Se existe a tal juventude, como temos conhecimento, a rebeldia, a transgressão, o conflito de gerações e, principalmente, o poder de consumo e influência, devemos tudo aos anos 1950. Até ali, um homem de 14 anos já era um homem e uma mulher na casa dos seus 15 e 16 anos se já encontrava o “amor” da vida poderia casar-se. Essa revolução de costumes, atitudes e direito de voz tem muita influência de dois ícones. O primeiro James Dean, com seu estilo rebelde sem causa, o jeito outsider de ser e, devido ao sucesso de seu filme Juventude Transviada, fez uma geração de garotos se inspirarem nele e um bocado de garotas quererem namorá-lo. E outro que inventou a juventude era um branquelo com voz forte e remelexo hipnotizante. Esse ex-caminhoneiro, filhinho da mamãe, com influência direta da música negra e gospel, foi Elvis Presley. Não podemos desassociar juventude, consumo e estilo do nome de Elvis. Mesmo quase 50 anos da sua morte, Elvis ainda provoca, atiça e mexe com o planeta, e nessa semana chega aos cinemas sua tão aguardada cinebiografia musical, com direção de Baz Luhrmann, falo de Elvis (idem, 2022). A sinopse é simples, conta a vida de Elvis Aaron Presley, garoto branco de Tupelo, com infância difícil, que em 1954, já um caminhoneiro, mudou o mundo com uma gravação em homenagem à mãe nos estúdios da Sun Records. O filme conta sua trajetória do ponto de vista do polêmico Coronel Parker, seu empresário desde os primórdios, e mostra sua vida, obra, medos, amores e, principalmente, canções que embalaram décadas, e sua dependência extrema da influência do seu empresário, das suas pílulas e seus traumas. Enfim, a vida de Elvis Presley. Chega a ser covardia, em um emaranhado de filmes ruins no cinema, falar dessa obra genial de Baz Luhrmann. A espera de anos valeu cada segundo e esse épico sobre a vida de um ser humano genial, genioso e extremamente talentoso vale praticamente cada minuto de suas quase três horas de duração. O australiano nos dá um show frenético, visual, visceral e luminoso de duas décadas da carreira de Elvis, e quase um recorte de três décadas de uma América que mudou demais nesse período. Abusando de cenas com três ou quatro telas, narrações arrojadas e uma montagem esplêndida, além de uma reconstituição de época incrível, vemos a história do super-herói sem poderes, que era Elvis e seu vilão preferido, que era o Coronel Parker. Está praticamente tudo ali, seu batismo de som quando teve sua infância regada a Rhythm and Blues, música gospel e country. Sua paixão quase edipiana pela mãe, seu sucesso estrondoso, o poder da fama de Elvis na revolução das mulheres, que o viam como um símbolo sexual com duas danças excitantes, aflorando a libido e provocando a fúria dos conservadores, sua fase militar, o romance com a Priscila, os filmes idiotas que era obrigado a fazer, e como sua vida começou a mudar conforme o mundo mudava, sua volta triunfal em 1968, e sua fase ao mesmo tempo genial e melancólica na cidade de plástico Las Vegas, quase um retrato de seu início do fim. Tudo isso embalado por muita droga, digamos lícita, exaustão, carência e muita paranoia de um ser humano que era doente, extremamente cobrado, mas que seu talento e perfeccionismo o transformaram num ídolo. Baz mostra tudo isso a sua maneira peculiar, mas que faz não nos desprendermos do filme um só instante. Quanto às atuações, Austin Butler hoje já é candidato ao Oscar de melhor ator. Pena que estamos em julho e algum abacaxi da Amazon pode surgir com jabá e premiar um ator minúsculo, mas Austin não se transforma em Elvis, ele faz o seu Elvis, fugindo de um cosplay do Rei, ele dá sua alma a um personagem tão complexo e perturbado, tão humano e tão herói, e Butler além de cantar em algumas passagens, incorpora Elvis, com seus trejeitos, danças, caras e bocas, às vezes parece uma mistura de Val Kilmer em Top Secret com Johnny Depp em Cry Baby, mas ambos são referências e tantas na composição do Rei do Rock. E Tom Hanks mais uma vez mostra por que é talvez um dos melhores atores das últimas décadas e nos transmite uma cara até humana, dentro do possível, do Coronel Parker, aquele que com seus poderes de persuasão dominou, abusou e explorou Elvis, mas também foi responsável por transformar Elvis na lenda que se tornou. Mais um show de Hanks em um papel de um personagem tão emblemático e polêmico. Sobre atuações podemos ficar por aqui, o filme é dos dois, um embate de Butler x Hanks, sucesso x negócios, submissão x dominação. Claro que o roteiro dá uma passada de pano na fase mais careta e conservadora de Elvis, quando ele pessoalmente foi de encontro ao Nixon e queria ser uma espécie de xerife antinarcóticos da América, e seu relacionamento com a Priscila foi um pouco superficial, e até o próprio envolvimento do pai dele, que também explorou muito o filho, foi deixado um pouco de lado, mas é uma visão de Baz e Jeremy Doner, que cunharam a história e criaram o roteiro se juntando a Sam Bromell e Craig Pearce, que tem o mérito de contar a história que todo mundo conhece, que bem filmada, com uma montagem incrível, edição e tanta e com o toque de Baz, consegue emocionar. As cenas do primeiro show de Elvis que Parker assiste, é uma aula de cinema, as colagens de That’s All Right Mama em três quadros, e a reconstituição perfeita dos shows em Las Vegas, principalmente a cena em que ele ensaia com a banda é de encher os olhos. E logicamente, um filme de Elvis sem falar da trilha sonora que por mais de duas horas nos transborda de alegria pelo prazer de poder ouvir música boa na tela grande. O filme acerta também em não dar ares de melodrama ao final da vida de Elvis, explorando pouco … Continue lendo Crítica: Elvis
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