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FILMES CRÍTICAS

Antes o tempo não acabava

Antes o tempo não acabava
  • Publicado em: novembro 28, 2017

Sinopse: Em conflito com as tradições do seu povo, um jovem indígena contraria os líderes da sua comunidade para morar sozinho no centro de Manaus. Na cidade, Anderson experimenta novos sentimentos e enfrenta os desafios da descoberta da sua sexualidade. Dirigido por Sérgio Andrade e Fábio Baldo, o longa estreia dia 30 de novembro em circuito nacional.

Esta coprodução Brasil/Alemanha retrata sobre o conflito entre tradição e modernidade, vivido pelos grupos indígenas em grandes centros urbanos. “Antes o Tempo Não Acabava” ganhou os prêmios de Melhor Filme e Melhor Ator no 20° International Queer Film Festival – Queer Lisboa; Prêmios de Melhor Ator, Melhor Roteiro e Melhor Filme no 23º Festival de Cinema de Vitória e os prêmios de Melhor Filme pelo Júri da Crítica e Melhor Roteiro no 10° For Rainbow – Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual.

O protagonista Anderson Tikuna é da etnia Tikuna e interpreta o jovem indígena de mesmo nome, Anderson. Todos os dias, após seu expediente na linha de montagem de uma fábrica da Zona Franca, Anderson retorna à sua comunidade na periferia de Manaus, onde os líderes locais tentam manter vivas as tradições ancestrais de seu povo. Mas a personalidade de Anderson o coloca em conflito com seus líderes, inclusive seu próprio pai. Então Anderson resolve deixar a comunidade e partir para o Centro de Manaus, em busca de oportunidades, descobertas e até mesmo um novo nome – um “nome de branco”. A partir de então o filme aborda questões como migração, miscigenação, exploração da mão de obra indígena e sexualidade.

 

Dentre os fatos apresentados, temos a irmã e sobrinha de Anderson, que tiveram que se afastar da tribo devido a condição física especial da criança. Algumas etnias indígenas acreditam que crianças portadoras de deficiência devem ser sacrificadas para o bem do restante da comunidade. Esta é apenas uma das tradições com que Anderson não concorda. Outro ponto é a descoberta e aceitação de sua sexualidade, algo considerado pela sua comunidade como o resultado de um ritual de iniciação para se tornar um homem que não deu certo, e que precisa ser renovado para salvá-lo. Mas, ao mesmo tempo em que Anderson luta para se tornar uma pessoa independente de sua comunidade, trilhar seu próprio caminho e viver a sua vida de forma independente, o filme nos lembra de que ele pode mudar como e quanto quiser, mas ele sempre continuará a ser índio.


Trata-se de um filme lento, em certos pontos arrastado, praticamente sem trilha sonora, com exceção de sons e músicas que tocam como som ambiente dentro do filme, como música de um bar ou apresentação de (péssimos) MC’s em uma escola. Não temos um gênero definido como drama ou romance. É um filme de história. Um pouco cansativo em certos momentos, mas reflexivo em outros, o que pra mim é a importância do longa existir. Seguem algumas:

O nome do filme traz um questionamento interessante: “antes o tempo não acabava…”. Quem aqui já teve a oportunidade de fazer um retiro no campo, na fazenda, em uma praia deserta, sem “nada pra fazer”. Aquela vida simples como antigamente, sem tecnologia, sem televisão, sem internet. Aquela vida em que você fazia todas as suas obrigações e, quando se dava conta, ainda estava no meio do seu dia. Restava contemplar a natureza, conversar com a família e amigos, ver o tempo passar lentamente. Hoje, no nosso caos urbano, perceba que já estamos praticamente no Natal, e parece que o Carnaval foi um dia desses… O tempo está passando rápido demais, ou a gente não está sabendo aproveitar o tempo como deveria…

O ponto forte do filme é este choque cultural que existe entre a população urbana e as diferentes etnias indígenas. O longa conta com um elenco indígena de diferentes etnias e é falado em português, Tikuna, Sateré Mawé, Neenguetu, Tariano. Isto é muito interessante por tentar preservar e apresentar ao Brasil e ao mundo essa cultura indígena tão desvalorizada por nós. Chega a dar um certo desânimo em perceber como o Brasil simplesmente ignora, descarta, explora ou despreza sua cultura. Enquanto em países africanos e asiáticos as crianças continuam a aprender desde cedo e valorizar os seus dialetos locais, assim como aprendem sobre suas tradições, vestimentas e alimentação (mesmo que a globalização os permita se vestir, comer, trabalhar e viver da forma como escolher), aqui em terras “tupiniquins” a maioria das crianças de hoje nem sabem que existia um idioma Tupi-Guarani. Não respeitamos a história, as tradições, as culturas e nem os reais donos desse chão.

Written By
Leonardo Casillo

Professor (computação), músico (teclado), blogueiro (leocasillo), nordestino (Mossoró-RN), nerd (que a Força esteja com você!) e cinéfilo (menos terror).

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