Crítica: Um Lugar Silencioso – Parte II

Em uma cena de Um Lugar Silencioso (A Quiet Place, 2018), Evelyn Abbot, personagem interpretada por Emily Blunt, desce uma escada para o porão da casa e pisa com tudo, e de pés descalços, em um prego do degrau. Uma cena que poderia ser aparentemente banal, mas é extremamente assustadora pelo simples fato de que ela não pode gritar e que um simples gemido mais alto pode acarretar o fim da sua vida, com o ataque de assustadoras criaturas. A cena é cruel e deixa aflito a quem assiste o quieto drama de Emily, que ainda por cima está grávida, em um mundo tão perigoso. Um Lugar Silencioso foi um gigante sucesso onde o silêncio era a arma de sobrevivência e um barulho qualquer nos provocava medo. Naturalmente, a Paramount deu sinal verde para uma continuação, que devido ao nosso drama da vida real, a pandemia de covid, teve mais de um ano sua continuação adiada, mas a espera é recompensada e nessa semana estreia no Brasil Um Lugar Silencioso (A Quiet Place – Part II), mais uma vez dirigido, roteirizado e interpretado por John Krasinski.

O filme começa onde termina o primeiro. A família Abbot, com a morte de Lee, o patriarca da família, e agora com um novo integrante, o recém-nascido bebê, se vê obrigada a ir embora do local onde residiam. Mas dessa vez armados com um amplificador e um microfone para reproduzir frequências agudas que perturbam as criaturas deixando-as vulneráveis a balas. Eles acabam indo a uma fábrica de aço abandonada e encontram um calejado Emmet, antigo amigo de Lee, que perdeu toda a família e vive nas sombras e desesperança. Marcus e Regan acabam captando frequências e ouvem uma música, Beyond the Sea, que dá uma esperança que possa ser um sinal de vida nesse caos, e Regan resolve partir para uma ilha de onde supostamente possa ter vindos os sinais da música. Emmet, a contragosto, resolve segui-la, tanto para resgatá-la, quanto para ver o que pode ter nessa ilha.

Não é exagero afirmar que o primeiro filme da franquia Um Lugar Silencioso é um dos melhores e mais perturbadores filmes de terror do século 21. Explorando a dificuldade de mantermos o silêncio nas nossas vidas e transformando os barulhos e ruídos banais do cotidiano em sentença de morte, o apocalíptico filme de 2018 é uma experiencia única de terror psicológico e tem o mérito de ter nos apresentado criaturas das mais cruéis do cinema de terror, aliens como máquinas assassinas, brutais e ferozes. A continuação, tendo o mesmo Krasinski na boleia, não decepciona. O que é raro no cinema. Muitos, sem exagero, poderão dizer que ela é até melhor que o primeiro. Com certeza entra no rol das grandes continuações. O filme já começa com o tal dia 1, o dia em que a Terra foi invadida e começou o extermínio, mostrando como se iniciou o apocalipse. Talvez nesses minutos iniciais já tivemos mais barulho que o primeiro filme inteiro, mas desde cedo já nos surpreende com as impressionantes cenas do primeiro dia que a Terra mudou. Show de efeitos visuais, sonoros provocando grandes sustos. Aliás, o filme prima pela edição perfeita de som, explorando a captação de ruídos, oscilações de volume em que, a qualquer momento, pode gerar uma cena de perigo. A montagem também prima pela excelência misturando os dois núcleos da história, principalmente na parte final, de uma maneira brilhante.

As atuações também estão no mesmo nível da primeira parte. Emily Blunt está ótima como sempre como a guerreira Evelyn, sempre disposta a enfrentar os perrengues da vida para salvar sua família. Cillian Murphy como Emmet, antigo amigo de Lee, também trabalha bem como um atormentando anti-herói arrasado que até tenta ser indiferente a nova realidade, porém acaba se rendendo a chegada dos antigos amigos, e protege literalmente sua espécie. Mas o filme é de Millicent Simmonds, como Regan Abboot. Atriz surda na vida real, praticamente assume uma personalidade misto de Tenente Ripley, de Aliens (aliás, as tais criaturas lembram o nosso amigo Alien), transposta para um clima meio Mad Max. Com espingarda em punho, aparelho de surdez de altas frequências agudas e amplificador para expandir o som, a menina toma o filme para si sem medo em sua jornada em busca do outro lado do sol. Atuação fantástica e já entrando para o rol de todos os tempos dos filmes de terror. O menino Noah Jupe, como Marcus Abbot, também vai bem com seu lado misto de medo e coragem e, se ficamos impressionados com o prego que Emilly pisa no primeiro, o que esse menino passa nesse segundo ao entrar na fábrica torna o sofrimento dela fichinha… e não se pode nem gritar. Analisando os dois filmes, e com perdão do trocadilho, o segundo não é tão silencioso e reflexivo como o primeiro. Esse explora mais o pânico visual com a presença monstruosa e destruidora das criaturas, nos enche de sustos e explora com muita maestria os efeitos sonoros. Em suma, se o primeiro era mais reflexivo e criava uma tensão individual, o segundo é mais explicito, mas nunca perdendo a premissa de que o silêncio é chave para a sobrevivência.

Um Lugar Silencioso 2 cumpre todas as expectativas, honrando e não devendo muito ao original, tendo o mérito de consolidar a franquia (está para sair um terceiro em 2023), fazendo barulho e oxigenando o gênero, mostrando que uma basta algum grau de criatividade no roteiro, efeitos dignos e atuações fortes, temos uma fórmula infalível para um grande filme de terror. Ah, e um detalhe: se puderem assistam numa tela de cinema, que a experiência visual e sonora será algo realmente marcante, pra não dizer arrepiante.

Vídeo de bastidores de ‘Um Lugar Silencioso – Parte II’, este com os atores Emily Blunt e John Krasinski falando sobre o que os fãs podem esperar do filme.

“Evelyn agora é uma mãe sozinha, com um bebê recém-nascido. O celeiro ficou em chamas, a casa destruída, e ela está por conta própria e precisa proteger essas crianças”, explica Emily Blunt, que acredita que a história, apesar de ser angustiante e repleta de terror e tensão, “é muito humana”. O vídeo também mostra os novos personagens que entram na história. “Ela descobre outras que há pessoas lá fora e o mundo muda em um instante”, completa a atriz.

John Krasinski afirma que o filme vai explicar como surgiu o apocalipse. “A gente responde todas as perguntas que o público fez sobre o primeiro dia, especialmente como tudo começou”.

Sinopse: Logo após os acontecimentos mortais, até mesmo dentro de casa, a família Abbott (Emily Blunt, Millicent Simmonds, Noah Jupe) precisa agora encarar o terror mundo afora, continuando a lutar para sobreviver em silêncio. Obrigados a se aventurar pelo desconhecido, eles rapidamente percebem que as criaturas que caçam pelo som não são as únicas ameaças que os observam pelo caminho de areia.

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