A primeira coisa que você precisa saber: essa animação pode ser vista sem a obrigatoriedade de ver a primeira aventura dos pequeninos gnomos de jardim. A segunda informação é… prepare-se para se divertir com uma boa história de mistério, amizade e redenção. Essas são as bases da aventura animada Gnomeu e Julieta: o Mistério do Jardim, da Paramount Pictures.
A base da história é focada na mudança de lar dos pequeninos. Seus donos (lembrem-se que são estatuetas de jardim) são o casal Montequio e Capuleto – qualquer semelhança com uma obra de Shakespeare é mera coincidência – . Essa mudança não parece ter agradado muito aos gnomos, já que eles terão a difícil tarefa de transformar o “sem sal” jardim em um verdadeiro lar. Mas essa não é uma tarefa simples e isso só ocorrerá com a liderança correta. E eis que os pais de Gnomeu e Julieta resolvem passar o bastão para seus filhos, pois é hora de aprender a trabalhar em equipe, serem os verdadeiros líderes que estão destinados a se tornar.
Isso tudo seria fácil se não fosse por um detalhe: alguns gnomos estão sendo roubados de seus lares em uma onda de crimes jamais vista. As suspeitas recaem sobre o bom e velho Moriarty (com a voz de Jamie Demetriou na versão original), o vilão que tem como seu algoz o genial Sherlock Gnomes (Johnny Depp) – sempre acompanhado do dr. Watson (Chiwetel Ejiofor). O único porém está no fato de que Moriarty foi destruído, restando à dupla o mistério ainda maior que envolve os sumiços.
Tudo ganha ainda mais mistério quando os pequeninos amigos de Gnomeu e Julieta também são sequestrados.
Diante desse quadro sombrio, Gnomes, Gnomeu, Watson e Julieta são obrigados a unir forças para descobrir o que há por trás dessa onda de roubo de anões (ops, Gnomos) de jardim. Essa é a premissa para muitas aventuras, reviravoltas e ótimas cenas de ação que remetem a outras obras do cinema.
A dublagem original.
Estive no escritório da Paramount no Rio de Janeiro para ver a versão legendada da animação. Como estou acostumado a ver somente as versões dubladas (em função dos meus filhos), fiquei preocupado com a impressão que teria. Felizmente o resultado foi melhor do que o esperado. As interpretações de atores como Johnny Depp, Emily Blunt (Julieta), James McAvoy (Gnomeu), Mary J. Blige (Irene), Michael Caine (Lord Redbrick), Maggie Smith (Lady Bluebury) e até o monstro do rock Ozzy Osbourner (Fawn) estão simplesmente impecáveis. Óbvio que a versão nacional também terá a qualidade de sempre e agradará aos pequeninos (não os gnomos, certo?) que ainda não aprenderam a ler.
Verdade seja dita, a versão dublada em português dá mais liberdade para que o espectador possa desfrutar do visual da animação que está muito melhor que a do primeiro longa-metragem de 2011.
Enfim, façam sua escolha e vejam a versão que mais os agradar. Tenho certeza que ambas estão ótimas.
Mistério.
Em uma história onde há um gnomo de jardim que é uma versão de Sherlock Holmes, jamais poderá faltar o bom e velho suspense. Entretanto, o que eu não esperava era a aplicação correta no roteiro de cenas que levassem o espectador a acreditar em algo que não acontece. Em resumo, nem tudo que se vê é real, assim como ocorre nos bons livros de Agatha Christie.
Com base nessas pequenas inserções de mistério, o filme ganhou em qualidade e deu novos ares às aventuras da dupla de apaixonados Gnomeu e Julieta e também aos amigos Gnomes e Watson. Sair da ideia original vista no primeiro longa foi uma decisão acertada.
Luta de egos.
Sherlock é um astuto investigador, tal qual aquele visto nos livros de Sir Arthur Conan Doyle. Suas deduções e astúcia se revelam sempre acertadas e estão coerentes, distanciadas daquelas deduções mirabolantes que algumas produções atribuem não só a ele, como também a outro detetive famoso: Hercule Poirot.
Há, porém, um grande problema envolvendo essa inteligência lógica. Gnomes se torna um indivíduo pedante, arrogante e chato. Seu intelecto o distancia dos amigos e isso é péssimo. Vê-lo humilhando Watson é ruim, pois percebemos que isso lhe trará encrencas futuras.
Quanto a Moriarty, o arqui-inimigo, sua capacidade de elaborar planos astutos também surpreende. Esse embate de mentes é o ponto alto do primeiro ato do filme.
E onde estão Gnomeu e Julieta?
Os dois personagens estão em uma disputa – literalmente – para saber qual deles é o culpado pelo sumiço dos gnomos. O amor do primeiro filme dá lugar ao dissabor de uma intriga provocada por egos. Esses pequenos entraves só serão superados quando unirem forças para sanar um mal maior.
Seja como for, os personagens de maior destaque nessa animação são Gnomes e Watson, apesar da boa inclusão do casal inspirado no livro Romeu e Julieta. Na verdade, o quarteto formado por Gnomes, Watson, Julieta e Gnomeu respondem por quase 80% do filme.
Nessa animação, podemos ver que nem tudo são flores para um casal, mas é indiscutível que a união e objetivos comuns podem trazer de volta a harmonia. Também contemplamos um assunto bastante interessante: a valorização das qualidades alheias.
Amizade e seus limites.
Gnomes, como já dito, é um gênio por seu raciocínio rápido. Watson também é um indivíduo muito esperto. O que dificulta a perpetuação dessa amizade é o ego de Sherlock. Seu desprezo pela opinião do dr. Watson chega ao ponto de incomodar o espectador. Assim, caso você seja um cinéfilo com maior conhecimento de causa ou um leitor ávido (principalmente por gêneros policiais e suspense), já perceberá que esse trato será o responsável por problemas mais à frente.
Ser amigo é algo que gera uma liberdade entre as partes, porém isso jamais deve dar margem ao exagero ou descarte de opiniões. Em resumo, seja qual for seu intelecto, jamais menospreze a opinião de um verdadeiro amigo. Isso pode ofender muito!
Qualidades técnicas x Emoção embutida.
Desde a textura dos gnomos de jardim até os jardins e materiais de toda a animação, tudo está muito bem elaborado. Há cenas em que percebemos as pequenas imperfeições dos gnomos.
Ótima composição de iluminação, cores perfeitas e uma trilha sonora divertida (autoria de Elton John). Não vi nada que desabonasse tecnicamente essa produção. A introdução de bons coadjuvantes também acrescenta à trama divertidos e bons momentos.
Entretanto, como bem observado pelo crítico PH Santos (Cinema com Rapadura), falta a animações deste porte o vínculo emocional que existe em produções da Pixar, apenas para citar. Isso não impede que no futuro tal fato venha a ocorrer. A questão é que algumas animações ganham um lugar em nossa mente por longos anos, enquanto outras perdem relevância com o passar do tempo.
A diversão é garantida na animação. O emocional, contudo, fica devendo. Há potencial para uma trama mais complexa, mas creio que optaram pelo entretenimento em si, o que não prejudica o filme, cujo papel maior, que é a diversão, fica garantido.