Enfim, com dois anos de atraso, por motivos óbvios, terça, dia 26 de abril, em Porto Alegre, o Kiss começou a sua turnê de despedida(?), a esperada Kiss – End of the Road Tour – World Tour, em solos brasileiros. O tempo ajudou, clima agradável, a chuva deu trégua e por volta de vinte mil pessoas compareceram ao estádio da Arena para conferir a despedida da banda mais quente do mundo. E confesso que quem foi não deve ter ficado decepcionado. Claro que qualquer show do Kiss, desde que assumiram de vez a ideia de ser uma banda show, no sentido real da palavra, parece um eterno déjà-vu, tu sabes o que vai ver ali, as músicas que eles irão tocar, as performances que irão fazer, mas mesmo assim, o fã ou o até não fã, acaba hipnotizado pelo impecável talento que o Kiss tem em fazer entretenimento.
Voltando ao show, que teve como abertura a competente banda local Hit The Noise, que fez um digno aquece, com poucos minutos de atraso, a banda já entra quebrando tudo ao cair a cortina com o logo do grupo, com a clássica Detroit Rock City, já fazendo o povo presente se entregar totalmente aos quatro mascarados. Depois, sem respirar, emenda um Shout It Loud, mostrando a força do Destroyer, álbum de 1976, com cinco canções no set. Entre conversas de Paul Stanley com a galera, caprichando no seu Poooorto Aleeeegrrrre, a banda toca Deuce, sucesso dos primórdios da banda. War Machine do Creatures on the Night, que completa 40 anos esse ano, seguiu e abriu pra Heavens on Fire, musicão da fase mais farofa da banda, que funciona perfeita em estádios. I Love It Loud é outra perfeita pra grandes arenas, que Gene comanda com autoridade de décadas, fazendo a Arena tremer. Say Yeah, o hit mais “novinho” da banda, se fez presente também e emendado com a clássica Cold Gin e o solo do ótimo Tommy Thayer, que executa cada nota do Ace Frehley com uma perfeição única, coisa que, por motivos extracampo, o Ace nunca conseguia ao vivo. Lick It Up, próxima do set , quase derrubou a Arena abaixo. Outra canção que funciona muito bem ao vivo e faz todo mundo cantar junto.
Calling Dr. Love vem na sequência, musicão dos primórdios da banda, seguido por Tears Are Falling, baita música, mas que meio que serve como aquele momento que a galera vai ao banheiro ou busca mais uma cerveja. Psycho Circus, excelente canção que invoca a histórica tour de 1999, onde o Kiss veio com os óculos 3D e formação original mascarada ao Brasil, hoje já parece meio desprestigiada pelo público, mas funciona igualmente. O solo do Eric Singer pós-canção mostra como ele é, com certeza, o maior baterista que já passou pelo Kiss, com carisma e técnica exemplar, com a bateria no terceiro andar, fez o estádio literalmente vibrar (até rimou). O momento Gene Simmons começa com 100.000 Years, seguida da sua marca registrada, a sensacional God of Thunder e seu momento de caras e bocas, cuspindo sangue e manchando a armadura, aquilo que vemos há quase 50 anos, mas ainda amamos rever, Gene é o cara.
Com Love Gun vemos a tirolesa mais sensacional do rock and roll. Paul Stanley no alto de suas botas e de seus 70 anos atravessa a plateia numa corda para cantar a música no outro lado do palco. Outro momento, que mesmo que se repita sempre, ainda emociona, ainda mais vendo e ouvindo Paul conversar com sua simpatia ímpar com a galera. Espetacular. A dançante I Was Made for Loving You dá uma quebrada de gelo, mas é aquelas que até quem não conhece Kiss sabe qual é. Incrível como isso a banda tem como característica: Kiss transpassa a questão banda e gosto, muita gente quer ver o Kiss, quer ver o show que o Kiss faz, desde crianças, o pessoal dos bares, da produção, policiais, todos estavam com seus celulares apontados e filmando o apresentação fantástica que eles fazem, até porque pra ver alguém com roupa de quem vai trabalhar o dia inteiro e parado como uma árvore no palco, o cara nem sai de casa, e isso o Kiss sabe fazer muito bem, mostrar o que o povo quer ver, uma marca, um conceito, isso é Kiss.
Black Diamond encerra com chave de ouro o show normal e a banda se vai para os camarins. Mas logo aquele mega piano chega no palco e Eric Singer, fazendo sua interpretação pessoal de como tocar piano, toca a balada Beth pra uma Arena iluminada por celulares, naquele momento único dos estádios que hoje trocaram os isqueiros pelas telas iluminadas dos smartphones.
Em Dou You Love a banda volta com tudo e joga bolas de plástico com o nome Kiss, para êxtase da galera. E, é claro, para encerrar o show, temos aquela que pode ser considerada o hino mundial do rock and roll, claro que falo de Rock and Roll All Nite, canção de 1974, que até hoje acho que desde lá nunca faltou em algum show da banda. Com show de papeis picados, explosões, a intro de batera famosa e refrão antológico, terminou com gran finale mais um show, diria mais, um espetáculo do Kiss.
Enfim, como já falei, ver o Kiss uma ou 10 vezes parece ser a mesma coisa, mas não é mesmo. Os caras têm algo que só eles tem, conseguem comandar a massa de uma maneira única. Pirotecnia, palcos que sobem, luzes, tudo isso é explorado com a perfeição que só o Kiss sabe fazer. Paul Stanley, por mais que todos saibamos, não tem mais aquela voz (ou diria voz mesmo) e usa alguns recursos modernos pra suprir isso, ainda tem com 70 anos a mesma energia de 50 anos atrás, comandando a plateia, tocando muito, conversando com o povo e esbanjando simpatia. Gene Simmons é o mesmo turrão de sempre, com seus talentos únicos e cara de mau, sua voz impecável e linhas de baixo maravilhosas e por mais que Tommy Thayer e Eric Singer façam apenas parte do projeto business Kiss, eles tem luz própria e talento incrível, abrilhantando os clássicos com suas técnicas absurdas. Em um momento do show vi uma família toda nas arquibancadas com camisas da banda e maquiadas, pai, mãe e crianças entre 9 e 12 anos. Olhando aquilo o cara vê a força do Rock, a força de uma banda, da música atemporal – e podem falar o que quiserem do Kiss, pastiche, cover de si mesmo, show de playback, mas o tamanho que a marca ainda tem é grande, e se confirmar o que dizem, adeus Kiss, muito obrigado por fazer toda a noite e dia ser de rock and roll.