Aquaman 2 – O Reino Perdido

Com toda a franqueza do mundo, sabendo que o Universo compartilhado da DC está literalmente acabado, qual a necessidade de termos ainda como encerramento mais um filme do Aquaman? Sabendo que tudo que foi feito antes iria água abaixo, ou fazendo um trocadilho infame com o rei das águas, se afogar, James Wan e Momoa apenas perderam tempo e talento (do diretor, é claro) fechando de um jeito indigno um universo que jamais decolou. Mas como a Warner e a DC foram insistentes, fomos “brindados” com Aquaman 2 – O Reino Perdido (Aquaman – And the Lost Kingdom, 2023), que estreia no apagar das luzes do ano de 2023.

Passados alguns anos da trama do primeiro filme, agora Aquaman é um cara cheio de responsabilidades. Além de ser o herói marítimo, divide sua rotina entre ser pai  do pequeno Arthur Junior, que sempre urina na cara do pai ao trocar suas fraldas e ser o Rei de Atlântida. Papel que faz com cada vez mais aborrecimento, já que jamais se tornou unanimidade nos povos marítimos e o conselho (leia-se centrão dos sete mares…) não coopera em nada com o reinado do rapaz. Ele ainda tem tempo de tomar cerveja escura com o pai e reviver histórias do passado para o filhão. Mas do passado ainda surge o incansável David Kane, ou Arraia Negra, que com sua eterna sede de vingança pela morte do pai, acaba descobrindo um povo perdido que pode lhe dar poder infinito, mas isso pode acabar destruindo ou poluindo tanto o mar ou a superfície. Sabendo que a Arraia não está para peixe, Aquaman tem que se unir ao seu antigo desafeto e meio-irmão Orm, que em troca da liberdade parte junto ao nosso herói para deter os planos destruidores de um Arraia Negra cada vez mais poderoso, vingativo e sem limites.

Se James Wan já tinha feito do primeiro Aquaman um Guerra nas Estrelas marítimo, um festival de criaturas inúteis das profundezas e um colorido gritante para abafar a péssima história, no segundo filme, o renomado diretor de terror (eu disse terror), com roteiro de David Leslie Johnson-McGoldrick, baseado numa história dele com o Momoa, consegue, numa crise de criatividade, nos entregar mais um filme esquecível. Com uma história, dessa vez emulando até em certos momentos Indiana Jones e Parque dos Dinossauros, com as sequências na superfície e um tom sobrenatural de um amaldiçoado povo que de tão perdido nem na história está registrado, o filme, ao contrário do primeiro, tem um lado mais sombrio, principalmente na descoberta do Arraia Negra e sua equipe de mercenários (em que alguns falam português), comandados pelo biólogo marinho Shin, obcecado em encontrar Atlântida. Mas depois de meia hora de muita zoeira visual, com aqueles seres marinhos aloprando e tentando se defender do “Arraiá Army”, o filme se perde de vez. Mesmo com toda a engenhosidade do CGI na criação dos efeitos, parece que filmes e criaturas marítimas são apenas criações para James Cameron e o Avatar. Efeitos cansativos, com cores berrantes em excesso ou algumas vezes um breu que provoca sono, fazem o filme se perder por completo. Inclusive nos momentos cômicos somos brindados com uma falta de graça total, poucas piadas e até o Momoa sempre simpático e brincalhão, não acerta o timing em quase nenhuma e isso que ele tenta.

E falando em atuações, Momoa que nunca foi um grande ator, mas tem carisma, beleza e simpatia, está em piloto automático total na trama. Não engrena nos momentos família, nas lutas, nas saídas de humor, um burocrático Aquaman. Quem está bem é o ótimo Patrick Wilson, que só por ser amigo de Wan e ter um salário gordo, pode ter se submetido a fazer esses dois filmes. Mas ele, como Orm, meio irmão do Aquaman, é responsável pelos melhores momentos do filme e fazem uma dupla digna quando atuam juntos. Amber Heard, apesar do que achavam que iria acontecer, não foi escanteada por total, tem seus momentos no filme como mãe do pequeno Aqua Jr., mas acaba perdendo um pouco do seu protagonismo. Yahya Abdul-Mateen II continua cada vez mais neurótico e necessitando de um bom terapeuta com seu Arraia Negra e a sua incansável luta para matar Aquaman, chegando a beirar o sofrimento, tamanha obsessão doentia para o intento. Temuera Morrison, como o pai de Aquaman, Dolph Lundgren, como o sogro Nereus e a mamãe Nicole Kidman, são cada vez mais coadjuvantes e um exemplo de talento desperdiçado em duas horas de filme.

Mas mesmo com todos esses poréns, ainda prefiro esse filme ao primeiro, aquele sim difícil de engolir (ou seria fácil de se afogar?) tamanha chatice da trama e efeitos carnavalescos e exagerados. Ao menos Aquaman 2 tem algumas boas cenas de ação, trabalha um pouco mais na superfície e com a dupla improvável de irmãos que eram inimigos, dá um clima de aventura pipoca por vezes divertido. E a questão ecológica, usada como mote na trama, com o aumento do calor na terra, derretimento de calotas polares e poluição marítima, dão as caras aqui como denúncia e como um problema real que nem Aquaman vai poder nos ajudar no futuro. Mas fora isso é mais filme que já nasceu para ser esquecido, com uma direção fraca e previsível do bom Wan, mas que não consegue engrenar nunca, com um roteiro preguiçoso e sem sentido, atuações medonhas e um emaranhado de efeitos confusos e sem esmero algum na produção, recheado de criaturas desprezíveis, heróis e vilões sem carisma e em batalhas mal filmadas. E o pior: que tenta se levar a sério. Um desfecho com chave de barro do universo compartilhado da DC, mergulhando de vez algo que nunca decolou, e sua grande maioria de filmes, que vão ficar na profundeza dos mares das nossas memórias, tamanho a sucessão de erros e películas medíocres nesses últimos 10 anos. O que resta é esperar o que vem a seguir com a repaginação do mundo de heróis da DC nas mãos de James Gunn e Peter Safran e torcer para a maré virar para Batman, Superman e sua turma terem bons filmes…

 

Mais do NoSet