Pato Fu celebra 30 anos de carreira em Porto Alegre

Porto Alegre entre junho e julho de 2023 anda sofrendo com fenômenos estranhos. Dias quentes lembrando o verão intercalando com outros, gélidos típicos da época, mas o que perturba o porto-alegrense e os gaúchos são os tais ciclones. Dia 16 de junho um devastou cidades e causou mortes, e nesse último fim de semana, a previsão de outro fez os gaúchos se precaver e uma chuva constante molhou a capital. Mas nada que na noite de sexta, impedisse a oportunidade de assistirmos uma das mais criativas e geniais bandas dos anos 1990, que completa 30 anos. Falo do show dos mineiros do Pato Fu, que fez uma bela retrospectiva da sua carreira num incrível show, e é claro, o NoSet, como não tem ciclone que nos pare, acompanhou esse show no Araújo Vianna e conta tudo aqui.

Por motivos óbvios e já explicados na abertura do texto, o Auditório Araújo Vianna, recebeu um bom público, mas longe de lotar, e por volta das 21h20min Fernanda Takai, John Ulhoa, Ricardo Koctus, o trio mentor da banda e Xande Tamietti e Richard Neves subiram ao palco e começaram os trabalhos com Spoc, do clássico disco Gol de Quem. O Processo de Criação vai de 10 até 100 mil (simplificando, a música da Unimed), petardo sonoro do primeiro disco da banda, o Rotomusic de Liquidificapum, de 1993. A fase pop é lembrada logo depois com o super sucesso Sobre o Tempo, de 1995. Ali o tímido o público se levanta e ajuda Fernanda a cantar. A banda promete, depois de uma breve apresentação, fazer um levantamento da carreira, um revival sonoro com músicas de todos os discos. E o que a banda tem de discreta no palco, tem de extravagância sonora, e John puxa a próxima música, Água, do disco Tem Mas Acabou (cada nome genial de disco a banda bolava!). Do Televisão pra Cachorro vem a bela Antes que Seja Tarde e Licitação, mas é com Depois, hit do disco Isopor, de 1999, que a galera levanta de novo e canta junto.

O Pato Fu tem como característica a mescla do experimentalismo sonoro, letras às vezes nonsense, muitos efeitos, arranjos caprichados, mas também soube criar canções pop que estão na boca até para quem não é tão fã das viagens musicais da banda. E não posso deixar de elogiar a perfeição do som. Uma equalização impecável e agradável, fazendo bem aos ouvidos e ajudando a apreciar o som, parabéns aos envolvidos da competente equipe de som.

Menti Para Você, Mas Foi Sem Querer, do disco Ruído Rosa, segue o baile, mas é com Ando Meio Desligado, cover dos Mutantes, que mais uma vez conquista a galera e a voz suave e afinadíssima da Fernanda é a homenagem perfeita para a Rita Lee, que virou saudades recentemente e obviamente foi lembrada pela banda. Segue o set a nova canção Diga Sim, do último disco, 30, de 2023, mostrando que a banda ainda está em forma e produzindo belas canções. A genial Vida Imbecil, do disco Gol de Quem, antecede o mega sucesso Eu, essa mais uma vez levantando a galera. O Pato Fu é uma banda extremamente competente, com uma sonoridade única e experimentalismo à flor da pele e seu show, além de ser para fãs, funciona até para quem não é tão chegado. É muito gratificante contemplar a banda, suas invenções musicais e essa mistura que faz sucesso, mas não foge das suas raízes, que era uma anarquia musical, um verdadeiro liquidificapum, usando o linguajar da banda. O trabalho de John tocando violão, guitarra e abusando de efeitos e pedais, misturando sons e técnica é fantástico; o baixista extravagante e divertido Ricardo Koctus,  cada vez mais dominando o instrumento e com sua grande performance de palco; o batera Xande, velho habitué da banda, mantém a pegada de sempre e sabe domar a sede nas baladas e o tecladista, gaiteiro e fazedor de barulhos, Richard Neves, entrou muito bem no grupo.

Fique Onde Eu Possa Te Ver é mais uma canção do novo disco da banda executada. Outro destaque é para o telão de fundo, onde imagens de clipes históricos e tomadas dos 30 anos da banda ilustram o tempo de carreira. A anárquica Gol de Quem, dos primórdios da banda antecede a belíssima Canção Pra Você Viver Mais, do Televisão pra Cachorro, é mais uma música onde Fernanda mostra toda sua emoção com sua suave e calmante voz, com uma das letras mais bonitas do cancioneiro da banda. Depois emendam No Silêncio, do novo trabalho, Simplicidade, essa de 2005, do álbum Toda Cura Para o Mal, segundo eles a mais mineira de todas as do repertório da banda, Anormal (que segundo John é anormal para pessoas normais), do mesmo disco e Cego Para as Cores do disco Não Pare Pra Pensar, de 2014.

Perdendo os Dentes, outro grande sucesso da fase mais pop da banda, mais uma vez anima a galera, que se contagia também com a ótima Made in Japan, talvez a única música do cancioneiro brasileiro pop cantada em japonês mas que virou hit, com a indefectível voz de Fernanda Takai, eles emendam num medley Capetão 66.6 Fm, outra loucura sonora da banda encerrando com estilo o show. Mas é claro que tinha bis e eles voltam com Silenciador, mais uma do novo álbum e logo depois atacam de Eu Sei, a excelente versão da banda pro clássico do Legião Urbana, essa cantada por uma plateia já contagiada e que se preparou para geleia geral final da execução do épico da banda de 1993: assistir o Pato Fu tocar a viagem sonora de Rotomusic de Liquidificapum, do primeiro álbum e seus sete minutos é uma experiência sensacional, e no final a citação da canção Meet The Flinstones. Uma síntese do que é o Pato Fu, uma miscelânea musical que une o experimental, a tradição, o rock, funk e música pop.

Fico feliz em presenciar uma banda clássica que marcou os anos 1990, soube usar a imagem e a MTV fazendo clipes e, o principal, com inventividade e criatividade única em prol da boa música pop. Assistimos uma retrospectiva musical onde a banda praticamente tocou músicas de todos os discos e ainda mostrando que estão na ativa tocando músicas novas. Um show pra contemplar, cantar junto e que faz muito bem aos ouvidos e à alma, provando que o tempo só fez bem para a banda e o tempo ruim na  rua era apenas um detalhe para esse super show que Porto Alegre e o Araújo Vianna tiveram o prazer de receber.

 

 

 

Crédito das fotos: Vívian Carravetta

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