Crítica: O Palestrante

Confesso que dentre tantas coisas chatas no mundo, poucas são tão chatas e sem graça que o que o “comediante” Fábio Porchat faz. Assistir suas piadas sem graça, seu estilo frenético de contar histórias chatas e o seu humor baseado em gritaria histérica, só de ouvir seu nome, fujo do tal conteúdo dele. Claro que não vou desmerecer tudo dele, ele é ator, roteirista, criou um trabalho de respeito e uma falta de graça imensa na maioria deles, e o seu novo projeto, O Palestrante, tinha tudo para ser mais uma dispensável tentativa de nos fazer rir. Mas não é que o filme não só faz rir como é agradável e Porchat talvez faça seu melhor papel no cinema? O Palestrante, com direção de Marcelo Antunez, estreia nos cinemas nessa quinta-feira.

Guilherme tem uma vida banal. Casado com uma neurótica dentista, tem um emprego burocrático, chefe com piadas idiotas e amigos de trabalho que são o mais do mesmo. Um dia tudo muda, ele é demitido, sua mulher confessa que o trai com seu colega protético e ele ainda tem que resolver uma pendenga de trabalho no Rio de Janeiro. Guilherme, então no aeroporto, se depara com duas pessoas segurando placas, uma com seu nome e outra com uma mulher com o nome Marcelo Gonçalves. Tentando fazer algo diferente de sua patética vida, ele assume o papel de Marcelo Gonçalves. De carona com Denise e o motorista da empresa Josué, ele descobre que ela contratara um palestrante motivacional para seus empregados num hotel em Itaipava. Marcelo, que sempre está pra baixo, tem que colocar para cima um bando de funcionários ressentidos e ajudar Denise a ganhar a confiança deles, além de pouco a pouco acabar se apaixonando por ela.

Com direção de Marcelo Antunes e roteiro do próprio Porchat e de Cláudia Jouvin, o filme é uma comedia romântica a la brasileira e uma tremenda tiração de onda dos tais líderes motivacionais, ou melhor, os tais coachs, que dominam corações, mentes e bolsos dos brasileiros faz um bom tempo. Usando de um artificio muito utilizado pelo cinema, uma pessoa fazendo se passar por outra, o roteiro divertido de Porchat e Jouvin é o mais do mesmo de sempre, com piadas típicas, algumas mais grosseiras, muito palavrão, boas locações num hotel e idas e vindas no roteiro que prendem a atenção do público, com destaque pra primeira parte, onde o filme tem um tom mais sério, menos frenético e que abre o jogo para um segundo e terceiro ato onde o humor toma conta, com algumas boas piadas, outras nem tanto, mas fugindo pouco do padrão Globo Filmes de fazer cinema.

O que realmente me surpreendeu no filme foi a atuação do Fábio Porchat. Pela primeira vez na vida tentou não ser Fábio Porchat, fez um papel mais maduro, romântico e até audacioso, deixando um pouco de lado o seu verborrágico e quase incompressível timing de piadas de sempre, dando um papel mais sério, mas também divertido ao perturbado Guilherme, que vê nessa chance com outro papel, ter a oportunidade de dar um rumo a sua tão inexpressiva vida. Pela primeira vez na vida saí feliz vendo uma atuação e texto do artista. O elenco de apoio está muito bem, Dani Calabresa, como a odiada chefe da empresa de eletricidade Denise, também transmite sua amargura de vida e faz um papel sério (dentro do possível) mostrando que pode ser mais que uma atriz de comédias sem graça. Antônio Pedro Tabet sim, faz o mesmo papel de sempre, com suas piadas típicas de tiozão, mas que seu jeito chulo provoca risadas. O trio de funcionários da empresa, e que odeiam Denise, serve de boa escada para a trama com saídas bem-humoradas e boas atuações de Otávio Müller, Mia Mello e Paulo Vieira. Até Evandro Mesquita tem uma divertida ponta num avião, onde dá conselhos de como viver a vida para o careta Guilherme, e Evandro sendo muito Evandro como sempre.

O Palestrante pode ser definido como uma busca por motivação na vida, como virar a chave de uma vida banal para uma guinada total, além de ser uma comédia romântica com todos os elementos, casal que não combina, um amor meio improvável, um segredo que pode abalar a relação, tudo contado com leveza e competência. Uma crítica aos insuportáveis coachs que ditam regras estapafúrdias para pessoas comuns que se iludem com qualquer groselha falada por eles e muito bem pagas por elas. Abusa e muito do humor escrachado, às vezes escatológico, com piadas datadas, sexistas e preconceituosas, mas que ainda provoca risadas, por mais que uns não queiram. Em suma, uma comédia de erros com uma história previsível, já contada mil vezes, mas que diverte e me fez pela primeira vez me divertir e enaltecer o trabalho do quase sempre insuportável Fábio Porchat, que espero que tenha esse filme como inspiração e seu personagem nele, um fio de virada na carreira do pseudocomediante.

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