MÚSICA

Ney Matogrosso – Bloco na Rua no Araújo Vianna

Ney Matogrosso – Bloco na Rua no Araújo Vianna
  • Publishedmaio 2, 2025

Quis o destino (ou as coincidências de datas) que a volta de Ney Matogrosso para Porto Alegre fosse na mesma semana da estreia do filme Homem com H, que mapeia de forma emocionante sua vida. Do filme, Jesuíta Barbosa, interpreta como um gigante Ney Matogrosso. Não se pode falar que foi uma interpretação mediúnica, porque ainda bem o cantor está ainda firme por aí, no alto dos seus 83 anos. E a capital dos gaúchos teve esse privilégio de poder assistir mais um show da sua tour Bloco na Rua, na quarta passada, no Araújo Vianna. Ah, e no NoSet já tem crítica do filme também, feita por esse que vos escreve, no link aqui.

   

Mais uma vez casa cheia. Ney Matogrosso, que tinha vindo em 2023, volta ao Auditório Araújo Vianna, onde mais de 4 mil fãs aguardavam mais uma vez o espetáculo único que só ele sabe nos proporcionar. Mesmo com poucas novidades, passados dois anos, é sempre um prazer rever o nosso libertário cantor. Por volta das 21h15min, acompanhado de sua banda fantástica com Sacha Amback, que além de ser o dono das teclas, assina a direção musical, Dunga no Baixo, Marcos Suzano e Felipe Roseno na percussão, Aquiles Moraes e Everson Moraes no sopro e Mauricio Negão na guitarra. Ele surge com aquele figurino característico da turnê, feito com carinho e sob medida por Lino Villaventura. Só que dessa vez, não vem com o rosto coberto, já chega com aqueles olhos hipnóticos e sorriso envolvente, fazendo o povo cantar Eu Quero É Botar Meu Bloco na Rua, do Sérgio Sampaio. Provando que idade é apenas um detalhe, segue com uma versão mais roqueira de Jardins da Babilônia, de Rita Lee, que antecede a versão incrível que ele faz de O Beco, dos Paralamas.

Ney não é de muitas palavras, na terceira música cumprimenta a casa e diz que até que enfim estava de volta. O set seguiu quase o mesmo script do último show aqui realizado, com Já Sei e logo depois uma interpretação maravilhosa de Pavão Mysteriozo, do Ednardo.

 

O show segue com Tua Cantiga, do Chico, sua roupagem pessoal, a canção A Maçã, do Raul, e chega o momento que ele puxa um banco transparente e não senta, se escora e manda ver com um dos seus primeiros sucessos solo, Postal de Amor, de 1975, e provoca emoções com a belíssima Yolanda. Depois de fazer o público suspirar, pede dois minutos e se manda pro camarim. Com menos que isso, volta renovado, dispensa banco e vai de Tremendão com Mesmo Que Seja Eu, aquela do homem pra chamar de seu. E Ney faz questão de enfatizar isso no refrão, com aquele sorriso indefectível. Sua voz segue impecável, se não tem mais aqueles agudos fora de série de outros anos, sabe os atalhos e jamais decepciona, transformando sua voz em instrumento e seu corpo em um show à parte. 

 

 

Ainda temos Já Que Tem Que, de Itamar Assumpção, Estranha Toada de Martins e Almério, de um dos últimos álbuns do Ney, que faz o povo levantar com O Último Dia, canção apocalíptica e divertida de Paulinho Moska. Relembra a fase dos Secos e Molhados, quando desafiou a censura, tanto a oficial quanto a de moralismos do brasileiro, com Amor e o super sucesso Sangue Latino. Findada a canção, Ney avisa que se seguisse o roteiro, teria uma saída da banda e ele voltaria depois para o bis. Mas ele quer pular etapas e combina de seguir o show sem interrupções. Mais uma vez, com uma luz sobre seu corpo e uma cadeira, ele canta apenas com Sasha nos teclados uma arrepiante interpretação de Como Dois e Dois, de Caetano, tendo um público de pé aplaudindo, momentos que ficam para sempre na mente de quem presenciou. Com Poema, de Cazuza e Frejat, é a vez do público, retribuindo, iluminando a plateia com luzes de celular, que no fim, causa até um elogio do contido nas palavras Ney, que fala: “Nossa, que lindo!”. 

Outro momento marcante do espetáculo é a versão de Balada do Louco, onde Ney Matogrosso mostra todo seu talento vocal e nos avaliza que ser diferente e ser feliz não tem nada de anormal ou loucura. O show encerra com o povo todo de pé para dançar e soltar a voz com ele em Pro Dia Nascer Feliz, em que mostra que ainda tem muito fôlego pra correr o palco, cantar e encantar com a canção do Barão Vermelho. Mas quando tudo parece que tinha terminado, Ney surge sem o capuz, com uma toalha na cintura, sem maquiagem, resolve voltar junto com a banda e tocar o sucesso Homem com H. O Araújo vai à loucura e se entrega aos encantos do cantor, que ainda dança, rebola, dá pulos e agacha numa vitalidade de deixar qualquer um boquiaberto. Com o hilariante forró de 1981, que dá nome ao filme de sua vida, encerrando no maior alto astral mais um maravilhoso espetáculo.

É difícil não se encantar com Ney Matogrosso… Com sua ode à liberdade faz um convite para todos deixarem a caretice de lado por uma hora e meia e se soltar, cantar, extravasar e se emocionar com o show. Como falo, poucos artista no Brasil conseguem ser completos, cantar, dançar, interpretar, entreter e fazer do show um visceral e caloroso espetáculo. E Ney, o Homem com H, antes de tudo é um artista com A maiúsculo, uma figura única na música brasileira e que, como vinho, parece que a cada ano que passa só melhora e nos embriaga com sua arte.

Written By
Lauro Roth