Crítica – Por trás da verdade: quando a mentira e o mal estão enraizados.

Uma grata surpresa para os fãs do bom cinema é o filme “Por trás da Verdade”, cujo título original é The Good Mother. Com roteiro de Miles Joris-Peyrafitte e Madison Harrison, a obra aborda temas de grande complexidade e polêmicos como o avanço das drogas na sociedade, a queda de qualidade da imprensa e a destruição de famílias por causa da inserção das drogas, com um foco especial na índole do ser humano. Sim, apesar da alta carga de dramaticidade, o foco do filme está naquilo que influencia nossas decisões, naquilo que pode nos direcionar para a luz ou para a escuridão. 

Caso ainda não tenham assistido à produção, vamos ao trailer para que compreendam um pouco melhor a resenha. Entretanto, fiquem tranquilos: este review não tem spoilers.

Trama comum, desenvolvimento surpreendente.

Apesar de ter um roteiro relativamente simples (uma mãe que busca por justiça pelo filho assassinado), Por Trás da Verdade tem um desenvolvimento que se aproxima muito da realidade. E quando me refiro à “realidade”, faço-o com o intuito de destacar para o leitor que a obra tem muitas passagens que trarão dúvidas e até incômodo ao espectador, sobretudo por destacar toda a polêmica e controvérsia das decisões que um ser humano precisa tomar diante de situações inesperadas.

Logo no início do filme somos apresentados a Marissa (Hilary Swank), uma mãe que criou seus filhos sozinha. Ela é uma jornalista cujo talento está na escrita, porém há algum tempo que sua linha produtiva não tem sido tão boa. Mesmo assim, Marissa se esforça para manter a ética em seu trabalho, apesar de estarmos diante de um jornalismo – a nível mundial – cada vez mais voltado aos escândalos, em busca de cliques e puramente manipulador. Isso, aliás, é mostrado através do editor dela, Jim (interpretado por Norm Lewis).

A partir de uma breve apresentação das personagens, incluindo o filho de Marissa, Toby (Jack Reynor) e Paige (Olivia Cooke), a mulher do filho assassinado, passamos a conhecer e a mergulhar cada vez mais no sórdido universo das drogas e em todo o estrago provocado por elas.

Desde então, tudo o que está aparentemente em harmonia começa a dissolver. Não há como prever o que ocorre, assim como muitas dicas são apresentadas aos espectadores mais atentos. Entretanto, indubitavelmente, o desenvolvimento do roteiro entrega – de forma gradual – surpresas que agradarão aos fãs do suspense, porém serão de difícil absorção por parte do público cujos valores morais são mais elevados (explico isso com detalhes mais à frente).

Unidos pelo caos.

Marissa e Paige não são amigas. Elas têm em comum apenas Michael. Agora, diante da morte dele, elas se deparam com questões que as colocam lado a lado, já que ambas desejam esclarecer os momentos que conduziram Mikey à morte. 

Frente a todos os problemas resultantes de um falecimento, confusas pela forma como Michael morreu e, mais ainda, como ele viveu, as duas mulheres precisam se unir para descobrir os motivos por trás do assassinato. Para isso, elas contam também com o suporte do irmão dele, um policial que está disposto a tudo para aliviar sua mãe do sofrimento pelo qual ela passa.

Vícios.

A obra aborda de forma bastante contundente os efeitos dos vícios sobre os que cedem a eles, porém destaca os estragos que as drogas provocam nas pessoas que fazem parte da vida dos viciados. Nada, absolutamente nada no mundo pode preparar um pai, um irmão, mãe ou até mesmo um amigo para mergulhar no poço de lama e caos em que as drogas (inclusive as bebidas) arremessam seus usuários.

Ainda que haja um movimento global para minimizar os traumas oriundos das drogas, o fato é que o prazer (temporário) proporcionado por elas jamais será maior do que o trauma gerado na vida dos parentes, amigos e pessoas próximas desses viciados (e destes próprios, claro). Isso é mostrado com maestria, uma vez que Marissa estava longe do filho há tempos, fato que não a impediu de ser impactada com toda a violência por meio da notícia da morte de seu filho. 

Aliás, diante do luto e da busca por respostas sobre o assassinato de Michael, Marissa volta gradualmente a um vício que ela – em tese – havia abandonado: as bebidas. Percebem o nível do dano provocado?

E quanto ao relativismo das drogas na sociedade, uma cena em particular causa desconforto ao mostrar um local onde pessoas se drogam sob a supervisão de voluntários, cuja justificativa é a de evitar a overdose. Certo ou errado, o que precisamos compreender é que a continuidade do uso de drogas, lícitas ou ilícitas, não trará resultados positivos em momento algum. 

Sobre a última afirmação acima, peço que entendam que falo de drogas em sua acepção mais ampla. Medicamentos à base de plantas, ainda que seja a Cannabis, têm efeitos positivos e são ministrados com base em pedidos médicos. Enquanto isso, as drogas vendidas nas ruas de forma ilegal são a fonte de renda para um mercado que se amplia para outros ramos como o tráfico de pessoas, jogos ilegais, prostituição, entre outros, todos estes “financiados” pelo dinheiro oriundo das drogas. 

Até onde você respeitaria seus valores morais?

Ao longo da trama o questionamento acima se torna cada vez mais presente. Marissa é uma mãe em busca de justiça pela morte do filho, mas há muita podridão por trás dessa história. A forma como ela se adapta a essa realidade sórdida surpreende, principalmente se levarmos em conta que ela é uma mulher com rígidos valores morais.

Contudo, o ser humano tem um grande capacidade de se adaptar, seja para o bem ou para o mal. O que fica no ar são as perguntas: até onde você respeitaria seus valores morais? A que preço?

O final dessa obra traz os questionamentos citados e mostra que a decência existe, mas ela pode ser descartada quando isso nos afeta diretamente, principalmente se as decisões afetarem ou tiverem o potencial ofensivo contra alguém que amamos. 

Atuações e nota final.

O elenco mostrou talento e afinco para entregar ótimas atuações. O destaque – óbvio – fica por conta de Hilary Swank, cuja capacidade interpretativa já havíamos visto em “Menina de Ouro”, papel que lhe rendeu o Oscar de Melhor Atriz em 2005. Olivia Cooke e Jack Raynor também atuam de forma convincente. 

A direção competente de Miles Joris-Peyrafitte foi outro ponto positivo que faz com que esse filme seja, como já dito, uma grata surpresa no que diz respeito aos filmes de suspense e temática policial.

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