Crítica: Adão Negro

Tem coisas que ficam difíceis de serem entendidas nas produções de cinema. A DC, nas suas adaptações para as telonas, procurava sempre o lado mais sombrio da força (opa, isso é de outro filme) e sempre tinha dificuldades em usar o humor, característica da rival Marvel. Ultimamente, com o novo Esquadrão Suicida, Mulher Maravilha, em alguns momentos, e principalmente Shazam, onde acertou o tom, conseguiu dar mais luz e bom humor aos seus heróis, e também acertou com um melancólico Batman. Na sua nova adaptação para as telas, usando o anti-herói Adão Negro, uma espécie de Shazam às avessas, infelizmente Jaume Collet-Serra tentou mesclar os dois estilos e não acertou em quase nada. Enfim, estreia essa semana o esperado Adão Negro (Black Adam, 2022) nos cinemas.

Khandaq é uma terra que vive de opressão há mais de 5.000 anos. Nessa época era dominado por um rei tirano e explorador do povo, até que um garoto, Teth Adam, se levanta contra a opressão e quando será punido pelo rei, acaba herdando os poderes de deuses da época. Falando a palavra Shazam ele se torna uma máquina capaz de vencer qualquer oponente, só que após derrubar o império, se torna uma ameaça e acaba preso. Nos dias atuais, Khandaq continua sob jugo imperialista e seu povo é dominado por estrangeiros que prometem pacificar a conturbada região, mas à custa da liberdade dos cidadãos. Adriana Tomaz, uma professora e líder da resistência contra o governo fantoche, acaba liberando Adão Negro, o príncipe dos poderes do passado e esse se revolta contra os estrangeiros que dominam Khandaq, mas usa métodos extremamente violentos e sanguinários para se livrar dos inimigos. Com isso, a A.R.G.U.S. precisa intervir porque ele é uma ameaça e Amanda Waller recruta a Sociedade da Justiça para enfrentar a fera, grupo esse formado por Gavião Negro, Senhor Destino, Cyclone e Esmaga Átomo, que precisam ir a Khandaq e dar um fim ao poder sem controle do anti-herói Adão Negro.

Muita expectativa e extrema decepção. Isso pode definir Adão Negro, a nova superprodução do Universo Estendido da DC. Serra, um bom diretor, perde a mão total na sua adaptação. Para se fazer um filme de heróis não são apenas efeitos especiais modernos e bem executados que garantem o sucesso, e nesse caso, nem eles se salvam dessa melancólica experiência de assistir ao filme. Collet-Serra perdeu uma grande oportunidade, além de um carismático ator, de ter feito um grande filme com personagens lado B, mas acabou sendo um Esquadrão Suicida (o primeiro) a mais no cartel da DC. Com a premissa que a “Hierarquia ia mudar”, no panteão dos heróis, ela parece que se manteve na mesma e Adão Negro e os coadjuvantes do filme parece que ficarão como apenas mais alguns perdidos no universo.

O roteiro feito a seis mãos por Adam Sztykiel, Rory Haines e Sohrab Noshirvani é de total falta de inspiração. Os diálogos são sem graça, rasos e os personagens do filme, desde os heróis até os humanos, são de uma superficialidade total. Até a tal crítica da dominação militar que as potências imperialistas fazem para “apaziguar”, leia-se, explorar países, é tratada de uma maneira quase infantil. Talvez a melhor parte do filme seja a origem do Teth Adam (seu nome na Antiguidade), que é uma bela alusão às civilizações da época, mas de restante, levar Adão Negro para os tempos atuais, é tudo forçado e sem graça mesmo. Dwayne Johnson, nosso The Rock, explorando seu físico privilegiado em muitas cenas de ação, até tenta dar um ar da graça ao personagem, mas ele dificilmente agrada. Pierce Brosnan, nosso 007 de sempre, consegue transmitir uma certa dignidade ao Senhor Destino e seu elmo mágico, mas parece perdido na total falta de esmero no roteiro da película, o mesmo vale para Aldis Hodge, como Gavião Negro, bom personagem, mas que faltou ousadia e carisma. E isso que nem falei dos quase descartáveis Esmaga Átomo e Cyclone (Noah Centineo e Quintessa Swindell), que praticamente não servem nada para o combate. Sarah Shahi, como a professora Adriana Tomaz, também tem uma atuação rasa como um pires. Enfim, nem o elenco ajuda a trama. A trilha sonora até tem boas tiradas de alguns clássicos do rock ou soft rock, mas a peça musical do filme tenta transmitir um clima épico e de terror às cenas e às vezes chega a  doer os ouvidos, obra de Lorne Balfe.

O filme tem poucas tiradas boas, como a homenagem ao espaguete western, uma ou outra piada bem colocada, mas em temos de enredo sofre pela sua ausência, tem um ritmo confuso e os efeitos especiais, apesar de encherem os olhos, acabam perturbando por excesso de poluição visual, combates espalhafatosos e efeitos a la Matrix com câmera lenta, ou seja novidade zero, além de muita destruição e mortes de “malvados” civis. Tem uma cena em que mortos em forma de esqueletos saem do inferno com espadas e escudos e são enfrentados pelos habitantes de Khandaq, não sei se foi uma homenagem ao lendário Ray Harryhausen, mago dos efeitos especiais na época em que tudo era feito no peito e na raça, mas que num filme de heróis em 2022, soa tão caricato que quase provoca gargalhadas. E quando o filme parecia que ia acabar a inclusão de mais um inimigo totalmente desnecessária só nos rouba mais uns 15 ou 20 minutos assistindo mais um festival de CGI com lutas óbvias e cansativas.

Enfim, Adão Negro corre o risco de não agradar não só os fãs de heróis quanto o cara mais desapegado que procura alguma diversão aleatória no cinema, ou seja, não funciona nem pra quem ama essas adaptações e nem para gente como eu que não é tão chegado nesse universo. Acredito que vai ter boa bilheteria por ser praxe assistir esse gênero, ajudam as inúmeras sessões nas salas de cinema, mas o que posso concluir: que como seria bom gritar Shazam para sumir de vez com Adão Negro e quem sabe trazer de volta o Billy Batson e o seu agradável Shazam.

 

Mais do NoSet