Crítica: Neve Negra (2017) | A curiosidade mata, mas antes, nos aflige.

Quem não gosta de um bom longa estrangeiro, não é mesmo? Independente do gênero, qualquer cinéfilo compreende a necessidade em abrir espaço para conferir produções estrangeiras, a fim de expandir a visão de mundo em sua mente e, por conseguinte, aprendendo com elas. Por meio deste conceito é que o filme ‘Neve Negra’ se baseia. Dirigido por Martin Hodara, a obra chegou há pouco em circuito brasileiro, com um trailer um tanto parado, que aparenta ser arrastado e por que não, leve. Só que não! O filme é sim tenso e indigesto, com certas cenas que de tão pesadas, são realmente difíceis de olhar, pode crer. Felizmente, ele superou as expectativas graças à nefasta reviravolta que o 2º ato sofreu. Então fique comigo e conheça um pouco mais da capacidade que o suspense hispano-argentino tem de nos surpreender!

A história acompanha Salvador, que vive isolado do mundo nas colinas geladas da Patagônia. Sozinho há décadas, ele recebe a inesperada visita do irmão Marcos e de sua namorada, Laura. O objetivo dos dois é que Salvador aceite vender as terras que os irmãos receberam em herança, algo que ele não está nem um pouco disposto em fazer. Em outras palavras, a obra tem como parte principal de sua história um drama familiar que começa com uma tragédia ocorrida a bastante tempo, cujo para a contextualizar o expectador com o longa, ele se divide em duas linhas temporais. Na primeira são mostrados aos poucos, flashbacks quase que como um quebra cabeça – cuja fotografia está incrível, e embora escura, possui planos-sequência consideráveis. Destaque ainda para os instantes em que a câmera meio que mistura as duas história como se fosse uma, onde monta a história de um passado que aos poucos vai sendo explicado melhor e dando embasamento para o que sobrou dessa família no futuro. Basicamente, é como se os personagens de ambos os tempos estivessem no mesmo ambiente, com todos os movimentos intactos e nenhum corte, o que criou essa ilusão deveras silenciosa.

A segunda, mostra os dias atuais, onde Marcos (na pele do carismático Leonardo Sbaraglia), um dos integrantes dessa família, se vê obrigado a voltar ao seu antigo lar, junto de sua esposa Laura (a bela Laia Costa) para resolver partes burocráticas sobre a morte de seu pai. Uma dessas partes, se trata de uma empresa canadense que tem interesse em comprar as terras deixadas pelo patriarca em um valor acima da casa dos milhões, mas para isso, terá de negociar com o restante de sua família. Sua irmã Sabrina, interpretada pela atriz Dolores Fonzi, não oferece riscos para a venda dessas terras, já que não tem sua saúde mental muito boa, e suas condições a obrigam permanecer internada. Mas seu outro irmão, Salvador, incorporado pelo ótimo Ricardo Darín, é o grande problema para resolver essa situação, já que ele viveu sozinho nessas terras desde que seu pai e seus irmãos foram embora, deixando-o totalmente sozinho, e que não tem pretensão alguma de sair de sua cabana isolada em meio a neve que considera seu lar.

Tão intenso e impactante quanto posso descrever, ‘Nieve Negra’ é uma produção independente e bem dolorosa. Martin Hodara (diretor, produtor e roteirista) afirma que foi doloroso fazer o filme, uma vez que a produção. Uma obra que fala sobre amargura, sobre descobertas, sobre amor, ressentimento entre irmãos e, acima de tudo, sobre um destino cruel. Pura arte, aliás. Não posso dizer que me surpreendi quando notei o envolvimento de diretor com ator prosseguindo, mas provavelmente será um choque para a maioria. Devo acrescentar que o enredo aborda uma questão realíssima, que é a de uma família problemática, cujo passado conturbado fez com que ela passasse a viver afastada. Até agora.

Após dividir o espaço de direção com Ricardo Darín, Martín Hodara encarou neste novo projeto o desafio de dirigir o ator no filme, mas, segundo ele, nada mudou nessa relação. Amigos de longa data, os profissionais do cinema já tinham trabalhos em conjunto antes e até mesmo se conectado por amigos em comum, como o diretor também argentino Fabian Bielinsky, que morreu em 2006 aos 47 anos. “Nós sempre dissemos que a última coisa que precisávamos era sermos bons amigos com a morte de Fabian e ele nos fez bons amigos que somos agora”, comenta Hodara. “Ele é um bom amigo, um bom ator, sempre adiciona muito para o filme. Ele se concentra no roteiro, na trama, não só no seu personagem”, confessa. Entretanto, Martín Hodara ressalta que trabalhar com um dos mais importantes atores ibero-americanos pode ser sinistro para alguns diretores, ainda que Darín seja um ator muito aberto no set de gravação. “Ele sempre dá sugestões, e se você pensa diferentemente dele, ele acaba fazendo aquilo de qualquer forma, então ele é muito fácil de trabalhar”, afirma.

Inclusive, culturalmente falando, as produções latino-americanas não ocupam tanto espaço no Brasil, seja no âmbito musical ou cinematográfico. Entretanto, o cinema argentino ganhou seu espaço de destaque no país, um cenário que nem mesmo Hodara consegue explicar. “Eu penso que quando você tem um bom filme, não importa o seu gênero, as pessoas gostam. Para mim os filmes argentinos são muito argentinos, mas talvez para outras pessoas seja universal, eu não sei”, reflete ele. Pra ser sincero, me refiro a isso porque também não sou muito familiarizado com obras assim, apesar de ter curtido bastante o cômico ‘Relatos Selvagens’ e o espetacular ‘O Silêncio do Céu’.

A película chegou a levar 680 mil argentinos para o cinema no país durante este ano e, por isso, tem sido vendido e anunciado pela mídia como “o maior filme argentino do ano”. No entanto, o slogan por incrível que pareça não agradou muito o diretor, que contesta o rótulo que foi atribuído ao seu trabalho. “É o maior a respeito de que? Por conta das pessoas que assistiram? É o melhor? Não sei, as pessoas têm que dizer”, questiona o diretor, que afirma reconhecer que durante este ano a argentina produziu outros filmes que merecem destaque por sua qualidade. “Eu nunca fui muito fã de rótulos em projetos, mas eu entendo que foi o seu feito que levou mais pessoas aos cinemas esse ano até agora, sim. É um sucesso? Sim, é um sucesso. Mas eu prefiro evitar esse rótulo”, confessou.

Em suma, se eu pudesse definir ‘Neve Negra’ em uma palavra, seria: tenso. Durante este encontro inusitado, segredos do passado vem à tona, conflitos familiares se manisfestam e vidas são mudadas para sempre. Logo, caso você aprecie filmes semelhantes a este, não deixe de conferi-lo nos cinemas, a fim de tirar suas próprias conclusões. Não é à toa que por mais que possua um roteiro frágil, o terceiro ato muda totalmente este conceito. Tirando o que até então pareciam ser só diálogos excessivos, os mesmos garantem que eram de extrema importância para compreensão do enredo. Então, por mais suspenses assim, que provam ser bem melhores do que parecem. Certamente merece a sua atenção!

Título Original: Nieve Negra
Direção: Martin Hodara
Duração: 90 minutos
Nota:

Assista o trailer:

http://https://www.youtube.com/watch?v=YzOkCNQy-gQ

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