Memória de família – “Bar Doce Lar”

As relações familiares são complexas, não à toa que existem tantos filmes com essa temática, cada um com sua peculiaridade, assim como são as famílias. Esse é o tema principal de “Bar Doce Lar”.

O filme é uma adaptação do livro de memórias (um memoir) do escritor e letrista estadunidense J.R. Moehringer, roteirizado por William Monahan e dirigido por George Clooney. A produção acaba de chegar no catálogo do Amazon Prime Video e promete ser uma dramédia. Logo no início da trama conhecemos um J.R. de 11 anos, dentro de um carro com a mãe, voltando a morar na casa do avô porque não conseguiram se manter sozinhos. Acontece que o pai de J.R. abandonou o lar anos atrás, deixando a mãe dele desamparada.

Detalhe, ela não terminou os estudos justamente porque teve que casar com esse indivíduo, agora ele vive “bem” em Nova York, conhecido como The Voice na rádio.

Essa volta para a casa da família foi muito mais traumática para a mãe do que para J.R., porque ali ele tinha com quem conviver, primos e avós pertinho dele (apesar dos pesares), além da presença do Tio Charlie, o grande ídolo do garoto.

Charlie parecia ser um daqueles falsos playboys, que contava mais história e vitória do que realmente tinha, mas isso era só aparência. Ele era dono de um bar cujo nome era Dickinson, homenagem ao famoso autor e a sua paixão pela literatura. Ele foi a figura masculina que guiou J.R. durante anos, ensinando com linhas tortas as coisas certas da vida.

Essa relação com o tio fez com que J.R. quisesse se tornar escritor, um destino diferente daquele que a mãe queria para ele, mas ainda digno e promissor. Para isso, ele teve que passar por algumas provações pessoais, enfrentar medos e traumas que talvez não conhecesse ou não desse importância.

O maior desses traumas era o pai. A ausência dele sempre foi assunto bem resolvido para J.R., tanto a mãe quanto o Tio Charlie sempre deixaram claro quem o pai do garoto e a única questão que ele teve com isso foi o nome dele, que era o mesmo do pai.

Mas, depois de formado e com maturidade suficiente, J.R. teve que enfrentar isso, o que pareceu ter desbloqueado outros obstáculos de sua vida.

É um filme com narrativa delicada, que realmente tem nuances de drama e de comédia, muito bem equilibradas, mas um tanto quanto lento. É uma daquelas tramas que acompanha o crescimento do protagonista, com seus traumas, mas que, basicamente, mostra sua rotina em família. Isso não quer dizer que seja um filme ruim, de forma alguma, me agradou bem mais do que imaginei que agradaria.

O humor usado não é o escrachado, de comédia tradicional, puxa mais para a ironia e para o sarcasmo, principalmente vindo o avô de J.R. e de situações diárias.

O ponto principal é mostrar o impacto que a família tem na formação de uma pessoa, com destaques de afinidade, dependendo do caso. J.R. sempre admirou seu Tio Charlie, nunca o colocou na posição de pai, mas sempre o respeitou como tal.

Ele também cresceu vendo a mãe batalhando para que ele não cometesse os mesmos erros, para que ele fosse de fato feliz. Outra figura frequente foi o avô, mesmo com seu comportamento controverso, foi capaz de mostrar a J.R. o amparo familiar.

J.R. é interpretado por dois atores, a versão criança/adoelscente e a versão jovem adulto. J.R. de 11 anos foi vivido por Daniel Ranieri, sendo esse o seu primeiro trabalho como ator. Ele jovem adulto foi interpretado por Tye Sheridan, conhecido por filmes como “Jogador Nº 1”, “Voyagers” e a franquia mais nova de “X-Men” (ele é o Ciclope dessa nova geração).

Ambos fizeram um excelente trabalho, mas fiquei incomodada com o detalhe “estético”. Por serem o mesmo personagem em idades diferentes, eles deveriam ter semelhanças físicas (acredito eu), mas isso não acontece. Raniere tem enormes olhos pretos (com belíssimos cílios, devo dizer), já Sheridan tem olhos nitidamente verdes, dentre outras diferenças.

Esse detalhe não diminui a beleza da narrativa, mas distrai bastante.

Tio Charlie é vivido por Ben Affleck, famoso por ser o Batman mais recente da DC (ele ainda vai aparecer assim antes de passar o bastão para Pattinson) e outros filmes como “Garota Exemplar” e “Argo”. Mesmo não sendo fã de Affleck, preciso dizer que ele fez um trabalho muito bom em “Bar Doce Lar”, mas, analisando bem, o personagem seria perfeito para George Clooney (quem dirige o filme).

A mãe de J.R. é vivida por Lily Rabe, conhecida por filmes como “Fratura”, “The Undoing”, “Vice”, “Sem Reservas” e a saga de “Jogos Vorazes”. A trajetória dela é secundária, mas tão interessante quanto a do filho, equilibrando-se entre a revolta e o otimismo.

O avô de J.R. tem pouco tempo de tela, mas tem uma pequena sequência memorável, por isso preciso o citar aqui, especialmente porque ele é vivido por Christopher Lloyd, o Tio Chico de “A Família Addams” e o Doc de “De Volta para o Futuro”.

Fazia tanto tempo que eu não via algo novo de Christopher Lloyd que quase fiquei emocionada quando vi a primeira cena com ele, muito bom o ver atuando, ainda mais com um personagem estranho.

Outro personagem que preciso mencionar aqui é Wesley, ele é um dos amigos de J.R. da faculdade, o desbocado (em contraste ao nerd). A energia caótica e sincera dele foi essencial para J.R. em muitos momentos, foi o complemento do tio.

O ator que o interpreta é Rhenzy Feliz, conhecido por “Teen Wolf” e “Encanto”. O sobrenome dele me chamou muita atenção, ter feliz no nome só pode trazer boas energias, e o melhor é que Wesley sempre tem uma expressão alegre, um sorrisinho de canto de boca, combinou muito.

Até Mais!

Mais do NoSet