Dark Web: Cicada 3301. Um inesperado e divertido filme.

Vamos aos fatos: o título do filme não impressiona tanto. Mas, com o intuito de ajudá-los a compreender melhor, vou esclarecer algumas coisas antes de prosseguir com a resenha:

  1. A Dark Web é a internet utilizada pelos experts em internet, sejam estes hackers, vendedores ilegais ou apenas usuários que desejam o anonimato em sua forma quase absoluta. Entretanto, cabe frisar, esta modalidade de uso da internet tem suas próprias regras que, quando não seguidas, podem levar o usuário a perder dados, expor sua intimidade ou algo ainda pior. A Dark Web é uma parte da Deep Web. Para maiores esclarecimentos, acessem esta página da Karsperky para compreenderem melhor os termos e detalhes.

  2. Cicada 3301 é um nome dado a uma organização enigmática que, em seis ocasiões, postou um conjunto de quebra-cabeças e jogos de realidade alternativa complexos para possivelmente recrutar decifradores de códigos do público, pessoas com inteligência acima da média que saibam trabalhar e elaborar criptografia, navegar em absoluto anonimato e atuar – provavelmente – na própria Deep Web.

  3. Para ampliar um pouco do conhecimento sobre o assunto, leiam este post da Kaspersky.

Sendo assim, Dark Web: Cicada 3301 é um longa-metragem que explorará essas duas realidade de um universo virtual complexo, perigoso e desconhecido à maioria das pessoas.

A trama mostra a realidade curiosa de um barman chamado Connor (Jack Kesy), um indivíduo com uma capacidade intelectual incomum e uma memória fotográfica prodigiosa. Connor usa seus talentos para obter alguns benefícios nas horas vagas, o que chama a atenção do grupo recrutador conhecido como Cicada 3301.

A vida de Connor estava em seu curso normal, mas nada mais será como antes a partir do momento em que ele decide pesquisar e ingressar no desafio da Cicada. Para ajudá-lo, entram em cena a bibliotecária Gwen (Conor Leslie) e o melhor amigo de Connor, Avi (Ron Funches), ambos dotados de uma inteligência muito acima da média.

Mergulhe fundo.

Para fazer com que a trama seja compreendida, o diretor Alan Ritchson (um famoso ator de séries de ação, incluindo Reacher, Titãs, Supergirl, Law & Order, Black Mirror) se vale dos recursos do flashback e do humor. Mesmo com sua pressuposta inexperiência na direção, Ritchson consegue desenvolver um filme que cativa pela trama e o sarcasmo de Connor, cuja mente afiada o aproxima de Patrick Jane, personagem da série O Mentalista.

Assim, gradualmente o diretor (e também roteirista ao lado de Joshua Montcalm) conduz o espectador para o ambiente virtual e perigoso da Dark Web. Essa viagem, entretanto, terá que contar com Connor como nosso guia, já que ele é um dos mais aptos a acessar esse lado obscuro da internet sem que haja (muitas) sequelas.

Para ajudá-lo nisso, alguns agentes do governo estarão monitorando suas ações. Entre estes temos o alucinado e sem noção agente Carver, interpretado pelo próprio diretor do filme.

Humor ácido.

Um dos pontos altos da obra está no fato de que não há um comprometimento com a seriedade a ponto de buscarmos ver a trama em nosso mundo real. Ao contrário, o roteiro insere desde o já citado agente federal alucinado até um síndico mudo que atormenta Connor.

Diálogos estruturados para transpor o público para um universo que retrata – em sua essência – a mente de Connor, um homem inteligente, mal sucedido e de raciocínio rápido, sarcástico e prepotente.

E como esse tipo de comportamento precisa de alguém para balancear, a trama mantém o organizado Avi e a impulsiva Gwen durante a jornada de Connor. São pilares que servem para equilibrar o jeito cáustico e desconecto do protagonista.

Inteligência.

Ser e ter inteligência são duas coisas bem diferentes. Ser inteligente é sinônimo de saber usar os recursos intelectuais que o tempo aprimoraram em um indivíduo. Ter inteligência, por sua vez, não é sinônimo de usá-la de forma coerente.

O trio que compõe a base desse longa é a representação de ambas as definições, sobretudo se levarmos em conta que certas situações podem privar até o mais inteligente dos seres humanos de sua perspicácia, o que pode trazer resultados bem ruins.

Comédia.

De forma despretensiosa, Dark Web entrega ao seu espectador um suspense com humor bem leve e personagens exagerados. Um dos agentes quer fazer tudo certo, mas é burro de doer. Avi é um intelectual que é comandado por sua organização exagerada. Connor é antissocial e se vale da inteligência para viver, ainda que nunca a tenha usado – até então – para algo verdadeiramente grandioso.

Não há muita complexidade no roteiro. O que existe é o esforço para entregar um filme divertido e com bons recursos visuais. Honestamente, diante de uma remessa de filmes ruins que estão aparecendo em streamings, cinemas e TV, Dark Web me surpreendeu positivamente.

Tom & Jerry.

A busca pela solução do código proposto pela Cicada 3301 torna a trama uma verdadeira história de “gato e rato”. Connor e seus amigos são envolvidos em uma busca cada vez mais complexa pelas pistas que os levarão ao resultado final proposto pela sociedade secreta. Ou talvez apenas coloque-os mais perto da morte.

A verdade é que a evolução do filme lembra muito os mistérios de outras obras, desta vez com uma “roupagem” mais moderna.

Não leve a sério.

Esta é a dica que eu deixo para vocês, leitores. Não levem a sério esse filme. Ele é basicamente um filme para divertir, entreter com um humor leve e eficiente. Não haverá risadas intermináveis e cenas que dependem de explicação. Dark Web é um filme cujo roteiro aplicou o bom e velho humor simples para trazer ao seu público a diversão.

Para que mais?

Fábula sobre o poder e os poderosos.

O poder corrompe. Nada pode mudar essa afirmativa. Poder é a ferramenta que separe homens de crianças, a peça que torna um indivíduo incluso ou excluído de um grupo, o poder é a forma pela qual dominantes fazem os dominados acreditarem que são livres.

Dark Web tem boas doses desse “poder” ao longo de sua trama. Um homem cujos talentos em informática e a memória prodigiosa o tornaram digno de destaque, mas cujo ego e psique o mantêm quase alienado do mundo. Uma mulher talentosa, bela e ambiciosa; sua inteligência está à altura dos mais capacitados, fato que não impede que a vejam apenas como uma mera bibliotecária, quase uma solitária. Por fim, o erudito: um homem que extrapola os estereótipos de sua raça, assim como obtém o sucesso que muitos – pela aparência – julgariam difícil de alcançar.

Juntos, Connor, Gwen e Avi conseguem representar o melhor e o pior da humanidade. Isso, entretanto, não os exclui de serem os opositores a essa verdadeira seita de pessoas que se acham detentoras do poder de decidir sobre a vida e morte de bilhões de humanos ao redor da Terra.

Em suma, a dark web e seus incontáveis usuários podem modificar os destinos de milhões apenas com o uso da informática e da impunidade garantida pelo anonimato e a covardia.

De forma bem sucinta, o filme traz uma trama leve, divertida (muito próxima ao “besteirol”) e com boas passagens, mas o que fica é a crítica ao modus operandi de algumas instituições que se valem dos mesmos recursos escusos dos mal intencionados da Deep Web para garantir seu poder.

P.S.: não custa frisar quer nem todo usuário da Deep Web é, por associação, um indivíduo com más intenções.

P.S.2: o drama sobre o passado de Connor e o pai dele foi – em suma – mal explorado.

Mais do NoSet