Não costumo chorar por quem escolheu ir embora [Conto]
Eu já entendi o que você quer. Na verdade, entendi o que você não quer, porque as entrelinhas falam bem mais alto do que você imagina. Agora, depois de acordar, enquanto observo os copos da noite passada na mesa e seu casaco pendurado na cadeira, me pergunto o motivo. Eu sei, nem sempre as pessoas têm um motivo para fazer alguma escolha, mas dessa vez, de uma forma quase ingênua, pela primeira vez na vida achei que tivesse feito a certa. Vou separar suas coisas para você levar, porque você está por toda a parte aqui, mas não agora. Eu também não vou chorar. Não costumo chorar por quem escolheu ir embora.
Algumas pessoas perdem o interesse da mesma forma súbita em que ele surgiu, eu ainda não consigo entender em qual parte do processo perco as rédeas, mas não é a primeira vez que acontece. Não sei o que faz as outras pessoas perderem o interesse, mas sei muito bem o que me faz desanimar: inconstância. Eu detesto essa palavra da mesma forma que detesto picles no hambúrguer, e olha que odeio mesmo. Gosto do seguro, do confortável e de fazer as maiores loucuras com quem resolver estar ali, do meu lado. Eu não entendo a necessidade absurda das pessoas de pular de pessoa em pessoa, como se experimentar o diferente o tempo todo não fosse cansativo. Será que só eu me sinto assim? Recolho os copos, coloco na pia e respiro fundo quando meus olhos começam a arder, de repente. Não vou chorar. Não costumo chorar por quem escolheu ir embora.
Eu passei a noite em claro tentando entender o motivo, tentando encontrar um fundamento ou qualquer coisa que pudesse me consolar, mas acho que a resposta para isso é a única que não quero ouvir: Você se cansou. E eu não sei o que é que acontece que eu sempre erro e acho que estou acertando. Essa foi mais uma. Gostaria que fosse a última, mas não sei se isso irá acontecer. Afinal, não existe uma fórmula mágica para a reciprocidade! Eu até queria ser menos apegada, menos emotiva, sem essa necessidade de afeto, mas sou uma taurina com ascendente em peixes, não que eu acredite em signos, mas pelo menos é uma explicação para minha enorme tendência a sofrer. Rio de mim mesma ao pensar nisso. Eu sou boa em sofrer, sei que sou. Mas sou melhor ainda em recomeçar. Eu recomeço como ninguém, e sei disso. Sei que depois que colocar suas coisas em uma caixa, depois que limpar todo o ambiente de qualquer vestígio teu, o ar vai ficar mais leve e minha vida vai procurando outros rumos, aos poucos. Não é uma tarefa fácil, mas como não é a primeira vez que acontece, eu sei que sou boa nisso. Encaro a janela e vejo que o dia está lindo, ele nem fez questão de ficar nublado para ajudar meu próprio luto. Então, não vou chorar. Não costumo e nem vou chorar por quem escolheu ir embora. Só merece qualquer coisa de mim quem decide ficar, quem não foge, quem se esforça, quem não se cansa. Eu mereço isso. Então, sem lágrimas nos olhos, digo mais um Oi para meu companheiro de vida: o recomeço! Vamos lá, essa é a hora! Vou tratar de ser feliz.