Crítica: A Lenda de Golem (2019) | Cedo ou tarde, as consequências por brincar de Deus vêm.

Já imaginou se você vivesse uma outra cultura, totalmente diferente da sua, passasse por uma situação que afeta completamente o seu físico e psicológico, e decidisse quebrar todas as barreiras que envolve a tradição das pessoas à sua volta? Eis o dilema enfrentado pelos personagens de A Lenda de Golem, novo filme dos irmãos Doron Paz e Yoav Paz (diretores do controverso Jeruzalém). Com uma história que se assemelha ao clássico Frankenstein, o terror aposta em abordar mais um dos mais temidos contos envoltos no folclore judaico, procurando clarificar certa distinção entre verdade e do que é mito. Como o seu próprio slogan diz: algumas lendas nascem, outras são criadas. Então chegue mais e saiba se vale a pena ou dá pena assistir este suposto horror, em uma época onde os espectadores já estão saturados dos mais diversos tipos de terrores lançados no mundo da Sétima Arte.

Na trama, após a perda de um bebê, Hanna e seu marido, Benjamin, querem ter outro filho. A mulher conta com a fé em Deus e começa a estudar a Torá, mesmo que a prática seja restrita aos homens. Uma epidemia assola a região e a culpa cai sobre os judeus. Hanna então decide usar seu misticismo para convocar Golem, mas ela não sabe que a criatura é muito perigosa do que se imagina.

Do princípio ao fim da película, o destaque com certeza vai para a personagem de Hanna (vivida pela atriz Hani Furstenberg), mulher cuja representatividade e aparição conta com atos que desafiam a crença a todo momento, pois ela é uma mulher que passou (e ainda passa) por tanta coisa, dada às restrições pré-estabelecidas por sua cultura. Sua imposição feminina ganha bastante espaço aqui, mesmo porque estamos falando de século XVI. O modo como as coisas funcionavam e/ou eram vistas aos olhos das pessoas é totalmente distinto do que se pensa. Os comportamentos e submissões mostravam-se mais rígidos do que nunca. Dessa forma, tem-se um belo clima de tensão após todo o ritual de geração do Golem, pois até então o que vemos não passava de diálogos e mais diálogos arrastados, só pra encher linguiça (e talvez fazer você dar umas piscadas longas).

Então do momento em que o Golem aparece em diante, somos inseridos em um ambiente adverso, mas nem tão assustador assim. Foram decisões difíceis que passaram a rodear os dias e da protagonista, juntamente com seu marido, que, obviamente, não gosta nada da ideia de um moleque lhe encarando enquanto dorme todas as noites (convenhamos que criança em filme de terror só deixa tudo ainda mais sinistro, né?), e o ator mirim Konstantin Anikienko assim o faz com muita proeza. Dadas as condições atuais do seu povo, Hanna é tomada por um sentimento que mistura justiça e persistência, instintivamente falando, sendo tudo parte de um esquema envolvendo atitudes extremas em prol de um bem maior.

E engraçado que à primeira vista, a mulher enxerga que ele será a proteção de todos (porque a salvou sozinho de um bando de homens selvagens na floresta), e não levanta a hipótese de que o mesmo não é bem o que se espera. É perceptível a cegueira vinda de Hanna, embora demore pra cair a ficha quanto à consciência das próprias ações, até porque ela passa a usar a criação do Golem a seu favor, meio que uma marionete destruidora, e arrancador de corações, literalmente. Por final, reforço uma frase que me chamou a atenção tanto no trailer como no longa, porém pode soar controversa pra alguns espectadores: “Você é mulher. Você gera vida. Está recusando o chamado de Deus, e deveria sentir vergonha por isso!”. Estaria este trecho um tanto equivocado ou não se aplicado aos tempos de hoje? Comentem à vontade nos comentários…rs

Ademais, o que posso lhes adiantar é que o filme não é o melhor já visto do gênero, e quem resolver assistir irá se deparar com um trash/gore divisor de opiniões, sinceramente. Não só porque mistura cenas que exibem violenta gratuita com revolta passional, ou colisão entre bem e mal com manifestação sobrenatural enxuta, mas também porque os efeitos especiais não são dos mais caprichados (talvez seja o baixo orçamento ou os atores pouco conhecidos escalados) toda essa ideia de evolução que o Golem possui em seu paradoxo nos traços religiosos da história pode não passar de algo pífio, e fora de cogitação para ser eterno ou servir de consolo a uma família traumatizada.

Em outras palavras, não há um final feliz clichê, minha gente… Realmente, “do pó viemos, e ao pó voltaremos” (momento reflexão da crítica). Toda esta ligação além da compreensão que assistimos – o que o Golem sente, seu criador também sente, quase como vodu – tem um começo, meio e fim, assim como tudo nessa vida. Sendo assim, do mesmo jeito que tive minhas dúvidas sobre a posição que se encontrava o Godzilla para com nós, humanos, também o fiz assim ao me questionar sobre o Golem no enredo: seria ele monstro ou protetor? Salvador ou demônio? Como sabemos, nem toda criação traz um bom fruto, e só de saber que inúmeros homens colocam suas vidas em risco diariamente em projetos científicos onde resolvem brincar de Deus, é algo espantoso! Obs.: de fato, já vi filmes piores, então fica a critério de cada um dar uma chance a ele. Contudo recomendo que você o veja sem tantas expectativas, pra evitar futuros transtornos, né? Nunca se sabe.

Título Original: The Golem
Direção: The Paz Brothers
Duração: 95 minutos
Nota:

Assista ao trailer:

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