através da passividade extrema dos protagonistas. Mesmo que custe suas vidas e a vida de sua filha, os protagonistas não têm coragem de reajir diante daquela situação extrema.
Na vida real, a passividade que as pessoas costumam ter nas relações sociais, na busca de resolução de problemas sem conflito, faz com que as pessoas sejam covardes no dia-a-dia. Na obra de Tafdrup ele sugere uma ideia onde as pessoas permançam covardes até no momento de lutar por sua própria vida. E é através dessa exploração do comportamento humano que a família de assassinos de sua obra, escolhem suas vítimas. Certificam que são famílias que fazem de tudo para ser agradáveis, e a partir disso viram vítimas fáceis do modo que eles operam.
Já aqui no filme falado em inglês, a família de protagonista oferece algumas microdoses de luta desde o começo, partindo principalmente da personagem de Mackenzie Davis. Para no terceiro ato culminar em um filme de sobrevivência comum, a partir do momento em que a personagem começa a lutar por sua vida e de sua família.
A escolha para um final mais moralista e clichê, idiotiza a história impactante do longa dinamarquês e faz com que esta fita seja, na melhor das hipóteses, mais um filme esquecível para se assistir no cinema.
Os remakes feito para língua inglesa são conhecido de duas maneiras que se complementam. A primeira delas é como “A versão para estadunidense que não quer ler legendas” e a segunda como “A versão para idiotas”. E aqui, certamente é reforçado o estereótipo. Claro que a estrutura da obra é extremamente parecida com a original, fazendo com que seja claro que este filme seja remake daquele.
Mas o cerne da questão do longa de 2022 é tão diferente desse, que se este filme dissesse ser um remake de algum Sexta-Feira 13, ele seria mais honesto.
Existem longas piores e que também exemplificam de maneira burra as ideias da obra original, como Mártires de 2015, por exemplo. Mas uma releitura que não entende o ponto central de sua base como aqui em Não Fale o Mal eu nunca tinha visto.
Não Fale o Mal não é o pior filme de 2024, principalmente por conta de suas atuações. Mas está perto de ser.
Nota 2/10
TRAILER
Geralmente, o trabalho do crítico, mesmo quando não gosta do que assistiu, é recomendar que a pessoa vá ao cinema assistir o filme em questão. Mas, subvertendo a lógica aqui como o primeiro Speak no Evil faz muito bem. Não faça isso. Se você já viu o original, reveja-o no tempo livre. Se você ainda não viu, tá esperando o quê?
