Love, death and robots. Animações adultas, surpreendentes e excelentes.
Há muito tempo que não me deparo com uma animação adulta com graus de criatividade e qualidade tão grandes. Estou falando sobre Love, death and robots, série novíssima da Netflix com dezoito curtas-metragens de ficção-científica, filosofia, humor e terror como vocês nunca viram.
First, let’s go to the trailer…
Essa série se destaca das demais por apresentar não apenas animações de altíssima qualidade (as mais variadas técnicas e estilos de desenho e animação), mas também por ter roteiros inteligentes, corajosos e que fogem do lugar comum das mais recentes obras de animação do gênero. Trata-se de uma antologia com obras questionadoras, fortes, críticas e bem estruturadas até mesmo naquelas mais simples. Em poucos minutos (nenhum episódio passa de 20 minutos) somos bombardeados por sensações variadas e com intensidade incomum. Medo, desconfiança, terror, nojo, surpresa, violência e muito mais são lançados na face do espectador como um tapa dado por um pai para que o filho pare de fazer o que é errado (e pouco me interessa sua opinião sobre se isso é correto ou não).
Os estilos e técnicas para criar as animações são de deixar o espectador boquiaberto. Alguns episódios são verdadeiras obras de arte. Eu reconheço a semelhança entre alguns desses episódios e aquilo que vimos em Animatrix, com o diferencial de haver muito mais qualidade em cada trama. O fato de não haver grilhões na trama, isto é, a inexistência de temas obrigatórios deu certamente maior liberdade para os criadores das tramas que conseguiram reunir nesta antologia vários tipos de narrativas. A ausência de censura e limites dá mais impacto às tramas que não desperdiçam essa oportunidade de ir além do lugar comum, sempre com muita criatividade e inteligência. Aliás, estar além das animações normais não implica em dizer que haja abuso dessa liberdade, pois mesmo os mais polêmicos episódios usam de linguagem pesadíssima, sem que isso seja gratuito. Há lógica por trás do graficamente impactante.
Ficção-científica, terror, sobrenatural, guerra, steampunk… todos são temas já costumeiros que ganham novas roupagens por parte dos roteiristas, animadores e diretores responsáveis por cada uma das obras. É impossível passar incólume à maioria das tramas, assim como será dificílimo esquecê-las.
Outro ponto bastante exigido do espectador é a capacidade de compreensão dos curtas. Sem seguir os padrões atuais que praticamente entregam a trama e ainda a explicam, Love, death and robots não favorece as mentes preguiçosas. Diálogos intensos, fortes, repletos de realismo e narrativas quase sempre surpreendentes são algumas das características que transformaram essa antologia em um sucesso incontestável.
E não pensem que só de ficção vive essa série. Uma das tramas mostra uma astronauta que passa por péssimos momentos ao tentar reparar um satélite. A sequência é bem sombria e cheia de situações difíceis, mas possíveis.
Os debates filosóficos e as perspectivas futurísticas marcam algumas das animações dessa série. A reflexão e as previsões de um futuro onde a tecnologia e o caos andam lado a lado são, no meu entendimento, um alerta sobre os rumos que a vida e os relacionamentos podem tomar se nos inserirmos totalmente na realidade que a tecnologia traz. Não há críticas sobre os avanços tecnológicos, esclareço, porém é fato que em plena Era da Informação nós estamos cada vez mais próximos da tela e distantes dos que deveríamos dar atenção.
Novamente volto a destacar a qualidade de alguns episódios que mostram, além do roteiro afiado e questionador, críticas sociais e políticas embutidas de forma discreta e, por vezes, diretas ao extremo.
Só um dos episódios faz uso de atores normais, ainda que estes atuem com animações embutidas na história.
A relação dos dezoito episódios é esta:
A vantagem de Sonnie é um dos mais violentos episódios da série e que possui um final surpreendente.
Os três robôs é o segundo curta e nos leva a refletir sobre o rumo que a humanidade toma… e suas consequências. Humor ágil e cativante.
A Testemunha. Graficamente violento e que pode levar feministas a surtar pela perseguição sofrida pela mulher, mas cujo final dará outra visão sobre o fato em si.
Proteção contra alienígenas é o curta com elementos de Mechwarrior, Aliens e a boa e velha camaradagem das famílias fazendeiras. Ação e emoção garantidas.
Sugador de almas tem uma leve dose de humor para relatar os contratempos de uma expedição arqueológica que se depara com um monstro ancestral. Armas normais pouco adiantam, mas eles têm algo a seu favor.
Quando o iogurte assumiu o controle retrata o domínio de uma inteligência superior, o temor da humanidade diante dela e as sequelas de nossa dependência desse poder. Apesar do visual mais leve, a narrativa tem alta dose de sarcasmo e humor negro.
Para além da fenda de Áquila trata de um erro de cálculo que leva uma tripulação até um local fora (anos-luz) de sua rota. Há surpresas interessantes e um desfecho macabro… e fraterno.
Boa caçada é uma fábula com toques de sobrenatural. Uma mulher transmorfa e sua “filha” são caçadas por uma dupla que não enxerga seus verdadeiros princípios. O tempo e as situações levam a filha da transmorfa e o filho do caçador a assumirem papéis bem diferentes ao longo dos anos, mas sempre ligados pelo destino. Ficção que mistura steampunk, cultura japonesa e fábulas.
O lixão. A velha sede de poder leva um homem a cumprir uma ordem de despejo de um morador do lixão da cidade. O único problema está naquele velho ditado que diz: “o lar de um homem é o seu castelo”. E alguns castelos têm lá suas defesas…
Metamorfos é uma história sobre a guerra, a intolerância diante do diferente nas tropas, amizade e sacrifícios. Visual magnífico e digno de alguns cinematics como os vistos em God of War e Diablo, inclusive na ótima trama.
Ajudinha tem como ponto principal aquilo que somos capazes de fazer para sobreviver, principalmente quando se está sozinho no espaço. Tem momentos muito tensos e capazes de causar desconforto nos mais sensíveis.
Noite de pescaria retrata uma noite passada no deserto por dois vendedor. O inesperado chega quando eles descobrem que lá é um lugar muito mais habitado do que imaginavam. Pouca ação, porém com um visual muito parecido com as obras de Salvador Dalí e os elefantes fantásticos de Dumbo.
13, Número da sorte. Uma nave odiada por todos os pilotos por sua fama de trazer má sorte é designada para uma piloto novata. Missão após missão, piloto e nave provam que a harmonia pode ser mais forte que o azar. História que traz uma interessante lição sobre respeito, amizade e sacrifício em prol do vínculo criado pela cumplicidade.
Zima Blue é a história do artista que tem este nome por causa de sua fixação na cor azul. A cada obra seu legado e o mistério por trás dele aumentam. Então, em uma polêmica decisão, Zima decide convocar uma jornalista para registrar sua história e o final de sua carreira.
Animação com alto grau de reflexão cuja meta é fazer com que o espectador reflita sobre suas origens e seu papel nesse mundo.
Ponto Cego tem como premissa a história de uma gangue que faz o impossível para roubar um processador que está em um comboio. Ação ao estilo Mad Max com uma dose de Star Wars (mas com pouco conteúdo filosófico) mostram que o entretenimento puro também faz parte dessa antologia.
Era do Gelo é um dos mais improváveis episódios da série. O motivo? Bem, que tal uma civilização que evolui desenfreadamente em um freezer da geladeira? Apesar desse tom cartunesco, a obra conta com atores reais que contracenam com a civilização miniatura. Em meio ao ritmo acelerado dos pequeninos, aprendemos um pouco sobre o rumo que a humanidade toma, principalmente por conta da sutil crítica ao ritmo descontrolado de desenvolvimento de nossa espécie e também de sua tecnologia (na verdade, o mau emprego desta).
História alternativas tem um título que já diz qual a premissa da trama. O questionamento centraliza em algo que sempre quisemos saber: o que aconteceria se… ?
Esse tipo de pergunta é tão pertinente que até a Marvel se entregou a ela e criou uma série de histórias contadas pelo Vigia, sempre com o título “o que aconteceria se?”.
Nesta trama, seis versões alternativas do mundo sem Adolf Hitler são apresentadas. Ao final da animação, talvez cheguemos ao consenso de que nem a ficção consegue ser muito favorável a nós quando o assunto é “alterar o passado”.
A Guerra Secreta é a última história dessa temporada tem um visual tão bom quanto o da primeira, extremamente realista. Russos são convocados a enfrentar um inimigo com o qual sequer sonhavam.
Diante do frio, caos e mortes horríveis, eles terão que fazer escolhas talvez mais assustadoras até mesmo do que seus inimigos. Afinal, a Rússia e o mundo dependem deles.
E é isso! Chegamos ao final do post com o máximo de informações possível e o mínimo de spoilers. Assistam Love, Death and Robots, pois posso afirmar categoricamente que essa é uma experiência única.
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