Hoje, 25 de dezembro, estreia o longa-metragem que chega como um spin-off da franquia Transformers, mas é, na verdade, um recomeço mais justo com os fãs dos Autobots e Decepticons. Isso é dito em função do desgaste da franquia que teve à frente da direção Michael Bay, cuja mania por explosões excessivas e roteiros minimalistas levou o que era uma franquia de sucesso ao desprezo por boa parte do público e a totalidade da crítica. Entretanto, ainda há uma luz nessa história. E seu nome é Bumblebee.
Vamos ao trailer e em seguida vocês me seguirão na análise completa desse longa que (Thanks, God!) trouxe a esperança de um futuro promissor ao universo dos Transformers.
Se meu fusca falasse.
O subtítulo acima é uma brincadeira com dois ícones da cultura pop: o fusca Herbie e o próprio Bumblebee que segue a premissa dos filmes anteriores onde o mesmo não pode falar (e isso é explicado de forma simples e direta). Para os que não viveram ou não se lembram da origem do robô, Bumblebee assumia a forma de um fusca amarelo nos desenhos animados. Em função da busca por uma “atualidade” que não agradou muito, Michael Bay o lançou na série cinematográfica como um Camaro amarelo. Honestamente, eu não vejo nada demais em termos um Bee atualizado, compatível com a época em que “vive”, mas essa adaptação desagradou aos fãs mais extremistas.
Segundo meu amigo Rodrigo Ribeiro (Classe Nerd), a explicação para seu visual fusquinha está no fato de que os Autobots não querem destaque diante da humanidade, querem passar quase despercebidos; enquanto isso, os Decepticons assumem os visuais mais irados e chamativos para mostrar que não temem os humanos e não precisam se esconder de seres inferiores. A explicação me convenceu, porém sei que a franquia recebe uma parcela de financiamento por parte das grandes fábricas desses automóveis. Logo, caros modernos são fontes de renda para o longa-metragem.
Em suma, temos um Bumblebee mostrado em seu auge, ainda falando, e chegamos ao ponto onde o mesmo não pode falar, porém usa um recurso já visto para tecer um diálogo com a jovem Charlie Watson (Haille Steinfeld) que se tornará uma aliada no combate aos Decepticons, em especial aos famigerados Dropkick (dublado na versão original por Justin Theroux) e Shatter (Angela Bassett).
Crer no Bumblebee é algo bem simples, talvez por conta da dinâmica do Autobot com Charlie, talvez por causa de seu carisma latente. Bee (ou B-127) é o mais carismático dos Transformers ao longo das décadas e isso também se dá nos cinemas. Mas o que realmente dá veracidade ao robô, além dos excelentes efeitos visuais e especiais, é o roteiro simples e competente de Christina Hodson, aliado à direção ágil e certeira de Travis Knight. Antes de ser um guerreiro de Cybertron, o robô é um órfão daqueles que ele defendia e amava em seu planeta natal. Em comum, ele e Charlie, carregam a ausência de voz (ele literalmente, ela por causa do descaso de amigos e familiares) e uma solidão grande. Esses pontos serão primordiais para que uma união – uma amizade – seja tecida e, por fim, nada possa desfazê-la.
Efeitos especiais e efeitos visuais.
Travis Knight, o diretor, tomou ótimas decisões ao não exagerar seus Transformers. Bumblebee é complexo como máquina e simples como automóvel, por isso acreditamos nele. Nem as cenas de combate parecem exageradas, o que não cansa o olhar do espectador. Essa simplicidade ajudou na implementação do guerreiro Autobot e também foi importantíssima para compreendermos o que acontece ao longo do filme. Juntos, efeitos visuais e especiais são os responsáveis por dar vida ao guerreiro de Cybertron, além de convencer-nos da existência dele nas cenas onde aparece.
Os filmes da franquia Transformers eram grandiosos demais em termos de efeitos, enquanto mínimos no quesito roteiro. Ao contrário deles, Bumblebee prima por uma trama simples, bem amarrada e emocionante. Impossível não se identificar com Bee e a jovem Charlie, cada qual com sua história.
Destinos Cruzados.
Charlie e Bumblebee têm seus destinos cruzados e entrelaçados pelo acaso. Do mesmo modo que não escolhemos quem será nosso amigo, eles são unidos por tragédias, solidão e por uma parceria incomum. Isolados em suas realidades, eles são frágeis e alvos fáceis para aqueles que não gostam deles. Unidos, eles têm mais força e garra para encarar seus medos e lutar contra os inimigos. Amigos, enfim…
Na trama, a forma usada para colocá-los frente a frente foi fruto de uma boa ideia aplicada da forma correta. Não há fórmulas mágicas embutidas nessa narrativa, o que não significa que não existam méritos. Ver a complexa Charlie se transformar em uma mulher mais afeta aos sentimentos e àqueles que a amam é muito interessante, ao passo em que remover Bumblebee de seu limbo (já que a memória foi prejudicada em combate) e vê-lo novamente ostentar a força de um Autobot é simplesmente mágico. Tudo isso regado por uma trilha sonora típica dos anos 80 (muito nostálgica) que foi inserida competentemente e com uma dose de humor sem exageros.
O inimigo do meu inimigo…
Decepticons são ardilosos e traiçoeiros. Eles não medem esforços para ganhar uma batalha e sabem do potencial de seus adversários. Assim, manipular os humanos é uma estratégia proveitosa, já que a união de forças pode levar à derrota dos Autobots. Nesse caso o homem que se une a eles, ainda que com certo receio, é o combatente Burns (John Cena), um soldado que já se deparou com Bee e o teme por desconhecer as reais intenções dele.
Novamente a alusão à gana por conhecimento através da ciência – e, por tabela, uma possível interação com os Decepticons – é mostrada como algo maléfico, ainda que não seja proposital. É a velha questão ética sobre o que é válido fazer para quebrar barreiras científicas. O cientista em pauta é o Dr. Powell, interpretado por John Ortiz com um certo ar cartunesco.
Laços.
Essa é a maior lição passada em todo o longa-metragem. Valorizar nossas origens, as raízes às quais estamos ligados e, sobretudo, a família são os bons ensinamentos por trás de Bumblebee. Charlie é uma menina que sofre por ser diferente das demais. Ela sofre bullying, é humilhada por ser órfã de pai e excluída por causa da condição social. Mas nem tudo é sofrimento em sua vida.
Apesar de não ter um pai biológico, Ron (Stephen Schneider) atua como um padrasto esforçado e que a ama. Sua mãe, Sally (Pamela Adlon) se esforça para ser presente e respeitar as diferenças entre ambas, mas nem tudo são flores. Ainda assim, diante das dificuldades da juventude, do irmão Otis (Jason Drucker) que pega no pé dela, dos pais cheios de boa vontade e estranhos, Charlie sabe que eles são tudo que tem, sua família. Goste ou não, essas pessoas são sua família.
Já o divertido e persistente Guillermo “Memo” Gutierrez (Jorge Lendborgh Junior) surge como um alívio cômico em certas partes da trama e, obviamente, um suposto par romântico com a protagonista. Eles podem não ter nascido um para o outro, assim como seus familiares parecem mais distantes que muitos amigos, mas o que interessa nessa história são os laços afetivos que os unem. Gradualmente a importância dessas pessoas começa a se mostrar e podemos perceber que a base de carinho e amor entre todos eles é forte.
Tecnicamente, a Paramount nos trouxe outro filme de qualidade, repleto de locações lindas e com uma fotografia e paleta de cores interessantíssimas. As cenas de ação estão muito bem elaboradas e não pecam pelo excesso.
Apesar de muitas tramas similares onde um indivíduo protege o outro, Bumblebee é um filme que não usa isso como muleta. Há sentimentos e uma forte amizade (algo próximo ao paternal) entre Charlie e Bee, porém isso serve como um substituto para aqueles que foram perdidos no passado. Tal como irmãos, eles nutrem um laço tão forte quanto o familiar.
Por todas as qualidades citadas, pela coragem de ambientar o filme no passado ao invés de prosseguir nos erros de filmes anteriores, e pela liberdade dada ao diretor Travis Knight, esse acabou por se tornar o melhor filme da franquia Transformers e é por isso que recomendo que o vejam. Um programa para toda a família…