Ao longo da sua história como nação, os Estados Unidos da América se valeu das armas e dos seus soldados para levar a paz aos povos oprimidos de outros cantos do mundo, assim como auxiliar seus aliados. Porém, há quem critique essa boa vontade. Não somente quem sofre com a influência americana como também quem nasceu e viveu por toda vida por lá. Principalmente, durante a expansão da cultura jovem na segunda metade do século XX, onde as artes falavam sobre a Guerra do Vietnã e a derrota americana. Na virada do milênio, isso não impediu a intervenção no Afeganistão, Iraque, Líbano e outros países considerados culpados pelo 11 de Setembro. Esse é pano de fundo para esse filme de guerra sem guerra.
O ano é 2003 e o mês é Dezembro. Larry “Doc” Shepherd (Steve Carrel), um médico da Marinha Americana, entra num bar de um amigo dos tempos de serviço militar, Sal Nealon (Bryan Cranston). Depois de uma noite de bebedeira, vão visitar outro veterano, o Reverendo Richard “Mulla” Mueller (Laurence Fishburne). Com o trio reunido, ele revela o porque do contato após a Guerra do Vietnã: o seu filho foi morto no Iraque enquanto servia o país e precisa enterrá-lo ao lado da mãe dele, falecida recentemente.
Ao chegar na base aérea militar em Dover, é surpreendido pelo Sargento Willits com o discurso dos atos heroicos do filho, a forma brutal da sua morte e a impossibilidade de enterrá-lo na cidade natal. Com muita dificuldade, conseguem ter seu pedido aceito, desde que sejam escoltados pelo cadete e testemunha da morte do Larry Jr, Charlie Washington (J. Quinton Johnson). Assim começa as lembranças de batalhas e farras na terra dos vietcongues e as críticas sobre os rumos do país.
Darryl Ponicsan é o autor do romance de mesmo nome e também co-roteirista da adaptação, não é seu primeiro trabalho em ambas as funções; A Última Missão (1973, Hal Ashby) é o filme antecessor do longa, mesmo os personagens principais serem diferentes assim como o elenco, não deixando de lado as referencias e o teor comédia dramática sobre amizade masculina com sentimentalismo moderado.
Richard Linklater, vencedor do Globo de Ouro de Melhor Filme e Direção por Boyhood, mantém seu humanismo real e natural com influência da subcultura pop e os efeitos da passagem da vida, tal qual o conjunto da sua obra que inclui comédias como Escola de Rock, romance dramático como a trilogia Antes do Sol e animação como Waking Life. No longa, ele realiza um filme de guerra onde o foco são os veteranos de uma guerra antiga e a terra natal distante da zona. Cada personagem, não somente os protagonistas, tem uma intensidade diferente do impacto, seja da família, seja de quem apenas assiste imagens do jornal televisivo.
Para manter a atmosfera de realidade hostil e humor negro na trama, a fotografia utilizou uma VariCam cujas lentes possuem alta captação de cores em meio a sombras, muito usada em produções independentes e de custo mais acessível entre as câmeras de alta definição. Assim, deixou para o figurino se encarregar em cores escuras e mórbidas para os trajes civis quando a cena não se passa no funeral.
A reflexão maior é sobre como os comandantes tratam seus comandados. Falsos atos heroicos, causas e consequências do conflito, os tempos de paz são realmente de paz. Em contrapartida, os soldados não são tratados com maniqueísmo de vítimas de manipulação ou então maquinas de matar. Podendo ser observado no trio de protagonistas.
Carrel interpreta um homem comum realizando as tarefas das quais é encarregado seja de seus superiores ou meros favores de amigo. Mesmo custando uma pena na prisão militar, sua passividade é mantida com certa tolerância. Ele é a medida da balança entre a diferença de personalidade dos outros amigos de combate. O ator com sua experiência cômica lhe causa a impressão de completo pau mandado dá o desenvolvimento da narrativa como o incidente incitante até cumprir com um objetivo pessoal ao invés de terceiros. No seu estudo de personagem, teve a inspiração do pai, veterano da Segunda Guerra.
Carston, é o comediante de stand-up no meio do humor negro e das ironias da vida. Com um comportamento auto-destrutivo e cinismo nos seus diálogos, ele é o machão do esquadrão que esconde o medo vindo do caos e da morte. Atitudes resultando em problemas aos outros. E ainda geram. É o que motiva toda a reflexão sobre a guerra e o sentido dela.
Fishburne é o cabeça do grupo. Mais do que o personagem negro temente a deus e rígido em restaurar a ordem no caos. É o contraponto do niilismo de Sal, embora reconheça a verdade em alguns questionamentos. Com seu passado de excessos de prazeres no Vietnã, é o personagem que instiga o real motivo da mudanças embora não seja explorada com maiores detalhes, apenas serve como momentos de comédia do filme.
Apesar da mensagem afetar mais os americanos em criticar o nacionalismo como ataque ao conservadorismo cínico do atual presidente Trump, segundo Linklater, o anti-bélico tema vale para os comandantes do conflito, assim como a necessidade de autoquestionamento por parte dos soldados.
A Melhor Escolha (Last Flag Flying, 2017)
País: EUA
Gênero: COMÉDIA, DRAMA
Duração: 125 MIN
Direção: Richard Linklater
Roteiro: Richard Linklater, Darryl Ponicsan
Produção: Richard Linklater, Ginger Sledge, John Sloss
Elenco: Bryan Cranston, Steve Carell, Laurence Fishburne, Yul Vazquez, J. Quinton Johnson.