Delivery de Dragão – “O Serviço de Entregas Monstruosas”
As grandes histórias sobre criaturas mágicas geralmente se passam em terras gringas, seja no alegado centro do universo, os EUA (segundo os estadunidenses), seja nas Europas, especialmente ali entre Irlanda, Islândia e adjacências, onde lendas sobre duendes, fadas e dragões são tradicionais.
Então será que o Brasil não sabe fazer história sobre magia? Logo esse nosso povo sofrido, que precisa recorrer a imaginação ajudar a superar tantos obstáculos?
O escritor Jim Anotsu mostra que não só o Brasil, mas o grande estado de Minas Gerais (ou melhor, Minas Geraes), pode ser palco desse de uma boa história de magia, ele mostra por meio da obra “O Serviço de Entregas Monstruosas”, publicado pela Intrinseca. As ilustrações são de Felipe Nero Cunha.
Antes que uma fadinha muito sábia, com mais conhecido jurídico que eu, venha reclamar pelos Direitos Autorais, devo dizer que Jim Anotsu foi considerado apenas tradutor dessa história, porque ela foi escrita em dragonês e minereis. O escritor mesmo é Gustavo, o livro é o “diário de bordo” da aventura que ele passou com seu dragão da patagônia, e a editora é Strix, a fadinha advogada que citei anteriormente.
Obs.: Strix, seria uma honra trabalhar com você!
Então, Gustavo é um garoto de 13 anos filho do dono da terceira maior empresa de entregas de Minas Geraes, O Serviço de Entregas Monstruosas. Antes de explicar a aventura dele com um dragão bebê, um ladrão francês e uma organização conservadora, muito semelhante a uma certa parcela da população brasileira atual, preciso explicar a parte da magia.
O povo mágico é muito mais antigo que os seres humanos, eles estavam aqui antes de nós por aqui, foram responsáveis pelo desenvolvimento da natureza, dentre outros eventos sobrenaturais que nós, reles mortais, não sabemos explicar. Só que as criações humanas começaram a atingir esses seres, então eles sumiram por um tempo.
Quando JK foi o “presidente” de Minas Geraes o embaixador do povo mágico entrou em acordo com os humanos, tornando esse estado o lar de humanos, fadas, liliputianos, magos, bruxas, dragões e tantos outros seres mágicos.
Voltando às entregas monstruosas do pai de Gustavo … O garoto era meio esquecido pela família, o pai lhe dava pouca atenção, a irmã só sabia estudar para ser contadora (queria mandar em tudo), a avó vivia em um asilo, mas a irmã adotiva dele era sua companheira de todas as horas, a fadinha Strix.
Em um certo mês de janeiro, quando Gustavo estava tentando ser um cientista e criar o refrigerante de jabuticaba, ele acabou ganhando a oportunidade de ajudar nas entregas. Para isso ganhou a licença temporária para pilotar uma moto elétrica que poderia voar… quer dizer, teoricamente, porque estava muito velha e a função estava falhando.
A primeira entrega dele e de Strix, que sempre o acompanhava, era para um fauno, dono de um zoológico. Chegando no endereço marcado eles são atacados por um ladrão francês famoso, Le Chat, que estava de olho no que Gustavo iria entregar ao fauno: um raro ovo de dragão da patagônia!
O fauno desmaiou, mas Gustavo e Strix sobreviveram, com uma caixa misteriosa nas mãos. O garoto sabia que deveria proteger aquela entrega, havia algo de especial nela, e ele estava mais certo do que pensava.
Eles esconderam o ovo no quarto de Gustavo e, inesperadamente, o ovo acabou se chocando no dia seguinte. De repente, o garoto e a fada tinham um bebê dragão da patagônia poderoso no quarto, com gente perigosa atrás deles e tendo que manter segredo do pai (que já estava chateado por outras coisas).
Os adultos não deram atenção a eles, mesmo o vídeo do ataque de Le Chat tendo ido parar no noticiário nacional, mas nem os policiais eram de confiança. A única esperança de Gustavo era sua pesquisa sobre dragões da patagônia e a expertise de Strix e da amiga deles, a bruxinha Malina.
Eles três pesquisaram sobre Le Chat, descobriram que ele fazia parte de uma organização obscura, a Frente Deltanista Brasileira. Era um grupo conservador totalmente contra ao povo mágico, diziam proteger o “cidadão de bem” dessas criaturas. Todo mundo achava que não existia mais, porque houve uma grande batalha muitos anos antes, só que eles conseguiram se infiltrar em várias camadas da sociedade mineira.
O que eles queriam com o dragão? Usar aquilo que mais temiam para se protegeram. Com o coração do dragão eles conseguiriam fazer um feitiço que tornariam todos obedientes a eles, logo iriam conseguir abolir as leis que permitiam a permanência dos povos mágicos, expulsando-os do estado, do país e do mundo.
O que eles não contavam era que Gustavo iria desenvolver uma relação muito íntima com o bebê dragão, que escolheu o próprio nome, Pudim, podendo desmantelar todo esse esquema com a ajuda de poderosos aliados mágicos.
Isso contando com os desafios de treinar esse serzinho poderoso, ouvindo as reclamações, críticas e boas colocações se Strix (excelentes notas de rodapé) e o jeitinho estranhamento fofo de Malina. Ah, também tinha a situação na família, ele acabara de descobrir que os pais estavam se divorciando.
Com essa estória muito bem elaborada, criando uma Minas Gerais totalmente diferente, mas igual, ao mesmo tempo, “O Serviço de Entregas Monstruosas” entrega uma leitura bem-humorada, com excelentes, atuais e extremamente necessárias críticas sociais e reflexões que podem auxiliar adolescente, como Gustavo, a enfrentar momentos difíceis.
Lógico que não temos loucos franceses caçando ovos de dragões, duendes disfarçados e feitiços a serem lançados, mas a descrição do “deltanismo” e seus membros, assim como o tal presidente da república, é bem próximo ao cenário político e social brasileiro nos últimos anos. E é tão assustador quanto arrancar corações de dragões e transformar a população em “zumbis”.
Ah, essa Minas Geraes mágica ganha algumas adaptações incríveis, o autor (ou tradutor) adapta o nome de músicas, artistas e até monumentos reais para elementos mágicos, além de usar também o tal do minereis, com tradução, na maioria das vezes. É uma forma foi dinâmica de mostrar a cultura “real” do estado e o poder de criatividade dele, pensando em todas as estórias sobre magia que crescemos ouvindo e lendo.
Até Mais!