Crítica: Missão de Sobrevivência

Gerard Butler não é um ator ruim. Um cara esforçado, que tenta dar dignidade aos seus filmes, mas pena que na sua filmografia os abacaxis em que se meteu é que fizeram a fama e o talento do ator ir à míngua. Mas ele não desiste fácil e essa semana nosso querido Gerard está de volta em mais um filme mais do mesmo do ator, um filme que tinha algo que parecia que poderia dar certo, mas derrapa feio, falo de Missão de Sobrevivência (Kandahar, 2023), com direção de Ric Roman Waugh.

Nosso herói, dessa vez, interpreta um agente da CIA, Tom Harris, que juntamente com um colega, está no Irã em uma perigosa missão que tem como intuito explodir subterrâneas usinas nucleares dos iranianos. Depois de quase ser pego, Tom começa a ter problemas existenciais, por ter deixado a família de lado e estar sempre com a vida em risco. Mesmo com esses pensamentos, decide encarar mais uma missão, dessa vez no Afeganistão, só que não imaginava que seu antigo feito nas terras iranianas, o fez ser descoberto pelas autoridades de lá e passa a ser perseguido por paquistaneses, Estado Islâmico, talibãs e iranianos, e junto ao seu tradutor Mohamed, eles precisam evitar serem pegos e chegar até uma base em Kandahar e dar o pinote daquele terreno inóspito.

Falando de Missão de Sobrevivência, ele tem alguns méritos sim. Tem uma fotografia magistralmente angustiante, com tomadas aéreas daquela imensidão do deserto (falha em sonolentas tomadas noturnas), utiliza certas câmeras que acompanham a ação dando um clímax de suspense para a simples trama. Mas é só isso. O problema é que o filme é vendido como de ação, mas tem quase nada dela, tenta partir de uma reflexão do sacrifício pessoal de cada envolvido, uns lutando por sua agência de inteligência, outros por suas pátrias, outros mercenários, outros por causas, mas todos apenas carnes expostas prontas pro abate em missões estúpidas e desumanas. Infelizmente o roteiro de Mitchell Lafortune, que se baseou em experiências como agente de missões de defesa em territórios afegãos, não consegue nos passar o tal sentimento, uma premissa ótima, mas muito mal explorada pela falta de carisma dos personagens e pouca profundidade dos seus dramas e fantasmas reais. E em meio a tantos filmes de ação surreais nos cinemas, Tom Harris é um cara comum, que mais foge, tem medo, luta pouco e atira mais pela sobrevivência, em cenas reais de ação, mas que com certeza não irá agradar uma geração viciada em filmes como Velozes e Furiosos, Missão Impossível e John Wick. Em suma, uma ideia muito boa, que poderia ter sido bem formatada, o drama individual de agentes de guerra e um bom recorte  com ação de verdade, mas o filme falha nos dois requisitos, com um drama sem sal e cenas  pouco empolgantes.

Gerard Butler mais uma vez se entrega, tenta passar seu talento para a película, mas sofre com o roteiro e tem sua veia aventureira podada. Navid Negahban, como seu tradutor nativo nas missões, também não foge da atuação clichê engessada e um personagem com uma causa pessoal que simplesmente a abandona e veste a camisa do novo melhor amigo, o Tom. E o resto do elenco nem merece citação de tamanha desimportância.

O filme tem diversos penduricalhos na trama que perdem o sentido conforme avança, um general iraniano com o mesmo sentimento de Tom, com família em casa sentindo sua falta, mas o dever é mais forte, tudo isso numa canastrona atuação; uma jornalista que descobre a missão e acaba presa no Irã e que simplesmente some da trama aparecendo apenas no fim. Um agente ocidental, Roman Chalmers, convertido ao Islã, que consegue sempre persuadir Tom a se meter nas mais encrespadas missões. Um paquistanês, Kahil Nassir, que tem entrada em qualquer local do território, é um mercenário que só persegue Tom, sempre em cenas acelerando sua moto, mas que não ficam claras as suas motivações. Além de montes de enxertos desnecessários em um filme que com uma hora e meia o Chuck Norris teria resolvido nos anos 1980, e aqui temos cansativas duas horas.

Missão de Sobrevivência tenta se levar a sério demais, talvez até pelo roteirista ter vivido muito disso na pele, mas nas telonas pouco acrescenta. Um filme de ação que mesmo querendo ser realista, não consegue ter ação e emoção. O drama de vários personagens e suas causas diferentes, que poderia ser um diferencial, se perde em um roteiro vazio e forçado, e com todo respeito, não imagino alguém perder tempo e sair de casa e querer assistir esse filme no cinema, ainda mais com uma concorrência gigantesca nas salas de exibição. Aliás, acho que até no streaming a zapeada sobre ele e passando por esse título não teria atração, apenas mais do mesmo, sem novidades em mais uma barca furada de Gerard Butler, ou seria uma kombi desgovernada no deserto?

 

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