O conto de fadas existencial de … “Gracinha”

A música sempre se beneficiou das artes cênicas, seja cinema, TV ou teatro, tanto que os vídeos clipes fizeram tanto sucesso no passado e têm voltado a cair no gosto popular.

Mas são poucos os artistas que se arriscam no chamado álbum visual, que é, basicamente, um filme apresentando as músicas do novo álbum, mas de forma artística, com interpretações. É um musical com história atrelada às músicas.

Se tem uma artista inovadora e corajosa, aqui no Brasil, para se arriscar assim é Manu Gavassi.

No último dia 12 de novembro ela alcançou outro patamar de destaque, lançou seu álbum visual, a sua “Gracinha”, na Disney+. A produção foi idealizada, produzida e dirigida pela própria Manu, com o apoio de sua gravadora e uma equipe poderosa, contando com nomes como Lucas Silveira e Lucas Lima. 

No elenco estão: Paulo Miklos, Ícaro Silva, João Côrtes, Titi Ewbank Gagliasso, Amaro João de Freitas Neto, Samuel De Saboia, João Mandarino.

Ah, tem uma equipe de bailarinos formada por Alencar Reinhold, Thodora Dias, Lucas Silvestre e Thais Natsuki Kuwae, treinados pela bailarina e coreógrafa Maitê Molnar.

Mas quem é Gracinha?

Ela é uma bailarina que acredita ter perdido a alma da arte e tenta se reencontrar.

Gracinha faz parte de uma trupe, que, por muito tempo, fora liderada pelo seu pai e pelo seu tio, eles eram uma dupla de palhaços. Tudo iria bem, mas um incêndio vitimou o pai dela, mudando o rumo da trupe e da eterna princesinha dos espetáculos.

O tio de Gracinha assume a chefia da trupe, tornando-se um tirano, explorando o pouco de arte que ainda sobrevivia na sobrinha. Mas o resto da trupe ama e admira Gracinha, querem bem e a apoiam, eles sofreram junto com ela todo o processo de luto.

A bailarina linda e fofa, a princesinha, a Gracinha percebe que tudo poderia ser diferente, a alma da arte ainda está nela e ela pode expressar tudo isso em outro lugar. Atitude seguida por todos os amigos toda a família da trupe.

Assistir esse álbum visual é assistir uma explosão de artes (no plural mesmo), é um prazer para os olhos, para os ouvidos, para a alma.

Algumas músicas já haviam sido liberadas, alguns trechos também (apresentados como clipes das respectivas músicas), então já sabia da qualidade da trilha sonora. Também esperava a qualidade dos outros elementos, mas foi muito além dessa expectativa.

O figurino e o cenário nos transporta a esse conto de fadas. Nada é óbvio, é uma mistura de teatro e circo, com direito a cartomante e pintores reproduzindo paisagem. O figurino e a maquiagem me lembraram os filmes de moda, com peças conceituais, mas não tem nenhuma marca de luxo patrocinando, foi tudo desenhado e confeccionado para a produção.

A atuação poderia facilmente ter se tornar caricata, exagerada, mas isso não acontece, tudo faz sentido dentro desse contexto. Tanto dos atores quanto dos bailarinos, fazem muito mais do que “só dançar”.

Aliás, o tal “só dançar” também merece ser destacado. Manu fez aulas de dança contemporânea por alguns meses para poder dançar na produção, com direito à solo e tudo mais.

Depois de assistir “Gracinha” fiquei resgatando algumas referências, quem já havia feito algo semelhante a isso. Posso estar errada, mas acredito que nenhum artista brasileiro realizou o feito, fora daqui lembro que Beyoncé já fez. Décadas atrás os Beatles fizeram alguns filmes incorporando suas músicas, com destaque a “Help”.

Taylor Swift, que é uma referência declarada de Gavassi, lançou um curta com a música “All Too Well”, mas o formato lembra muito mais  aquele clipe de Manu com Glória Groove, “Deve Ser Horrível Dormir Sem Mim”. Com direito a shade pra ex e tudo mais!

Voltando às músicas, porque são as peças principais, são de uma genialidade. Manu consegue fazer críticas, falar a verdade nua e crua, expor o que todo mundo pensa, com um jeito tão delicado, uma voz tão doce, que quase parecem elogios.

Queria dizer que teve alguma música que se destacou mais e eu até tentei explicar, mas é quase impossível, especialmente dentro do contexto do álbum visual.

“GRACINHA”, a música que dá nome ao álbum, é o solo da protagonista, um dos momentos que a deixa mais exposta, quando ela tenta gritar que é muito mais do que aquilo. “Bossa Nova” expõe o que todos pensam, que os artistas só são valorizados depois de mortos.

“Eu nunca fui tão sozinha assim” é mostrado como o ponto que Gracinha mais se perde, mas sem contexto pode ser interpretada como um depoimento sobre a pandemia. 

“Catarina” é uma carta de amor à irmã mais nova de Manu, no álbum visual é uma cena linda de uma criança descobrindo as artes e abrindo os olhos de Gracinha. A criança é vivida por Titi Ewbank Gagliasso, talentosa e carismática como a própria Manu.

Em “Reggaton Triste” podemos ver Manu como Maria, personagem totalmente diferente, mostrando a versatilidade da artista, tanto da atuação quanto na música (tem uma vibe diferente das demais).

Enfim, fui assistir por ser fã de Manu Gavassi, terminei quase chorando, me sentindo na pele de Gracinha, querendo aprender a coreografia das cadeiras e tendo a certeza que vale a pena investir na arte e nos artistas brasileiros.

E o tal do “conto de fadas existencial” é a descrição de Manu, lá nos créditos finais.

Até Mais!

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