Crítica: O Telefone Preto

Existe aquele ditado, filho de peixe peixinho é, e no caso de Joe Hill, ele se encaixa perfeitamente. Joe é filho do genial Stephen King e se arriscou na profissão do pai, mesmo com a pressão incrível que ele deve ter tido no início. Mas ele jamais decepcionou e tem ótimas obras no gênero de terror, fantasia e suspense e acumula premiações literárias e boas críticas de seu trabalho. Scott Derrickson, que havia dirigido Doutor Estranho (2016) resolveu sair do barco da continuação devido a inúmeras rusgas criativas com a Marvel e pensou em adaptar para as telonas um conto de Joe Hill, The Black Phone, suspense com tons sobrenaturais que estreia essa semana no Brasil, com o nome de O Telefone Preto (The Black Phone, 2021).

O filme se passa em 1978, em uma típica pequena cidade americana da época, onde a molecada se divide entre beisebol, andar de bicicleta, ir à escola e muitas brigas. Só que um misterioso sequestrador anda capturando alguns meninos do local, sempre com uma van preta cheia de balões da mesma cor, o criminoso, à luz do dia, rapta suas vítimas, que nunca mais iriam voltar. Finney é mais um garoto da cidade, que vive com sua sensitiva irmã, Gwene e com o pai, violento e bêbado. Um dia o garoto se torna vítima do sequestrador, que o leva a um porão, à prova de som, que tem apenas um telefone preto pendurado na parede. Então ele passa a receber ligações do tal telefone, são chamadas dos garotos assassinados pelo serial killer, que acabam dando dicas para como Finn deve agir e tentar não ser a próxima vítima dele, mas o incrível é que aquele telefone não está funcionando e quem está no outro lado da linha não está mais vivo.

Scott Derrickson, conhecido por ter feito dois ótimos filmes de terror, O Exorcismo de Emily Rose (2005) e A Entidade (2012), volta ao gênero, nesse incrível e claustrofóbico suspense sobre serial killers e ajudas do além. Scott adaptou com seu escudeiro C. Robert Cargill o conto de Joe Hill com muita fidedignidade. O filme tem uma fotografia setentista e nos dá um panorama perfeito do fim da década num típico subúrbio de Denver. O clima da época esta todo lá, com uma trilha sonora ótima, garotos valentões e crianças soltas pelas ruas, mas a ameaça do terrível The Grabber paira no ar e muda o clima da região. Scott consegue transformar o sequestro de Finn numa luta de gato e rato, com um sufocante e claustrofóbico clima do local onde Finney está sequestrado. Até a sinistra presença do telefone assusta, tocando em qualquer momento e sendo a única válvula de escape do garoto. Fica até a dúvida no ar se as tais ligações não eram alucinações do garoto, que de tão confinado podia estar ouvindo coisas, mas o tom sobrenatural de saber que eram as vítimas do sequestrador, que por vingança queriam ajudar o garoto a se vingar do seu matador, dá um ar sombrio e perturbador ao filme. O filme tem essa história simples, mas como é muito bem executada, prende a angústia do espectador, que praticamente se sente preso juntamente com Finney.

The Black Phone

Finney é interpretado por Mason Thames, que está ótimo no papel. Ele transmite toda a fragilidade e falta de autoconfiança do garoto, mas que graças a sua covardia serviu como tempo para ele se preparar e enfrentar o vilão. Uma gigante atuação, o mesmo valendo para Madeleine McGraw, como a sua esperta irmã Gwen. A menina tem sonhos sensitivos que podem levar a pistas do esconderijo do assassino e, além de dar um tom cômico no filme, mostra força no papel, enfrentando o pai alcoólatra e violento e querendo ajudar o irmão. Ethan Hawke faz o sequestrador. Um grande papel e atuação convincente, passa praticamente todo o filme com sinistras máscaras e com seu terror psicológico provoca o garoto o tempo inteiro, numa personificação perfeita do sádico, pedófilo e minucioso assassino em série. Um detalhe que engrandece o filme é que as apavorantes máscaras usadas por Hawke foram feitas por Tom Savini, um dos gênios da maquiagem do horror desde os anos 1980.

O Telefone Preto é um filme de terror e suspense, onde a tensão prevalece, mexe com os medos interiores, e com sua quase fiel adaptação do conto, faz de um filme praticamente simples, que se passa quase que dentro de um escuro porão, uma bela surpresa, com atuações afiadas, o embate de Finney com o sequestrador é incrível lembrando às vezes O Silêncio dos Inocentes, além de ser um filme perturbador, algo que no cinemão fazia tempo que não tinha essa experiência. Uma mostra de que em um filme de terror menos é mais, e a tensão e o medo pode ser criado sem grandes pirotecnias, bastando apenas um úmido porão, um maluco mascarado e um sinistro telefone preto pendurado na parede.

 

Mais do NoSet