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MÚSICA

Paulinho da Viola – Quando o Samba Chama – Araújo Vianna

Paulinho da Viola – Quando o Samba Chama – Araújo Vianna
  • Publicado em: março 18, 2025

Na música O Sambista Perfeito, de Arlindo Cruz, o compositor dizia que uma das características para se chegar a perfeição no samba era ser elegante do jeito Paulinho. Logicamente que ele falava da elegância em pessoa, Paulinho da Viola, que há décadas esbanja sua poesia em sambas cativantes inesquecíveis. Com 82 anos, Paulinho ainda segue com sua voz macia, passando sua mensagem com seu cavaquinho e violão em show pelo Brasil afora. O seu último show Quando o Samba Chama teve como palco, sábado passado, o Araújo Vianna em Porto Alegre, e o NoSet, abrindo a temporada de coberturas de shows do ano, que sempre começa depois do carnaval, estava lá para contar em palavras essa inesquecível experiência.

Com um bom público, longe de casa cheia, o que é ótimo para um show desse quilate, em que a contemplação ficaria complicada com uma multidão ruidosa, Paulo César Batista de Faria subiu ao palco mansamente por volta das 21h30min. Com aquele sorriso gracioso, a entidade do samba abriu o espetáculo sem muitas delongas com Nas Ondas da Noite, composição sua do primeiro de dois álbuns que lançou em 1971. Segue em clima de homenagens, relembrando mestre Candeia com Filosofia do Samba e resgata uma linda canção de seu disco de 1988, Quando Bate uma Saudade. Só aí Paulinho para para receber os aplausos da hipnótica plateia, encantada com a sutileza e riqueza da sua voz e canções. 

Segue a aula de samba com o outrora polêmico, o clássico Argumento, música que completa 50 anos de seu lançamento. Paulinho então senta e pega seu violão para cantar Ruas que Eu Sonhei e segue com mais uma de 1971, Para Ver as Meninas. Paulinho, que é bom de conversa, estava com muita vontade de cantar e logo puxa aqueles acordes que chamam um dos seus maiores clássicos: Dança da Solidão. Às vezes me pergunto se Paulinho é melhor violonista ou cavaquinista. Ele não chega a ser um virtuoso, mas domina os dois instrumentos muito bem, sua palhetada de cavaco é tão característica que chega a ser referência para aprender o instrumento, mas seu dedilhado no violão é sublime, enfim, sorte que ele nos premia com uma aula a cada show. 

Paulinho segue a apresentação com Quando o Samba Chama, nome do espetáculo e música do disco que deu uma virada na carreira dos anos 1990, o sensacional Bebadosamba, que é contemplado com a seguinte canção, Novos Rumos. Logo depois o cantor embarca com duas composições com a temática do mar, Pra Jogar no Oceano de 1981 e o clássico Timoneiro, em que a plateia, até então contida, acompanha com vibrantes palmas.

Paulinho então começa a soltar a prosa e explica sua admiração pelas mulheres no samba, fala de Clementina de Jesus e principalmente Clara Nunes, que ganhou dele Na Linha do Mar, um dos seus maiores sucessos. Para cantar essa homenagem, chama a sua talentosa filha, Beatriz Rabello, com uma voz lindíssima, cumprindo com louvor a responsabilidade de lembrar a saudosa mineira. Seguindo a toada, ele então homenageia Dona Ivone Lara, contando que ela e sua mãe trabalhavam juntas como enfermeiras e engata dois sambas da bomba do Império Serrano, Mas Quem Disse que Eu Te Esqueço e a sensacional Enredo do Meu Samba (dela com Jorge Aragão) e finda a homenagem com uma parceria dos dois, o samba Não é Assim. Todas tendo Beatriz nos vocais.

Seguindo a noite de celebrar grandes compositores, começa um Cartola, que sempre dizia que Paulinho era seu sucessor, com Tempos Idos. Então vai à Portela e canta Zé Ketti, com Portela Feliz, e segue homenageando a Velha Guarda da azul e branco de Madureira com o hino que Monarco compôs, Portela Passado de Glória, que ao menos para mim tem um sabor especial demais. 

Com violão na mão segue com Pecado Capital, um dos seus maiores sucessos comerciais, fazendo a plateia cantar junto e puxa outra joia de seu repertório, Onde a Dor Não Tem Razão do relembrado disco de 1981.

No telão, homenageia Elifas Andreato, ilustrador de vários discos dele e da música brasileira e segue de pé, tocando seu cavaquinho, outro clássico eterno, Coração Leviano, que antecede o hino informal da Portela, a contagiante Foi um Rio que Passou em Minha Vida, canção que fez o Araújo Vianna levantar, sambar, cantar e aplaudir. Aplausos também não faltaram para apresentação da fantástica banda do sambista, com a já citada filha Beatriz Rabello, seu filho João Rabello no violão, o mestre Esguleba na percussão, Celsinho Silva no pandeiro, Ricardo Costa na bateria, Dininho no contrabaixo, Mário Seve no sopro e o maestro Adriano Souza no piano.

Paulinho volta com violão em punho e fora do script toca Nervos de Aço, em homenagem ao mestre Lupicínio, na terra do poeta, em momento de êxtase da plateia. Logo depois embala com um dos seus grandes clássicos, talvez uma das primeiras a citar a palavra pagode, quando ninguém fora do meio sabia o que era isso, a animada Pagode do Vavá e finda seu espetáculo com chapéu panamá na cabeça tocando Miudinho, com direito a Esguleba mostrando toda sua malemolência nos passos com uma plateia acompanhando de pé e na palma da mão.

Já perdi as contas de quantas vezes assisti o Paulinho, mas a cada show ele tem um poder de renovação, resgatando tanto canções um tanto esquecidas do seu cancioneiro pessoal, quanto homenagens à nata do samba e seus compositores, nunca perdendo a essência e sua indefectível elegância. Uma aula de samba e música popular brasileira, em que os 90 minutos passam voando e acabamos nos apaixonando cada vez mais pelo nosso príncipe Paulinho da Viola.

Written By
Lauro Roth