Show de Roberto Carlos emociona fãs em Porto Alegre

O que Porto Alegre poderia ter de mais marcante em um agradável domingo de Dia das Mães do que um show do Roberto Carlos? O primeiro show do maior cantor da história do Brasil pós-período pandêmico na capital dos gaúchos foi o presente perfeito para seu séquito público de fãs, com certeza a grande maioria mães. Obviamente esse reencontro tinha que ter como cenário o Araújo Vianna, que mais uma vez teve a honra de receber o Rei. E o NoSet estava lá presente na cobertura do tão esperado evento e conta foi essa inesquecível noite.

Uma coisa tenho que admitir: de diversas coberturas que fizemos de show, essa do Roberto Carlos, foi uma das que mais deu frio na barriga. É imensurável o valor histórico e musical do artista. Sucesso há mais de 60 anos, Roberto faz parte daquele time de lendas nacionais de carne e osso, como o recém falecido Pelé, Xuxa e Sílvio Santos. E ficar de frente da persona Roberto Carlos é algo que provoca certa ansiedade, e como o próprio afirma desde 1981, fortes emoções. Com a casa quase lotada, sem gradil de proteção na frente do palco e com forte aparato de segurança pra conter as fãs do Rei, por volta das 20 e 30 a banda RC9 sobe ao palco executando trechos instrumentais dos sucessos do cantor, orquestrados pelo fiel escudeiro de Roberto, o Maestro Eduardo Lages. Com uma qualidade sonora poucas vezes vista no auditório, a banda faz o aquece para a entrada do Rei, que trajando roupas em tom azul e com a característica mão no pedestal, abre o show com Emoções. A canção standard da carreira do cantor, gravada em 1981, provoca uma catarse no auditório. E confesso que não tem como, literalmente, não se emocionar com ele cantando esse clássico supremo da música nacional. Segue o show com uma composição de Antônio Marcos que foi imortalizada na voz do Rei, Como Vai Você, fazendo o público suspirar com sua delicada interpretação. Além do Horizonte, do álbum de 1975, dá aquela levantada na plateia depois dos dois clássicos iniciais. Uma coisa que anda acontecendo nos shows atuais do Roberto é que ele vem diminuindo, e com razão, o andamento das suas músicas, não tem como comparar o punch que eram os shows entre 1960 e 1990, com os do dia de hoje. Nesse show temos um Roberto mais maduro e experiente, pisando o pé no freio e cadenciando o espetáculo.

Seguindo na toada mais embalada, ataca de Ilegal, Imoral ou Engorda, fazendo uma homenagem ao seu grande amigo Erasmo Carlos, música que por muito tempo estava fora do set do artista e que às vezes, para nossa sorte, é revisitada. Após uma leve pausa e já sentado num banco, entoa outro hino marcante da MPB, acompanhado pelas teclas mágicas do piano de Lages. Juntos começam a antológica Detalhes, que desde 1971 é figura garantida no seu show e confesso que ainda emociona pra caramba. Um pouco mais solto, começa a conversar com o povo e faz uma emocionada introdução ao mega clássico de Isolda, a belíssima Outra Vez. Talvez a interpretação mais linda da noite, com Roberto cantando lindamente aquele caso de amor dúbio, forte e intenso, provocando lágrimas na plateia. No final da canção, Roberto ainda dá um recado aos amantes sobre a importância do amor e que todo mundo no mundo precisa, respira, sofre e vive por amor e só ele é a solução para tudo. Olha, outra das suas mais lindas músicas, de 1975, completa a tríade apaixonada do Rei, que embala em sequência a sua Nossa Senhora. Outra canção que de tão sutil, honesta e verdadeira não temo como não nos entregarmos à sublime declaração religiosa do cantor.

Roberto Carlos pode ter seus problemas, suas manias, seus trejeitos e polêmicas, tem seus desafetos e ainda tem gente que o desdenha, mas ter o privilégio de assistir o artista é algo que não tem explicação. Um carisma hipnótico, uma voz única e inconfundível e letras que estão enraizadas nas nossas mentes, transformam o show dele numa experiência única. É quase impossível desgrudar os olhos do cantor, algo de difícil explicação, sua aura conforta, sua música acalma e suas letras encantam, não é à toa que ele é o Rei.

Nesse momento ele dá uma saída e a banda magistral composta por 13 músicos e um maestro, o genial Eduardo Lages, embala o auditório com um arranjo rock and roll com tons jazzísticos pra anunciar que o Calhambeque está para chegar. Um dos primeiros sucessos do cantor numa volta às suas origens roqueiras dos 1950 e 1960.

Findada a homenagem ao seu carro mais famoso, Roberto conta o quanto ele sente saudades de sua mãe, ainda mais no dia delas, e emocionado,canta Lady Laura, talvez umas das mais lindas composições que alguém pode ter feito para uma mãe. Poesia arrepiante e verdadeira e um arranjo de naipes arrebatador. Não canso de dizer, emoção pura! Segue o baile do Rei, que nos apresenta sua versão de outro hino do cancioneiro nacional, dessa vez não de origem sua, mas imortalizada na voz dos sertanejos Chitãozinho e Xororó, falo de Evidências, em uma bela versão do cantor, muito parecida com a original, mas com o toque único do filho de Cachoeiro do Itapemirim.

Chega o momento de apresentar sua excepcional banda, que ele não cansa de elogiar e dizer que é uma das melhores do mundo devido a seus excelentes músicos. E ele faz isso em forma de canção, apresentando um a um seus integrantes, em uma maneira criativa e divertida. Segue o script com seu último sucesso, aquele que deu uma chacoalhada na carreira e o fez tocar de novo no Brasil Inteiro, Esse Cara Sou Eu, com um arranjo cheio de guitarras a la Bon Jovi e com a letra do cara que pra uns pode ser um gentleman irresistível e para outros um mala sem igual, enfim, mesmo com opiniões divididas, não podemos negar que é nítida a força da canção que renovou o repertório do Rei e hoje já é mais um dos seus clássicos.

Amigo, outro petardo da sua carreira, ganha mais contornos de emoção depois da perda do seu irmão camarada Erasmo Carlos, em uma intepretação arrepiante, com aquele arranjo inesquecível de naipes e muito sentimento na voz do cantor. Mais uma das canções que arrepiam a alma. Como é Grande o Meu Amor por Você, umas das mais lindas poesias da dupla Roberto e Erasmo, é cantada com aquele afeto único pelo até então comedido, mas animado auditório, que já começa a se movimentar devagarzinho, se levantando, porque na canção final, a indefectível Jesus Cristo, a horda de seguidores da majestade corre para frente do palco para ficar perto do ídolo e tentar abocanhar a rosa beijada e jogada pelas suas mãos. Um momento difícil de descrever, vemos gente de todas as idades, correndo como crianças atrás da flor, pessoas que são fãs de décadas e tem muito amor pelo artista e que jamais abandonam essa idolatria. Um final que já vimos milhões, em especiais de TV, mas que presencialmente é uma experiência indescritível. Um momento fã e ídolo que poucos artistas têm igual.

É difícil descrever o quanto é incrível assistir a um show do Roberto Carlos. Como falei antes, ele está sempre com o mesmo tipo de figurino, toca canções de sempre, não tem pirotecnia ou grandes efeitos de palco, faz o feijão e arroz básico, quase um filme revisto à exaustão, mas assistir in loco tudo isso é algo mágico e que marca para o resto da vida de quem assiste. Não é a toa que Roberto, há mais de seis décadas, faz parte do dia a dia do brasileiro e com sua competência, profissionalismo único e sua sutileza, amor e poesia faz a gente, parafraseando Isolda, querer ver, rever e vivenciar seu show, tudo sempre outra vez.

 

 

Crédito das fotos: Vívian Carravetta

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