Crítica: Longlegs – Vínculo Mortal

Existem alguns filmes que tem tudo para dar certo e se tornar uma obra irrepreensível. Juntar elementos como investigação criminal, serial killer, satanismo, sobrenatural, uma pitada de anos 1970 com toques de 1990, e ainda ser dirigido pelo filho de uma lenda do gênero (além de bom realizador) e ter um Nicolas Cage de lambuja, era só correr pro abraço e entregar um filmaço. E além de tudo contando com uma divulgação e propaganda das boas antes da estreia. Mas, infelizmente, Longlegs – Vínculo Mortal, dirigido por Osgood Perkins, que estreia nessa semana nos cinemas, apesar do imenso barulho, não passa de um decepcionante e genérico filme.

Em 1994, a agente do FBI, Lee Harker, tem a incubência de descobrir quem é o estranho serial killer que há mais de 20 anos tem provocado a morte de famílias com assassinatos e estranhos suicídios no Oregon, nos Estados Unidos. Só que o serial killer deixa apenas cartas e parece não estar presente nas execuções. Lee é uma jovem investigadora que tem um sexto sentido apurado e com seu lado vidente tenta de tudo para descobrir quem será a nova vítima do estranho assassino. Conta com a ajuda do agente Carter, que tem uma filha de nove anos e tem uma ligação forte com Harker. Através de cartas sinistras, seitas do capeta, códigos satânicos e datas cabalísticas, aos poucos, eles vão juntando o quebra-cabeça que liga o psicopata Longlegs a uma estranha boneca que pode ser a causa primordial das bizarras mortes.

Bom, tem aquela máxima que quanto mais expectativa, a decepção vem em tamanho dobrado. Não diria que Longlegs seja dobradamente uma desilusão. Mas confesso que não fui tocado nem um pouco pelo filme. Como já disse antes, a mistura de um Silêncio dos Inocentes com A Profecia, tinha alto potencial para uma assustadora história, mas pena que não temos nada parecido com um Hannibal Lecter e muito menos com um Damien para nos provocar calafrios. Temos uma insossa agente que dá mais sono pela sua inércia nas investigações e um serial killer que parece mais o Walter Mercado despenteado. O filme ainda mistura Annabelle na imagem da boneca do capeta e tem uma pseudo-freira no comando das mortes. Uma miscelânea de referências que causam poucos sustos e não consegue prender o espectador. E isso que hoje em dia filmes e séries de serial killers tem uma horda de fãs, e mesmo assim, o diretor Oz Perkins, filho do Anthony, nosso eterno Norman Bates, teve pouco sucesso em aproveitar todo esse filão e o leque de modelos do cinema fantástico.

O ritmo da trama é muito arrastado, o segundo terço do filme é de uma monotonia sem fim e comete um dos grandes pecados do cinema de terror ou mistério: explica tudo demais. A conclusão do filme lembra aqueles desenhos infantis onde tudo é mastigadinho para as crianças entenderem, aqui no caso, não deixando aresta nenhuma para o público ter um gostinho de sair surpreendido e buscar respostas. Mas pra não dizer que o filme não é um total abacaxi, a fotografia com  granulados, quando o filme volta para a década de 1970, ou o clima sempre carregado dos dias de investigação, e tomadas sufocantes e pitadas de expressionismo com escadas irregulares e corredores sem fim, deixam o ar de desconforto constante na tela. Também é destaque a eficiente trilha sonora que ajuda na atmosfera, além de usar alguns clássicos dos anos 1970 e a eficaz reconstituição da América dos anos 70 até os anos 1990, que brilha ao ilustrar quadros que vão de Richard Nixon a Bill Clinton. Mas isso é muito pouco para um filme que pretendia ser muito e conforme vai passando o interesse por ele, vai se esvaindo e no terceiro ato, o da explicação, o diretor e também roteirista, tenta dar seu ar pessoal e provar que é original, mas aí sim que desaba o filme, com direito a um clímax que beira o constrangedor.

Maika Monroe, como a agente Lee Harker, nem parece se esforçar com um personagem insosso e anímico, com todas aquelas referências típicas, segredos familiares e traumas de infância que a fazem ser a perturbada e clarividente agente. Uma engessada e pouco empolgante atuação, tendo em vista o poder da trama. Blair Underwood, como o colega e agente Carter, manda bem como o superior de Lee, mas não passa de um pastiche de investigador de filme estadunidense. E Nicolas Cage, bem, Nicolas Cage é um mistério da atuação. Eu particularmente gosto até dos abacaxis que ele faz, mas aqui ele usa e abusa do caricato como Long Leg, ou Dale Cobble. Com uma maquiagem empalidecida que o deforma e uma cabeleira desgrenhada, está mais para um palhaço absurdo do que para um aterrorizador serial killer. Muitas vezes eu ria sozinho nas suas histriônicas aparições, ao contrário de uns que acham que ele tem uma das grandes atuações da vida. Surpreendente é  a homenagem que Oz fez a Marc Bolan da banda T Rex. O interessante é que  Longlegs seria uma espécie de assassino que emularia o glam inglês da década de 1970 e o ator profere frases de Marc Bolan no filme, numa bizarra ou inusitada referência.

Longlegs é longe de ser o filme mais assustador do ano. Perde tempo em picuinhas que travam o desenvolvimento do filme, desperdiça Nicolas Cage, que serve mais como fantoche que um terrível assassino (ou manipulador deles), tem poucas tintas de sangue na trama, com pouca violência, às vezes até comedida  e quando se volta para o lado oculto, se perde totalmente numa trama onde toda aquela tonelada de inspirações são mal batidas no liquidificador e tudo que vemos ali já assistimos em melhores produções. Uma premissa empolgante muito bem filmada, mas com uma história sem graça, ou o que é muito pior, não dá medo. Uma pena que um filme com tanta expectativa e excelentes referências cause mais sono que sustos, numa película que tentou evocar o melhor do suspense dos anos 1990, mas passou muito longe…

 

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