Crítica: Halloween Kills – O Terror Continua

Recentemente, conversando com amigos, um deles disse que mostrou para a filha o clássico Halloween – A Noite do Terror (Halloween). A filha adolescente, vidrada em séries de terror moderno e com referências oitentistas, e ele mesmo, achou o filme de uma tosquice sem tamanho e extremamente malfeito. Logicamente expliquei para eles o contexto da produção, o baixo orçamento e a importância que deu para o gênero slasher que dominou a década de 1980. Às vezes é difícil mostrar a importância de um clássico já considerado jurássico na cabeça do espectador comum, mas podemos ter certeza de que sem Halloween, metade do cinema de terror dos anos 1980 talvez não teria acontecido. Enfim, falando do filme e sua mais de uma dezena de películas de uma franquia sem pé nem cabeça e reebots do Rob Zombie, em 2018, os roteiristas David Gordon Green, Danny Mac Bride e Jeff Fradley, resolveram dar um sentido à franquia original, mostrando o que ocorreu 40 anos depois do episódio do primeiro filme, em uma noite de Halloween, em Hadddonfield. O filme, de uma brilhante qualidade e sucesso, foi feito para sequência, na verdade uma trilogia, e em 2021 os acontecimentos seguintes daquela noite de 2018 são apresentados na telona com o lançamento de Halloween Kills – O Terror Continua (Halloween Kills, 2021), com David Gordon Green novamente na direção.

O filme conta os acontecimentos seguintes, na mesma noite que Laurie Strode, sua filha, e sua neta enfrentam Michael Myers, o prendem no porão e tocam fogo na casa. Naquela mesma noite em um bar de Haddonfield, um grupo comemora o Halloween e contam histórias que remetem a fatídica noite de 1978. Inclusive alguns sobreviventes daquela noite e que tiveram contato com o psicopata. Enquanto Laurie é internada num hospital devido à facada que recebeu, a cidade recebe a notícia que o grupo de bombeiros que iria apagar o fogo do incêndio na casa de Strode, foi massacrado por Myers. Fato que faz a cidade toda se unir e tentar de qualquer maneira fazer justiça com as próprias mãos e se livrar de vez do mal que Michael representa.

O primeiro filme dessa nova fase da interminável saga de Michael Myers, feito em 2018, literalmente tentava dar ordem no poleiro das inúmeras produções. E acertaram em cheio, criando uma história nova utilizando referências antigas e adicionando personagens agregadores nesses 40 anos que se passaram. Além de Jamie Lee Curtis, cada vez mais esperta e corajosa no enfrentamento ao psicopata mascarado. O filme seguinte ia ser feito simultaneamente, mas com medo de uma recepção ruim ao primeiro, os produtores resolveram esperar e três anos depois, enfim, sai a tal continuação. Com o os mesmos Green e McBride e adicionados de Scott Teems, assinando o roteiro, o filme não decepciona. Como é um filme sanduiche, entre o primeiro e o terceiro que será a conclusão, não é uma tarefa mole contar uma história boa para a tal sequência. Mas o trio tem a felicidade, a meu ver, em buscar personagens coadjuvantes do primeiro filme de 1978 e inserir, na madrugada seguinte, aos fatos do filme de 2018.

Vemos a importância do policial Frank Hawkins nos episódios de 1978 e o quanto ele guarda até hoje seus fantasmas, Tommy Doyle e Lindsey Wallace, crianças do primeiro filme, Marion Chambers, assistente do Dr. Loomis, e atacada por Michael na noite da década de 1970. Enfim, eles redesenham para os saudosistas o filme de 1978 e algumas consequências de quem viveu aquela noite do terror. Se no primeiro filme (o de 2018) centrava mais na vida de Laurie e sua família, esse concentra na comunidade de Haddonfield e o quanto ela sofre com a presença e histórias malditas de Michael. O filme tem de tudo: boa dose de violência e gore, humor, sustos, perseguições, casas e ruas sinistras, uma atmosfera de 1978 que ajuda bastante (tanto nos flashbacks quanto na trama do dia de 2018). E, é claro, uma trilha sonora, que com os acordes criados há tanto tempo e rearranjados pelo tempo, ainda funcionam, dão medo e penetram na nossa mente criando uma cama perfeita para o filme.

A fotografia também mais uma vez brilhante, as tomadas do massacre dos bombeiros, os pontos de vista de alguém sempre observando, o medo do que pode estar atrás da porta, é tudo muito bem filmado, e seguindo o legado genial da câmera de Carpenter. As atuações do filme não comprometem, nossa rainha do grito, Jamie Lee Curtis, está discreta e passa a maior parte do filme no hospital, mas quando é acionada encarna perfeitamente Laurie Strode, para a alegria dos fãs da série. Anthony Michael Hall está bem exagerado como o raivoso Tommy Dorson, aliás, talvez tirando Jamie Lee e Will Patton, como o xerife Hawking, os personagens estão bem caricatos, mas meio que de propósito, a cidade vira quase uma turba violenta em prol do fim do assassino, e um a um, ou vão sendo exterminados, ou tentam de tudo para pegar Michael.  Michael Myers por sinal assume de vez a aura de invencível, de ser do mal que se alimenta de violência para ficar cada vez mais poderoso e indestrutível, segue com sua matança implacável, com tudo que é tipo de armas e maneiras, uma aberração que praticamente não se vê uma saída para destruí-lo. O filme também explora muito bem a questão da justiça com as próprias mãos, como um ódio coletivo pode dar um efeito de manada incontrolável (a cena de perseguição a um suposto Myers no hospital é um exemplo disso) e como uma turba enfurecida pode estar pronta para tudo (quase tudo, né? Temos um Michael Myers no filme…).

Halloween Kills cumpre bem a sequência da nova fase da franquia. Com doses fortes de nostalgia, atmosfera setentista, mas com humor, violência e sangue dos anos 2000, mesmo a falta de um roteiro profundo (diferentemente do primeiro filme que construiu bem os personagens), mas compensando por ter a missão de divertir ou assustar, além de mostrar um Michael Myers cada vez mais perigoso. Uma digna sequência a um renascimento digno de uma franquia, que devido à genialidade de um cara que com sua “tosquice”, segundo uns, há mais de 40 anos cravou no cinema de horror um conceito, um personagem e uma história, que passado tanto tempo, ainda dá filme. Vá ao cinema, assista ao de 2018 antes (o de 1978 também, se for possível), desligue-se, divirta-se e espere, porque ano que vem tem mais.

 

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