Crítica: Meu Pai é um Perigo

Como costumo falar: um filme, por pior que seja, se tem algum bom ator ou atriz, ao menos já vale a experiência. E nesse caso, bota experiência do ator. Robert De Niro tem um mérito muito pessoal que é se divertir e reinventar. Faz qualquer tipo de filme, criou inúmeros personagens e tem uma certa pretensão, com perdão da piada infame, de ser um “rei da comédia”. Nos últimos anos, além dos grandes filmes que faz, arrisca em comédias menores, algumas de gosto duvidoso, mas sempre se mostra em forma para fazer rir, ou ao menos, tentar. Dessa vez ele se junta a Sebastian Maniscalco, que faz ele mesmo e coescreve o roteiro na comédia Meu Pai é um Perigo (About my Father, 2023), com direção de Laura Terruso, estreando quinta-feira nos cinemas nacionais.

Sebastian Maniscalco é um cara normal, trabalha numa rede de hotéis, está apaixonado por uma rica artista e vive um momento feliz de sua vida. Mas ele vive sempre na sombra de seu pai, Salvo. Ele, um siciliano que veio para a América cedo, mas nunca abandonou suas raízes italianas. Cabeleireiro, trabalhador nato e pão-duro inveterado, sempre questiona os valores da América, apesar de ter sido acolhido faz décadas. Só que Sebastian, seu filho, pretende se casar com Ellie, típica estadunidense, de família tradicional, verdadeira elite do país. Os dois querem se casar, mas Sebastian tem um pouco de receio que seu pai não vá aceitar a família da sua noiva, então ela propõe que Salvo passe um fim de semana com sua família numa rica casa de campo. Um choque cultural e tanto para o cabeça-dura italiano, que tenta entender como seu filho pode largar suas raízes para se juntar aquele meio de vida, aos seus olhos, fútil e sem sentido.

Sebastian Maniscalco conta suas histórias de filho de imigrante italiano nessa nova película de Laura Terusso. Ele conta através do roteiro de forma divertida, que por mais que todos nos Estados Unidos sejam praticamente imigrantes, a maioria não tem absolutamente nada em comum nos costumes e jeito de levar a vida. O filme tem grandes sacadas, como a narração inicial, onde explica suas origens, as origens de Ellie, tudo isso em ilustrações e muito bom humor nas colagens e citações, além de mostrar passagens da vida dele com seu pai, um italiano turrão de poucos amigos, extremamente poupador e defensor do trabalho e bons costumes. A primeira metade do filme é recheada de piadas com ótimo timming, realmente hilárias, com destaque a De Niro, mais uma vez fazendo o papel dele mesmo, mas com uma desenvoltura cômica sensacional. Na segunda parte temos um filme mais óbvio, que já vimos quinhentas vezes, com dramas familiares, choque de relacionamentos e um final previsível. Mas a comédia flui muito bem em diversos momentos, se tornando um delicioso passatempo.

Sebastian Maniscalco abre seu baú de memórias, interpreta a si mesmo e não desaponta como bom comediante que é, transferindo seu número de stand up de sucesso de como foi o encontro e paixão que ele teve com a típica americana rica, para as telonas. Inclusive a cena dos pavões ele jura que foi verdade. Robert De Niro, mais uma vez sendo eficiente fazendo o que mais gosta, sendo o ítalo-americano com cara de poucos amigos que mete medo, mas tem um bom coração. Como é incrível que ainda tenha tanta vitalidade e vontade de aceitar qualquer tipo de papel, uma amostra que não é só dinheiro e sim prazer de fazer cinema. Kim Cattrall está ótima também como Tigger, a poderosa matriarca da família, e Ellie, interpretada por Leslie Bibb, também funciona bem como a bobalhona artista e noiva de Maniscalco. Brett Dier, como o filho zen da família, sempre em busca de curas por pedras, terapias de sons e uma certa preocupação com a opressão mundial do capitalismo, faz a caricatura perfeita do rico folgado que diz pensar no planeta, mas não sai da mansão dos papais.

Meu Pai é um Perigo, confesso que foi uma gratíssima surpresa. Ao olhar para o poster imaginei que estaria a frente de mais uma comédia sem graça que só usaria a força do De Niro e o bom elenco pra atrair público. Mas para nossa sorte é uma redondinha história, curta e grossa (90 minutos), que faz rir muito, principalmente na primeira parte da trama e sabe brincar muito bem com a questão do choque de culturas e a dificuldade de alguns pais entenderem que seus filhos podem ser felizes com quem eles querem, independente da sua origem. Claro que no final temos aquele típicos clichês que agradam e trazem sucesso comercial, mas como disse, é uma agradável e cômica história, pouco apelativa. Tirando uma cena ou outra, como a do barco, ou alguns podem achar de mal gosto a do pavão, mas em si, cumpre bem o que se propôs. Maniscalco abre sua vida e nos dá uma divertida sessão de cinema, altamente recomendável.

 

 

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