Gostaria de falar um pouco de cinema. Mas não de lado de lá. Quero falar do lado de cá. Do lado do espectador. Espectador? Palavrinha antiga, não só no termo, mas também na sua definição. Porque hoje não somos mais espectadores. Participamos, escolhemos, criamos conteúdo. O cinema, a TV, as mídias respondem aos nossos desejos. Mas fiquemos por ora apenas com o cinema. Sábado a noite. Dia oficial do filme. Pelo menos pra mim. Na sexta já me programo. Organizo toda a minha vida para assistir algo especial. Não aqueles filmes que pegamos pela metade durante a semana na TV a cabo. Mas aquele filme especial, escolhido a dedo. Uma ocasião de cinema. Sim, sábado é minha “ocasião de cinema”.
Na sexta já começo a pensar. Olho primeiro nos anúncios de cinema do jornal. Vejo trailers, horários. Se algo me agrada já me programo. Compro online. Ou chego uma hora antes. Depende de meu tempo e meu estado de espírito. Se nada me tocou, começo a pensar no plano B: filme em casa. Na categoria filme em casa eu tinha três opções: locadora, TV a cabo e Netflix. Porém, a locadora perto de casa fechou, e fiquei triste pois eu ia lá desde criancinha. Era um dos meus locais prediletos. Senti quase a mesma tristeza que no dia que demoliram um dos cinemas mais antigos de minha cidade. Ou no dia que demoliram metade da escola onde estudei a vida toda.
Aham, continuando, Tenho duas opções. E dentro da opção TV a cabo, tenho uma sub-opção, que substitui de maneira 4x mais cara a minha antiga locadora, que é “locar” filmes online. Qualidade de imagem e som é bem melhor, mas na locadora física eu pegava vários filmes pelo preço de um nesse novo sistema. Escolhida a opção, vem a parte deliciosa: os “comes” durante o filme.
Sou do tipo que não assiste filme sem beliscar. Pipoca é a opção 1. Depois vem salgadinhos de pacote, chocolate, docinhos de gelatina ou goma, chiclete e suco. Ou refrigerante. Sim, muitas gordices. Ocasião especial pede cardápio ousado.
Tudo preparado, no cinema ou em casa, é só chamar a galerinha e dar o “play“.
Adoro os trailers. Conheço minhas futuras escolhas de filmes. E já fico ansiosa dizendo: esse eu quero ver! Ah, esse deve ser uma porcaria. E também fico muito brava com filmes cheios de spoilers. Assistindo o trailer não precisa nem ver o filme. Você já sabe tudo o que vai acontecer. O bom é que se demorar uns meses pro filme passar a gente só lembra que gostou do trailer e assiste, pois já esqueceu de tudo…
Começa o filme e também a bagunça. Aquele “clic” característico das latinhas de refrigerante sendo abertas ou o barulhinho do gás saindo das garrafas. O som do saquinho de salgadinho e das pipocas sendo mastigadas. Mas ninguém reclama, pois todos estão juntos nessa.
Daí a pouco aquela criança que fica perguntando tudo: “Mãe, porque ele pegou aquele pauzinho? Quem é a Mary? Olha, ele tá abaixando, olha, ele pegou a pedra, olha, ele jogou a pedra na cara da senhora…” E de repente um “shiuuuuu“! Silêncio pedido e solicitação atendida. E quando vai aquela galerinha que tudo que acontece tira sarro em voz alta? Ou aquele casal que nem filme tá vendo, só quer se beijar bem na sua frente fazendo aquele barulhinho irritante de beijo que só aguenta escutar quem está participando? Ainda não acabou não! Se o filme é de comédia sempre tem aquele “ser” com a risada mais escrachada de toda a cidade, que resolve vir exatamente na sua sessão e que te faz rir mais do que o próprio filme. Nas primeiras vezes né? Depois aquilo vai te irritando e a vontade é de subir e colocar uma rolha na bendita ou bendito.
Mas ainda tem uma situação específica que é a do filme longo e interessante. Porque você quer ir ao banheiro, mas não quer perder nadinha do filme. Então, já sabendo disso, você nem bebe seu suco. Molha um pouquinho a boca quando dá aquela sede, porque é melhor passar sede do que sair do filme e perder algum lance. E quando você não sabia que o filme era longo e bebe 3 litros de água e acaba saindo e, quando volta, o personagem principal morreu ou aconteceu a coisa mais importante do filme e ninguém quer te explicar porque está atento à ação?
Em casa tem alguns problemas que não acontecem como no cinema. O banheiro está ao lado. Mas se aumentamos o som, no caso de apartamentos, logo o vizinho interfona ao porteiro que nos pede pra abaixar, ou, os mais impacientes já lascam a vassoura no teto. Ou no piso, no meu caso. Então ficamos sem a opção do som que tem no cinema. Mas quem mora numa casa grande e isolada pode fazer “a” sala de cinema. Então coloca sua tela de 60 polegadas com um som espetacular e pronto. Cinema sem seus inconvenientes.
Mas apesar de tudo isso, adoro o cinema. Em casa ou fora dela. E mesmo as vezes saindo brava de um filme, logo estou de volta. Pronta pra escutar de novo a risada da tia doida, ou pra passar sede e não ter que ir ao banheiro e perder a melhor parte do filme.