Crítica: 007 – Sem Tempo Para Morrer

Não tem como fugir da piada, mas se o novo longa do agente 007 é o com mais tempo de duração da série, ele também pode ser considerado o filme da franquia com mais tempo para sua estreia. A estreia estava programada para novembro de 2019, isso se Danny Boyle não tivesse abandonado a barca, que foi assumida por Cary Joji Fukunaga. A nova estreia, devido aos atrasos de produção, foi marcada para março de 2020, mas logicamente a pandemia de Covid-19 impossibilitou a estreia. Essa foi remarcada para fim de 2020, mas inúmeras ondas de transmissão da doença e constantes fechamentos de cinemas em polos estratégicos fez passar para início de 2021. Mais uma vez seguraram, marcando para agosto, sem sucesso, mas aleluia! Sem tempo para Morrer (No Time to Die, 2021), de Fukunaga, tem seu debut global nesta semana de setembro.

O vigésimo quinto filme da franquia quase sexagenária mostra que James Bond está aposentado. Vive num paraíso jamaicano sem ligação alguma com o MI6. Entre braçadas e pescarias acaba recebendo um convite de seu amigo da CIA, Felix Leiter, para investigar o desaparecimento de um cientista. Só que esse estranho sequestro é muito maior que parece, porque quem está por trás dele tem planos de provocar uma catástrofe global. Bond resolve tirar a pistola e o terno do armário e ajudar o amigo, mas ele vê que o inimigo é maior do que ele pode imaginar e só voltado ao MI6, e com ajuda do serviço secreto, eles podem evitar essa terrível e silenciosa ameaça.

Confesso que nunca fui muito com a cara do Daniel Craig. Sempre o achei mais cara de um holligan violento e beberrão que de um charmoso e sorrateiro James Bond. Talvez a tentativa de humanizar o personagem tirou um pouco do brilho e ironia fina do agente secreto, mas aos poucos, com o passar dos filmes (que infelizmente, tirando o excelente Cassino Royale, não funcionaram bem), ele foi entrando de vez no personagem, inserindo a realidade dos filmes de ação do século 21 e conseguindo aumentar seu carisma, unindo sua brutalidade, humanismo, reflexões de culpa por poder matar sem ser questionado, com a elegância e inteligência dos seus antecessores. Enfim, em Sem Tempo para Morrer, Daniel Craig no seu aparente canto dos cisnes como o personagem, simplesmente está arrebatador. Cada vez mais parecido com os trejeitos de Sean Connery, nesse novo longa, ele nos apresenta um Bond maduro, sofrido e, é claro, violento, mas com pitadas dos melhores do clássico Bond, fazendo seu melhor papel na série. Aliás, o filme no todo é o melhor da fase Craig. Fukunaga, em suas mais de duas horas e meia de duração, nos apresenta um roteiro das antigas com roupagem atual. Temos belas paisagens, muita ação, uma trama direta e nada confusa, um bom capanga, um vilão maquiavélico, muito romance, planos de extermínio da humanidade, cientistas loucos, exércitos bélicos do vilão, uma equipe de MI6 afiada ajudando o agente, reviravoltas, enfim um roteiro há oito mãos, que revive o melhor que a franquia produziu.

O filme já começa com uma sequência de tirar o fôlego e uma abertura lindíssima com a canção No Time to Die, brilhantemente cantada pela jovem Billie Elish. Diferentemente dos antigos filmes da série, onde eles não tinham uma ligação direta que interferisse muito na história, os filmes com Craig seguem uma ordem em que todos têm uma ligação, e este tem muito da trama do antecessor, como o que aconteceu com Bloofeld (Christoph Waltz), e a importante presença de Madeleine, a psiquiatra e paixão de James Bond. Elos que seguem em Sem Tempo para Morrer. Ralph Fiennes continua como M e Bem Wishaw está mais solto como o gênio dos artefatos de Bond e o mesmo acontece com Miss Moneypenny (Naomie Harris), mais participativa na narrativa. Como novidade temos Lashana Lynch, como Nomi, nova agente secreta apresentada ao público, que tem uma importância ótima na trama, mas ainda fica muito na sombra de Bond. Rami Malek faz o papel de Safin, megalomaníaco vilão estilo das antigas de Bond, que pretende deixar a Terra aos seus pés. Malek não decepciona e perto de alguns vilões recentes, principalmente dos filmes da era Craig, tem uma segura interpretação.

Sem Tempo para Morrer é uma deliciosa experiência visual com fotografias exuberantes, cenas de ação de tirar o fôlego, perseguições de carro a lá Velozes e Furiosos, para agradar os novos fãs, mas que não deixa de lado o roteiro, tem uma história bem contada, criativa e inspirada no melhor que a série produziu. Também tem romance, drama e melancolia. Pudera, com quase três horas, o filme é um pacote completo, mas que por ser tão contagiante,passa num piscar de olhos.

É impossível falar mais dele sem deixar spoilers, o que fica mesmo é como um personagem que foi colocado nas telonas em 1962 ainda consegue se reinventar e encantar diversas gerações, deixando um legado na cultura popular sem preço, resta apenas ir aos cinemas depois de tanto tempo de espera, sentar confortavelmente e se divertir com uma brilhante aventura de 007 como há anos não se via. O que podemos esperar da sequência da franquia? Enfim, acontecendo o que acontecer, estaremos sempre na expectativa de ouvirmos novamente um Bond, James Bond. Resta à MGM e à Universal, roteiristas ou a quem assumir, de terno ou de vestido, se empenharem para isso.

 

Daniel Craig se despede do famoso espião James Bond no 25º filme da franquia: “Comecei com 007 – Cassino Royale. Foi o meu primeiro filme, e foi ele que definiu a forma como interpretei esse personagem maravilhoso. Eu queria que Bond parecesse um assassino, se comportasse como um assassino, porque é isso que ele é, um assassino. Foi assim que ele foi escrito. Mas eu queria uma abordagem moderna disso”, diz Daniel Craig.

Após quase 15 anos à frente do papel, a despedida do ator causa um sentimento agridoce. “Quando eu paro e penso sobre o que conseguimos ao longo de cinco filmes, é realmente muito emocionante, foram quase 15 anos da minha vida. Eu senti que com 007 – Sem Tempo para Morrer havia uma história para terminar e muitas pontas soltas que precisávamos amarrar. Sinto que fizemos isso. Estou imensamente orgulhoso disso e do enorme esforço coletivo envolvido para se fazer um filme de Bond. Ser apenas uma pequena parte disso tem sido uma honra”, completa o astro.

Em uma franquia com 25 filmes, o personagem James Bond já foi interpretado por diferentes astros do cinema, de maneiras singulares. O 007 de Daniel Craig não é diferente. Ele é um herói multifacetado, um homem cujo sucesso vem acompanhado de todo seu lado humano e fraquezas. “Sempre fui muito feliz com a direção que tomaram os filmes de 007 dos quais fiz parte. Os filmes tratam em grande parte dos relacionamentos do Bond, de como eles o afetaram e como eles transformam e guiam sua vida. Seja com o vilão ou com as pessoas com quem ele trabalha, este filme trouxe isso à tona com tudo. Seus principais temas são amor e confiança. Não dá para ser melhor do que isso”, finaliza Daniel Craig.

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