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MÚSICA

Dire Straits Legacy – Araújo Vianna

Dire Straits Legacy – Araújo Vianna
  • Publishednovembro 12, 2025

Sempre defendi a opinião que uma banda é muito maior que um músico específico. Muta gente torce o nariz se algum importante componente larga a banda ou acaba falecendo, se os seus integrantes seguem tocando. Eu não vejo problema algum. Ainda mais porque alguns desses tais integrantes às vezes tem tanta empáfia e birrinhas pessoais, que não voltam ou seguem nas bandas por puro egoísmo. Enfim, não estou falando do Mark Knopfler, um cara que, segundo ele próprio, cansou da fama e se dedica mais a trabalhos em estúdio e em projetos de trilhas sonoras. Enfim, quer uma carreira mais sossegada, dinheiro não falta e ter tempo para ele mesmo. Para os fãs, um desperdício de chance de revê-lo junto com os Dire Straits de volta, mas ele tem todo o direito. Ao menos, para matar a saudade da banda, temos o Dire Straits Legacy. Aquele velho ditado, se não temos cão, caçamos com um punhado de bons músicos que em algum momento tocaram em palco e gravaram com a banda, com destaque para o tecladista Alan Clark, que tocou nos anos áureos do grupo inglês, e pro guitarrista Phil Palmer, que tocou no lendário On Every Street, de 1991. Os dois, mais os músicos que tiveram passagem pela banda, com Mel Collins e Danny Cummings, tendo na guitarra e vocal o italiano Marco Caviglia, estiveram em Porto Alegre semana passada em dois shows no Araújo Vianna. O primeiro, fui lá conferir e conto como foi.

O primeiro show da passagem do Dire Straits Legacy por aqui era uma data extra. A data oficial teve lotação esgotada e abriram uma sessão para um dia antes, uma quarta-feira. O público era muito bom, mas longe de esgotado. Confesso que estava bem ansioso para ver a performance da banda, afinal os ingleses comandados por Mark Knopfler fizeram muito sucesso no Brasil. Talvez por terem surgido na contramão do movimento punk na Inglaterra dos finais dos anos 1970, sempre forma uma banda malhada pela crítica com adjetivos como uma banda de pop limpa demais ou rock para quem usa sapatênis. Esse calçado eles não estavam usando, mas com todos de tênis esportivos e camisas polos, num visual que pouco lembrava artistas e sim mais empregados de um escritório burocrático, o pessoal subiu ao palco pouco depois das 21h10min. 

Abriram o show com a hipnótica Private Investigations, de 1982, e a banda com oito músicos já mostrou que a coisa não era brincadeira. Marco Caviglia toca violão e guitarra muito bem e tem uma voz que lembra muito o Mark. Na segunda música, a galera já se empolgou de verdade com o rock animado do Walk of Life. Do álbum Comunique, de 1979, seguem com Once Upon a Time in West. Fora os quatro que já foram um Dire Straits, a banda tem a cozinha azeitada de Cristiano Micalizzi na bateria, Steve Waters no baixo e no outro teclado, servindo de apoio de Alan Clark, temos  Nigel Hopkins, todos ótimos músicos. Dire Straits Legacy é aquele show comportado, de contemplação, galera de mais de 40 curtindo sentado sucessos como Tunnel of Love e Romeo and Juliet, todas muito bem executadas. Quem dá show à parte é o responsável pelos sopros da banda, o veterano e simpático Mel Collins. Às vezes na flauta, outras no sax, interpreta fielmente os famosos arranjos de sopro, característica da banda. 

De 1982, seguem com Telegraph Road, que antecede  a lindíssima Why Worry, com Phil Palmer e Caviglia, revezando os lindos dedilhados da balada de 1985. Uma das minhas preferidas do grupo. When it Comes to You, de 1991, é relembrada, e ainda temos Setting me up, do disco de estreia de 1978, e Expresso Love, do segundo, de 1980. Uma prova que a banda faz uma viagem musical por todas as fases do Dire Straits. Mas Dire Straits no Brasil ao menos ficou muito conhecido foi com o álbum Brothers in Arms, de 1985, e dele a canção que o grupo entoa, Your Latest Trick, sucesso nas rádios da época, para agitar a tímida mas compenetrada plateia. A banda é apresentada um a um por Caviglia, deixando Cummings, o simpático percussionista, anunciar por último Alan Clark, o cara que mais tempo tocou e realmente foi um membro do Dire Straits. 

As próximas duas canções dispensam apresentações. A primeira da sequência é aquele clássico que todo mundo conhece. Lançado no disco de estreia da banda, Sultans of Swing, é aquela que todo cara que está aprendendo a tocar guitarra tem como sonho emular cada passagem do arranjo inesquecível de duas seis cordas. E para essa missão, o famoso solo de Knopfler foi dividido entre Caviglia e Palmer. Confesso que nem os dois juntos conseguiram chegar à metade da emoção e feeling do cara que fazia aquilo tudo sem palhetas. Caviglia chegou a dar umas notas fora, outras na trave, mas tudo bem, a maioria não percebeu e o povo de pé cantou e vibrou com a canção e filmou com os celulares na mão. A outra começa com uma introdução cheia de efeitos de Alan Clark, para chegar no matador riff inicial, Money For Nothing, mantendo a galera sem sentar para cantar junto o sucesso de 1985. É melhor executada que Sultans, com direito à clima de jam no final e improviso. A banda sustenta as músicas por mais tempo, característica tanto dos Dire originais quanto do Legacy, manter as músicas bastante tempo, prolongando as versões com solos e quedas de dinâmica. O Dire Straits sempre soube fazer pop de qualidade, mas tem algumas pitadas tanto de funk, reggae e rock progressivo como influência das suas músicas, um ecletismo musical de altíssima qualidade.

Para o bis, deram aquela baixada na animação, seguindo com Solid Rock, de 1980, mais desconhecida, mas retomam as rédeas com a galera mais solta tocando o clássico Brothers in Arms, mais uma com proposital longa duração, transformando 16 músicas em mais de duas horas de show. Para encerrar, Danny Cummings, o percussionista, vai à frente do palco e chama a galera pra cantar o super sucesso So Far Away, do mesmo Brothers in Arms, com direito a falar em português, pedir participação masculina e feminina, numa grande festa e celebração final, deixando o público bastante satisfeito.

É maldade chamar Dire Straits Legacy de banda cover,  afinal teve gente que tocou nos discos e fez tour com a verdadeira banda, mas não podemos negar que essa junção tem aquela cara de tributo. Com poucas novidades, tirando o tecladista Clark, o único que pode ter sido considerado importante na banda, até fazem um show competente, tocando fielmente os sucessos com arranjos originais com um  vocalista-guitarrista esforçado, mas confesso que faltou sal. Por mais que tudo soe bem e anime por vezes  a plateia, Dire Straits sem Knopfler não parece Dire Straits, até porque 80 por cento da banda era ele. Mas o Legacy que não tem culpa nenhuma disso e segue o “legado”, fazendo seus shows mundo afora com os clássicos da banda. A emoção é quase a mesma de ver a banda da firma se reunir na festa de fim de ano tocando Sultan of Swing, com a diferença que ao menos com a Legacy é bem mais parecido…

Written By
Lauro Roth